E o preço a pagar não será só externo, com a abertura de tribuna privilegiada para afirmação de posições contrárias não apenas aos compromissos internacionais assumidos ou presumidos pela diplomacia brasileira.
É também interno, pela flagrante agressão à Constituição brasileira contida na proposta do texto final da cúpula a ser avalizado hoje pelos países participantes.
Ali será aprovada uma condenação ao terrorismo, com ressalvas aos casos em que se justificar ser usado como arma de defesa de um povo contra invasão estrangeira. Na concepção do chanceler Celso Amorim, o entendimento a tal princípio deve ser livre.
“Cada um interprete como quiser”, disse ele, indiferente ao fato de que, primeiro como cidadão e depois como autoridade governamental, deve obrigações aos ditames da Constituição e esta, no tocante ao terrorismo, não deixa margem a dúvidas.
O embaixador Celso Amorim ignorou em sua declaração a inexistência de livre arbítrio para observar, ou não, o Artigo 4º que enumera os princípios a serem seguidos pelo Brasil em suas relações internacionais. É obrigatória a obediência a todos os itens, entre os quais a “solução pacífica dos conflitos” e o “repúdio ao terrorismo e ao racismo”.
Ou seja, a “ousadia” preconizada pelo presidente como razão de ser e atributo primordial da cúpula tem limites. Sejam eles os da lei brasileira ou das normas e convenções internacionais, como aponta o ex-chanceler Celso Lafer ao lembrar os vários temas que compõem a proposta de reformulação do Conselho de Segurança da ONU.
“Não é só o alargamento do Conselho o que está em discussão, embora seja essa a preocupação central do ministro das Relações Exteriores. Há diversos temas em pauta, entre eles o da liberdade de viver sem medo”.
“Annan defende a idéia de que o terrorismo é inaceitável em qualquer cultura, sob qualquer motivação”, afirma o ex-ministro, ressaltando a inexistência, na tese do secretário-geral, de exceções aceitáveis.
A despeito da satisfação das autoridades brasileiras com o posto de mestre-de-cerimônias de um encontro considerado “de primeira grandeza” pelo Itamaraty, é preciso pesar e medir as conseqüências vis-à-vis a evidência de que as relações entre os países não vivem de eventos, mas da soma das atitudes.
Como, quando, onde e por que esse tipo de patrocínio pode ajudar o País a incrementar seus negócios no mundo, a encaminhar bem os contenciosos em organismos de comércio exterior ou mesmo a dissolver tensões de ordem política?
À primeira vista, o que se vislumbra são dificuldades, e não facilidades.
Se a movimentação visa a chamar a atenção e criar uma impressão de importância em torno do Brasil, cumpriria informar a suas excelências palacianas e diplomáticas que o mundo não funciona assim, na base dos impulsos de passeata. Há uma realidade a ser levada em conta.
E é frente a esta que o Brasil terá de prestar contas depois de servir de palanque a toda sorte de interesses de países com os quais não temos histórico de relações, coincidência de propósitos nem identidade de objetivos a cumprir.
Os resultados reais dessa cúpula, é evidente, não poderão ser contabilizados hoje, ao seu fim. E serão piores ou melhores a depender do grau de seriedade emprestado ao Brasil no conceito do mundo real.
De graça
É verdade que a posição brasileira de reconhecimento da posse argentina sobre as Ilhas Malvinas é conhecida, bem como não se configura novidade o consenso sul-americano pró-Argentina nesse contencioso com a Inglaterra.
A inclusão do tema no texto final da cúpula não é mera formalidade, pois
acrescenta apoio dos árabes aos argentinos.
O DIA
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