As diferenças e os pontos comuns entre
Severino Cavalcanti e Sue Johanson
Imaginem-se Severino Cavalcanti e Sue Johanson reunidos, por algum capricho do acaso, na mesma mesa de bar, em poltronas vizinhas do avião ou no mesmo banco de praça. Quem os visse poderia julgar que formavam um casal. Os dois têm mais ou menos a mesma idade, a mesma aparência de bondosos vovós e o mesmo gosto conservador para se vestir. Se eles permanecessem calados, de modo a não se trair pelo idioma diferente, e suficientemente perto um do outro, para dar a impressão de que estavam juntos, quem não os conhecesse apostaria com segurança – sim, trata-se de um casal, um harmonioso e simpático casal de setentões. Na verdade, como se sabe, eles não têm nada a ver um com o outro. Mas algo os une: ambos gostam de dar aulas sobre sexo.
Sue Johanson, para quem não está lembrado ou não tem freqüentado os canais a cabo da TV, é a senhora canadense que, com a naturalidade de quem expõe as variedades da banana e a singularidade da jabuticaba, e o ar de Dona Benta a contar histórias a Pedrinho e Narizinho, discorre, em seu prestigiado programa, levado ao ar em vários países, sobre temas como masturbação, ponto G, sodomia e felação. Ela dispõe, numa gaveta ao lado, de instrumentos, alguns imitando órgãos genitais, dos quais às vezes saca para ilustrar graficamente as lições. Severino não chega a tanto. É de outra índole, outro ambiente, outra formação e, como se tudo isso não bastasse, falta-lhe erudição na matéria. Mas também arrisca suas aulinhas. Na semana passada, durante uma sabatina promovida pelo jornal Folha de S.Paulo, ensinou que a mulher deve chegar ao casamento "virgem, pura". E o homem? "O homem, às vezes, quer aprender como fazer o serviço."
Deixemos claras as coisas, para evitar mal-entendidos. Sue Johanson e Severino Cavalcanti são freqüentemente instados a falar sobre sexo (ou falam em sexo mesmo sem ser instados), mas partem de pontos de vista opostos. Johanson é produto, e porta-voz, de uma tendência que força as portas da libertação sexual até os limites últimos. Severino milita no time adversário. Sua causa não é a abertura, mas a fechadura. Johanson é, pelo menos em teoria, uma gourmet do sexo. Ela o aborda em toda a sua diversidade e o quer assíduo e variado. Já Severino defende um sexo estrito na forma e limitado ao mínimo necessário no uso. Diante das lições de Johanson, o presidente da Câmara não apenas enrubesceria, mas simplesmente, muitas vezes, não saberia do que ela está falando.
Os dois não podiam ser mais diferentes, mas se encontram num ponto – a capacidade de chocar. Sue Johanson choca não só pelos temas, mas pelo jeito espontâneo e de coisa-como-outra-qualquer com que os aborda. Severino choca não só por sua rústica filosofia sexual, mas pela desenvoltura com que a apregoa. Quando ele defendeu que o homem tem de aprender a "fazer o serviço", Danuza Leão, uma das entrevistadoras do evento da Folha, foi ao ponto, inteligente como sempre: "Se a mulher tem de ser virgem, o homem vai fazer com quem?". Severino respondeu: "Com quem estiver disposta a ser professora". (Já se vê que a equação não fecha. Ou bem a tese do presidente da Câmara é um incentivo à prostituição, ao adultério e à bandalheira, ou bem supõe a criação de um corpo de reais professoras que, com seriedade e profissionalismo, se incumbam do mister. Nesta última hipótese, seria essa uma atividade reconhecida e regulamentada pelo Estado? Um órgão público se encarregaria de supervisioná-la? E os diretores desse órgão seriam indicados por parlamentares? Huumm... Mais uma oportunidade de indicar diretores... Vai ver, a equação fecha, sim.)
Questionado, no mesmo evento, se ele próprio tinha casado virgem, Severino abateu a virgindade, em seu caso pessoal, pela metade. "Mais ou menos", disse. A resposta abre mais campo para a lúbrica curiosidade do que se ele alegasse uma virgindade por inteiro. Esse negócio de fazer pela metade... Sue Johanson teria muito a especular sobre o assunto. Em outro momento, Severino recusou-se a responder se era contra o uso da camisinha. "Você está sendo muito indiscreto", disse ao autor da pergunta, o jornalista Fernando Rodrigues. E seguiu com um comentário desconcertante: "Com 74 anos, não posso ser testemunha em nenhum desses casos". Testemunha? Que casos? E que têm os 74 anos com isso? Insondáveis são os mistérios da mente do presidente da Câmara.
Não é de hoje que Severino gosta de enveredar por assuntos sexuais. Ficou famosa a pergunta que, ainda simples deputado, fez uma vez a um militante gay: "O senhor é homossexual ativo ou passivo?". Se a questão da atividade/passividade fosse apresentada a Sue Johanson, resultaria numa rica resposta, e Severino, se é sincero seu interesse no assunto, teria muito a aprender. Pensando bem, é uma pena que os dois nunca tenham dividido a mesma mesa de bar. Melhor ainda se fossem reunidos na mesma sabatina da Folha ou no mesmo programa de televisão. Ia render um diálogo inesquecível.
VEJA
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