A personagem do cronista Sérgio Porto em geral reservava o epíteto a autoridades dadas a pronunciar tolices em tom solene ou a produzir justificativas delirantes a respeito dos próprios atos.
Tia Zulmira, certamente já observou o leitor, hoje de tédio não morreria; no máximo, correria o risco de se tornar repetitiva, tantos e tão freqüentes têm sido os ditos e os autores dignos daquele atestado.
Como se a disputar o primeiro prêmio de algum certame, os presidentes da República e da Câmara revezam-se na produção de impropriedades e/ou inutilidades verbais, cada qual ao seu estilo.
O presidente Luiz Inácio da Silva, mais imponente, mas não menos fértil, às vezes deixa de marcar pontos, passa despercebido.
Na terça-feira passada, enquanto as atenções ainda se ocupavam da digestão do discurso da solução para a queda dos juros por intermédio de uma mobilização nacional de traseiros, Lula dividia o País em duas eras: AL e DL.
"Estou convencido de que quando terminar este mandato poderemos discutir o que aconteceu no Brasil antes e depois de nossa passagem pelo governo", disse num pronunciamento eivado de palavras sem conteúdo e de idéias absurdas que já não é sempre que merecem registro ou causam assombro.
São simplesmente tratadas como parte de um anedotário inconseqüente que percorre as mentes, as bocas, a Internet, é incorporado ao cotidiano do País e, aos poucos, vai transformando o presidente da República quase num personagem inimputável no tocante a ações e pensamentos.
No espaço de uma semana, o presidente fez duas afirmações em tese importantíssimas. Disse que o biodiesel será o Pró-álcool do governo dele e que haverá outros instrumentos para o controle da inflação, além da taxa de juros.
Fossem outros os tempos e o presidente levado mais a sério, tais declarações teriam causado um rebuliço de monta na economia. No entanto, não aconteceu coisa alguma.
Ninguém se mexeu para correr a plantar mamonas de modo a enriquecer muito em breve com o novo combustível, nem houve grande pressão sobre o Ministério da Fazenda em busca das medidas para baixar os juros. As pessoas – as mais imediatamente interessadas, políticos, jornalistas, empresários – deixaram para lá.
Isso é bom, é positivo? É péssimo, muito negativo, pois significa a desvalorização da palavra do presidente e a banalização das impropriedades cometidas.
Todavia nada se compara – e aí já teríamos o campeão, fosse o caso de uma competição – ao desempenho do presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti, que virou simplesmente uma usina de entretenimento.
Ele acredita que é levado em grande conta, que é solicitado a falar aqui e ali a todo o momento, porque seus raciocínios são imprescindíveis à conformação da conduta nacional.
O deputado não percebe que é apenas instado a produzir ditos pitorescos e a assumir posições exóticas. Está sendo consumido como um desses produtos a respeito dos quais todo mundo se interessa, como os tamagoshis e kikos marinhos.
É possível, mas não é certo, que Severino tenha tido uma leve noção do real impacto de suas opiniões para o País que cuida da vida, pelo tamanho da vaia recebida na festa do 1º de maio em São Bernando do Campo.
Isso é bom, é positivo? É péssimo, é negativo, pois significa a carnavalização da figura do presidente da Câmara, a casa da representação popular. Como um dos símbolos da democracia, não convém que seja alvo de zombaria. De crítica sim, porque ajuda. A galhofa desmoraliza.
A situação não é para brincadeiras e assim deveria ser percebida. Senão pelos personagens em questão, ao menos pelos mais sensatos que em torno deles gravitam.
Pode parecer exagero ou excesso de zelo, mas esse tipo de ambiência vai minando o sentido de autoridade, desqualifica o conceito de representatividade, dilui valores e reduz a capacidade geral de julgamento.
Tudo passa a valer, nada mais é passível de limite pois, se vem de cima – isso principalmente no que tange à camada menos informada da população –, acaba sendo incorporado como verdade e norma de conduta aceitável quando não pior, aconselhável.
Guerra fiscal
Ministro do Planejamento quando da implementação da Lei de Responsabilidade Fiscal, Martus Tavares considera injusta a afirmação do atual titular da pasta, Paulo Bernardo, de que durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, antes da lei, foi feita uma "gastança" em regra.
"Na época estávamos ocupados em consolidar a queda da inflação, em sanear o sistema bancário e em tomar outras tantas medidas combatidas pelo PT", diz ele.
O DIA
Nenhum comentário:
Postar um comentário