O ideal seria que todos os jornalistas fossem investigativos. Esse exagero foi cometido outro dia pelo vice-governador Luiz Paulo Conde, em reunião promovida no Rio pela Unesco e pela Associação Nacional de Jornais para discutir ética e liberdade de imprensa.
O vice-governador também assimilou um deslize de linguagem que todos cometemos: o certo, claro, seria chamar de investigativo o jornalismo, e de investigador o profissional. Vai-se ver, o jornalista, inconscientemente, tem medo de ser visto como uma espécie de submeganha.
Passando a questões mais sérias, não seria má idéia se nossos homens públicos aprendessem a conviver com o jornalismo investigativo — em vez de simplesmente usá-lo ou denunciá-lo, segundo a conveniência do momento.
Por enquanto, mesmo nas redações essa área de ação não está ainda claramente disciplinada e definida. Por isso é boa notícia que tenha sido criada a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. A iniciativa foi de profissionais, não das empresas, mas os objetivos devem e certamente podem ser convergentes.
Com toda a autoridade de quem é incapaz de investigar onde foi parar a caneta que estava aqui neste minuto, gostaria de sugerir algumas propostas de normas de conduta, sem ordem de importância.
1. Só tem direito a ficar na sombra o informante espontâneo que corre perigo de vida ou prejuízo desmedido e injusto se sua identidade for revelada. Há o risco de que isso possa fazer secar a maioria das fontes? Talvez. E não seria má idéia em muitos casos.
2. A informação fornecida pelo inimigo pessoal, pelo rival político ou pelo competidor em negócios é, em princípio, suspeita; quase sempre, com boa razão. Não há novidade: jornalistas sérios sempre trataram esse tipo de informação como pista ou indício — mas jamais como notícia pronta.
3. A suspeita com que deve ser manuseada qualquer informação escandalosa exige a aplicação do método usado, há 30 anos, pelo "Washington Post" no caso Watergate: só se leva a sério notícia desse gênero se confirmada por pelo menos duas fontes independentes uma da outra. Na Brasília de hoje eu diria três fontes distintas. Quem sabe, quatro.
4. É inadmissível, por não ser notícia legítima, o uso de qualquer denúncia sobre hábitos e convicções íntimas de alguém — quanto a religião, sexo etc. — a não ser quando esse alguém buscar prestígio ou lucro na vida pública mentindo a respeito.
5. Toda investigação deve ser antecedida por pergunta óbvia: o que está ganhando o informante? Não há resposta que invalide obrigatoriamente a investigação, mas o dado é vital na decisão sobre o direito da fonte ao anonimato.
6. Uma pergunta do repórter a ele mesmo: quanto ou o que vou ganhar com este trabalho? Em dinheiro, prestígio ou confirmação de convicções políticas? A resposta não muda os fatos — mas com certeza influi no rigor com que os examinamos, à luz do interesse público.
E a conversa está apenas começando. Em que arcabouço jurídico deve existir o jornalismo investigativo? Por exemplo, em caso de dolo, como devem responder o informante (categoria que inclui policiais, promotores e juízes) e o veiculador da informação?
O encontro desta semana foi um aperitivo. Espera-se que nos próximos ninguém defenda, ainda que apenas retoricamente, a idéia de que todos os jornalistas devem ser investigadores. Por um motivo, pelo menos: jornais e revistas ficariam chatíssimos.
Em circunstâncias ideais, os profissionais serão curiosos, sempre; preocupados com o interesse público, o tempo todo. Dedicados a tornar melhor — e também mais divertida — a vida do leitor, idem.
Mas sherloques, só quando absolutamente necessário. E ajudantes de sherloques com dúbios ou desconhecidos motivos, nunca.
O GLOBO
Entrevista:O Estado inteligente
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