Uma semana. Três dilemas. A crise política se agrava e o governo tem que debelar a crise, mas não sabe como. A taxa de juros subiu pela nona vez e a inflação permanece alta; como enfrentar o problema se a política monetária parece não estar fazendo efeito? O governo divulgou a segunda maior taxa de desmatamento da Amazônia. Como enfrentar isso se parte do sucesso atual se deve à exportação do agressivo agronegócio brasileiro?
O desmatamento brasileiro foi notícia de primeira página em muitos jornais estrangeiros. O pior deles foi o "The Independent": "O estupro da floresta e o homem responsável por isso". Era uma referência ao governador de Mato Grosso, Blairo Maggi. "A Amazônia morre. Lula é acusado", disse o italiano "Corriere della Sera". A ministra Marina Silva diz que não se deve fazer jogo de empurra, mas lembra os números que apontam para o estado de Mato Grosso como o epicentro desse terremoto.
Os números de desmatamento sempre medem da metade de um ano até a metade do ano seguinte. Nos dados de desmatamento de 2001-2002, o estado representou 35% da área desmatada. Nos de 2002-2003, subiu para 42%. No dado divulgado esta semana, subiu de novo: para 48%. No mesmo período, o número do Pará caiu de 36% para 25%.
Os números apontam para um dos maiores dilemas do Brasil: o país tem que aprender a conciliar o crescimento econômico e o respeito ao meio ambiente, sua vocação de produtor de alimentos, com manutenção de um padrão sustentável de exploração econômica. E está claro que essa conciliação não houve. Nem dentro do próprio governo — onde cada ministério tem uma linguagem — e muito menos na economia.
A ministra Marina tenta ainda convencer seus interlocutores de que os seus esforços darão certo, que nunca se fez tanto esforço na direção certa, nunca se criou tanta unidade de conservação. Mas os números não mentem: esse é o segundo pior estrago já feito na floresta. O primeiro foi em 95, ano em que o Brasil cresceu fortemente.
Mais do que conflito entre os ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura, o que fica claro é que o Brasil não sabe crescer sem destruir. Cada lado está em seu gueto e não consegue ver a lógica do outro lado.
O dilema dos juros está se tornando cada vez mais agudo. Depois de subir nove vezes a taxa, o resultado em termos de controle da inflação é pífio. No horizonte, há alguns sinais tranqüilizadores, mas se aplicou uma superdose de juros e a inflação deveria ter despencado a essa altura.
Existem contradições na política econômica, como já se disse aqui nesta coluna. O mesmo governo que tenta parar o consumo com os juros, elevou o consumo com crédito consignado e gastos públicos. O mesmo Banco Central que derrubou o câmbio, foi o que tentou segurar o câmbio tirando US$ 20 bilhões da economia em compras diretas e resgate de títulos. As contradições tiram a potência da política monetária e fazem com que os juros altos só sirvam para elevar o custo da dívida pública. O governo se conforma com dados que dão uma falsa impressão de saúde, como os do recorde de arrecadação do mês de abril.
A crise política paralisa o Congresso há meses e vai continuar paralisando. O governo, que subiu no palanque antes da hora, não consegue aproveitar seu mandato no comando para implantar seu projeto. Seja lá o que for ele, a esta altura. O dilema aqui é entre governar e lutar pelo segundo mandato, numa briga que ele mesmo antecipou.
Projeto subiu no telhado
A crise na Bolívia e a aprovação da Lei de Hidrocarbonetos já pôs na geladeira pelo menos um empreendimento brasileiro no país: o pólo petroquímico da fronteira "subiu no telhado", disse o presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra. O investimento no projeto seria de US$ 2 bilhões e envolveria, além da estatal, a Braskem e a Repsol. A Petrobras não está fazendo as malas, afirma Dutra, mas, a partir de agora, será bem mais seletiva.
A Petrobras é a maior empresa da Bolívia. Tem investimentos pesados no país e outros na prancheta que podem não sair do papel. O projeto inicial do presidente Carlos Mesa criaria o imposto sobre petróleo e gás, mas permitiria o desconto dos outros impostos que teriam que ser pagos na atividade econômica, como imposto de renda, uma taxa semelhante à nossa participação especial e o tributo sobre remessa de dividendos.
— Seria uma espécie de antecipação tributária, aumentaria nossos encargos, mas seria razoável — explica Dutra.
A proposta aprovada pelo Congresso boliviano — e mantida pelo presidente — criou um imposto draconiano, com alíquotas muito altas e que não pode ser descontado. Essa cumulatividade tira o horizonte de qualquer investimento.
Pelas contas da Petrobras, a lei reduz a lucratividade dos investimentos atuais já feitos no país em 50%. Os novos empreendimentos é que ficam totalmente inviabilizados com uma redução da lucratividade de 70%.
— Não estamos fazendo as malas, mas seremos seletivos. Vamos comparar a Bolívia com outros projetos em outros países antes de decidir os empreendimentos externos — afirma Dutra.
O que ninguém diz, mas se sabe, é que o governo brasileiro tomou um susto. Estava confiante em que seria aprovada uma proposta mais flexível, que mantivesse os projetos da empresa brasileira. Mas deu o pior cenário.
o globo
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