Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, maio 20, 2005

A aposta na crise por Ricardo Noblat


É tamanho o espanto de políticos experientes com os sucessivos erros crassos cometidos pelo governo que eles começaram a se tornar paranóicos (mais ainda do que normalmente são).
A pergunta recorrente esta semana em Brasília foi:
- Será que o governo está errando de fato ou será que essa sucessão de erros não esconde uma estratégia?
Em outras palavras: será que os erros não são propositais para ao cabo alcançarem determinado objetivo?
A dúvida frequenta a cabeça de gente como José Sarney, Renan Calheiros, Sigmaringa Seixas, Cristovam Buarque, Pedro Simon e Paulinho Delgado, entre outros.
De pelo menos um deles, ouvi o seguinte raciocínio:
- É claro que há vida inteligente no governo. Não é possível que somente nós, aqui fora, estejamos detectando tantos desacertos. Então tudo isso deve ter uma razão de ser.
Mas qual?
Talvez esta: o governo estaria apostando no acirramento da crise política para tentar se fortalecer às custas do enfraquecimento dos partidos e, por tabela, do Congresso.
Um indício: quando Lula veta um aumento concedido pelo Senado a seus servidores deixa mal o Senado diante da opinião pública.
Afinal, o aumento estava previsto no Orçamento da União, fora combinado com o governo e defendido da tribuna do Senado pelo líder do governo, Alosio Mercadante.
Lula saiu do episódio como governante responsável.
Os senadores, como perdulários.
Outro indício: quando o governo escancara que negocia com os partidos o preenchimento de cargos na administração pública deixa mal os partidos e os políticos em geral.
Lula sai do episódio como um presidente obrigado a ceder ao apetite dos políticos para tentar governar um pouco.
Os políticos, como fisiológicos.
Mais um indício: quando promete melhorar suas relações com os partidos e não faz o menor esforço para isso, Lula aumenta o grau de irritação dos políticos com o governo. Eles retaliam criando dificuldades dentro do Congresso.
Lula sai de vítima.
Os políticos, de vilões.
A Polícia Federal elegeu os políticos como alvo de frequentes operações barulhentas por toda parte.
Rara a semana em que ex-prefeitos, prefeitos, deputados e suplentes de senadores não são presos sob a suspeita de se beneficiarem de dinheiro público.
As operações são sempre encenadas diante de câmeras de televisão. E mesmo sem necessidade, não faltam algemas para todos.
É fato irrecusável que Lula cultiva desprezo pelos políticos. E que procura manter distância deles. Com Sarney, seu fiel aliado, por exemplo, nunca conversou a sós desde que assumiu a presidência.
Governa ouvindo apenas os que o cercam. E cada vez mais decide solitariamente.
Fora do Congresso, a impressão pode ser a de que os políticos só criam problemas para o governo e que tentam emparedá-lo.
Dentro do Congresso, alastra-se a impressão de que o governo só cria problemas para os políticos e que tenta desmoralizá-los.

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