FOLHA DE SP - 13/12
Quanto mais funcional a sequência de sexo, mais redundante ela é. Fica-se a um passo da pornografia
Deveria
ser o primeiro dos mandamentos da sétima arte: não filmarás cenas de
sexo. Elas tendem ao burlesco ("Instinto Selvagem"), ao doentio
("Crash", "Anticristo"), à manipulação ("Irreversível") ou ao canhestro
(o ovo de "O Império dos Sentidos", Xuxa em "Amor Estranho Amor").
Talvez
o sexo só dê origem a filmes menores porque o cinema, cujo primado é o
realismo, dificulte a imaginação. A lubricidade é mais mental do que
física. Quanto mais funcional a sequência de sexo, mais redundante ela
é. Fica-se a um passo da pornografia. Ou a dois do kitsch. E a
quilômetros da arte.
Três filmes recentes se aventuram na
volúpia. Dois deles tratam do homossexualismo (lésbico em "Azul é a Cor
Mais Quente" e gay em "Tatuagem"), enquanto "Jovem e Bela" reativa um
embolorado postulado machista: a prostituição nasce de fantasias
femininas, e não da necessidade de dinheiro.
Dirigido por
François Ozon, "Jovem e Bela" fala de uma menina rica de 17 anos que se
prostitui, mas não se importa com o dinheiro. O filme insinua que ela
faz isso porque o dinheiro serve de mediação para tudo na sociedade.
Mais tola que essa ideia só a filmagem, que oscila entre o
chique-publicitário e o erotismo de calendário da Pirelli.
"Tatuagem",
do pernambucano Hilton Lacerda, flagra um grupo de teatro marginal nos
anos 70. Integrado por hippies, gays e artistas, ele desperta a
curiosidade de um recruta que é casado e cuja mulher está grávida. O
soldadinho se descobre gay, transa com o chefe da trupe, sua mulher tem
um bebê sem cérebro, militares atacam a turma. Nem por isso o filme se
abala: tudo é farra, tudo é engraçado. Com isso, "Tatuagem" não passa de
propaganda da vida alegre dos libertários.
"Azul é a Cor Mais
Quente", de Abdellatif Kechiche, dura três horas, é sério e não perde o
pique nunca. Perto dele, Ozon e Hilton Lacerda são carmelitas descalças
que leram Lacan. No entanto, o sexo não é o tema de "Azul".
Seu
assunto é a vida de uma moça, Adèle, dos 15 aos 20 e poucos anos. Sua
escola, seu trabalho de professora, sua família, seus amores e, também,
seu sexo.
A menina é acompanhada de perto ao pegar o ônibus,
conversar com as amigas, paquerar. Lentamente, a vida se torna mais
complexa. Ela deixa de ser virgem com um garoto e não gosta. Beija uma
colega e adora, mas ela a rejeita. Aí ela cruza o olhar com Emma e um
relâmpago acende a paixão.
O amor à primeira vista é uma noção romântica que o filme sustenta com criatividade e inteligência.
Criatividade:
como a paixão tem o sexo como fundamento, "Azul" mergulha nele com
gosto. Acontece de tudo, ou quase, quando as moças se deitam. A autora
da história em quadrinhos que serviu de base ao filme, Julie Maroh,
disse que o sexo entre mulheres não é como o filme mostra. Mas quem
garante que exista um jeito específico de fazer amor? Ficção é
imaginação.
Inteligência: não é indiferente que Adèle e Emma
sejam lésbicas, mas o filme não perderia a garra se fossem homem e
mulher. "Os poetas e seus críticos são iguais na cama", W. H. Auden
escreveu, e o mesmo vale para homo e heterossexuais.
A análise
das diferenças sexuais é feita por meio de diálogos. Como quando um
metido a intelectual discorre sobre o gozo feminino. Ou no xingatório
das colegas adolescentes de Adèle ao suspeitarem que ela gosta de
mulheres.
O júri do Festival de Cannes, presidido por Steven
Spielberg (um coxinha de credenciais impecáveis), deu a Palma de Ouro
para o diretor e as atrizes principais de "Azul É a Cor Mais Quente".
Faz sentido, ainda que o filme de Kechiche não seja típico da
pseudo-arte, da estetização, da desconversa que grassa em festivais.
"Azul" enfrenta a vida e a esclarece. Por isso, expandiu a maneira de
ver o sexo.
Entrevista:O Estado inteligente
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