Empresa de Dirceu alterou razão social cinco vezes
Andreza Matais, Fábio Fabrini
BRASÍLIA - O ex-ministro José Dirceu multiplicou suas possibilidades de
negócios após a passagem como ministro da Casa Civil do governo Lula.
Fora do governo e com o mandato de deputado cassado pelo envolvimento no
esquema do mensalão, Dirceu alterou cinco vezes a razão social da JD
Assessoria e Consultoria e incluiu no seu escopo de atuação a atividade
de lobby para diversos setores com interesses no governo federal.
As mudanças no contrato da empresa incluem o registro de uma filial no
Panamá, conforme revelou ontem o Estado. A filial tem o mesmo endereço
da Truston International, sócia majoritária do hotel St. Peter, que
ofereceu o cargo de gerente administrativo a Dirceu, com salário de R$
20 mil, dez dias após ele ser preso pela condenação no mensalão. No
endereço da JD e da Truston funciona o escritório de advocacia Morgan
Morgan, que oferece testas de erro para abertura das filiais no paraíso
fiscal.
Ao ampliar o escopo de sua consultoria, Dirceu fez fortuna. Sua última
declaração de bens pública, apresentada à Justiça Eleitoral em 2001,
informa que ele tinha bens e valores que somavam R$ 172,8 mil, em
valores da época. Somente a casa em que funcionava sua consultoria, em
São Paulo, está avaliada em R$5 milhões por corretores.
Após sua prisão, o imóvel na Avenida República do Líbano, a 300 metros do Parque do Ibira-puera, foi colocado à venda.
A oposição cobrou ontem investigação sobre a filial da JD Assessoria e
Consultoria no Panamá. "A cada dia surge uma nova descoberta daquilo que
seria um grande "laranjal" arquitetado em torno do mensalão. Isto é
gravíssimo, o que exige das instituições que façam ampla investigação",
disse o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR).
A assessoria de imprensa da empresa de consultoria afirmou que anunca
atuou ou estruturou qualquer operação" no Panamá. "O pedido de abertura
de filial, feito a partir do Brasil, nem sequer foi registrado naquele
país, sendo revogado por decisão da própria empresa, que seguiu todos os
trâmites previstos pela legislação."
Dirceu desistiu do emprego no St. Peter após a denúncia de que a empresa
proprietária do hotel tinha um "laranja" como presidente. "Isso reforça
a suspeita de que o hotel é de propriedade do próprio Zé Dirceu", disse
o líder da minoria, Nilson Leitão (PSDB-MT).
Documentos aos quais o Estado teve acesso mostram que, com as alterações
na razão social da JD Assessoria e Consultoria, Dirceu se propôs a
"Viabilizar o relacionamento institucional de particulares com os mais
variados setores da administração pública". Atuou em favor de clientes
dos setores sucroalcooleiro, minerosiderúrgico e ter-moelétrico junto a
órgãos públicos de fiscalização e de meio ambiente, áreas
tradicionalmente dominadas pelo PT.
Enquanto o petista estava na Casa Civil, o objeto da empresa - aberta em
janeiro de 1998 - ocupava apenas quatro linhas dó contrato social, sem
relacionar o lobby. Após sua saída do Executivo, o documento foi
ampliado para 13 linhas.
Dirceu manteve forte influência no governo federal mesmo fora dele. Em
agosto do ano passado, foi flagrado pela revista Veja recebendo
políticos e até o então presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli
num quarto de hotel, em Brasília.
Entre as alterações na empresa feitas após junho de 2005, quando deixou o
governo, está, ainda, a possibilidade de estabelecer parcerias
comerciais com países do Mercosul. Essa mudança foi registrada no
contrato um mês antes de Dirceu constituir a filial da JD no Panamá,
conhecido paraíso fiscal.
A assessoria de Dirceu justificou que o objetivo era prospectar negócios
no Panamá. O país, contudo, não está relacionado no objeto da empresa
nem tampouco integra o Mercosul.
De acordo com um delegado da Polícia Federal ouvido pelo Estado, que
pediu para não ser identificado, geralmente as "filiais" em paraísos
fiscais como o Panamá são abertas somente para movimentar recursos
financeiros de forma a dificultar o rastreamento do dinheiro.
Colaborou Eduardo Brescian
Fonte: O Estado de S. Paulo