GAZETA DO POVO PR - 02/12
Nas divagações infantis imaginávamos que se todos tivessem dinheiro as dores da desigualdade econômica não existiriam. Não haveria nada caro, fora do alcance de uns e à mão de outros. Até nas preces se fazia esse pedido.
No trajeto entre a casa e a escola, pobreza e riqueza eram objeto de elucubração solitária ou de discussões entre amigos que engendravam soluções perfeitas, até alguém pensar um pouquinho melhor e dizer, sem muita certeza, que a ideia não ia funcionar e que sempre haveria iniquidade.
Admitindo a objeção de que se todos fossem ricos ninguém trabalharia, idealiza-se solução diferente para o problema da desigualdade: os preços devem ser baixos. Assim, ainda que haja diferença na posse de dinheiro, as coisas importantes devem ser baratas. Claro, a lucidez de algum dos interlocutores tratava de perguntar: como distinguir as importantes das outras? O debate avançava para a catalogação minuciosa do essencial e exemplificação do supérfluo, deslocando a controvérsia para a necessidade ou acessoriedade de tal ou qual item. Então, como definir o que deve ser barato e o que pode ser caro?
O fim da adolescência trouxe a responsabilidade de sustento de filhos. Imperioso ganhar dinheiro e comprar bens e serviços. A percepção do salário curto e do mês comprido se torna intensa e, diferentemente das digressões infantis, agora a sensação de caro e barato dá a medida da desigualdade de poder econômico. O pacotão de fraldas custa um dia de labor. Não sobra para o cinema de fim de semana. Alguns têm dinheiro para o básico, o luxo e o lazer, e eu aqui no Passeio Público, dando quirera aos pombos enquanto os piás correm pra lá e pra cá.
Por que as coisas têm preço e como ele se forma? O governo deveria fixar os preços? Por que um diamante, que não mata a fome, não veste e não cura, é caro? A resposta quase salta do corpo: o diamante é raro! Logo, a escassez e a abundância compõem a formação do preço. Então, tratamento médico sofisticado é caro pela raridade do conhecimento e equipamento usado. Contudo, é possível viver sem o diamante, mas não sem a cura! Ser essencial ou supérfluo deveria integrar a fórmula do preço, conjecturo, na fieira de pensamentos desarrumados, e empaco na dúvida sobre a existência de preço justo.
Apontar a injustiça de preço resultante de acordo entre fornecedores de algo que os compradores entendem prioritário parece fácil. Rompido o cartel, é difícil saber qual o preço justo e como chegar a ele? Talvez o ponto relevante seja o modo de chegar ao preço. É justo R$ 1 mil o ingresso para espetáculo de gringos setentões que tocam rock pauleira? Nesse caso há liberdade nas duas pontas: os artistas cobram quanto querem e os fãs pagam ou não. Portanto, o modo de apreçar é justo.
De repente, as quimeras primaveris ficam evidentes porque presas à representação numérica do preço, não ao itinerário de formação que deve passar pela constatação de quanta liberdade há entre as partes que apreçam as coisas, e vem à memória a prece-deboche do roqueiro Marcelo Nova, pedindo grana a Deus, de preferência em dólar.
A senescência é demasiadamente cética para acreditar em almoço grátis.
Nas divagações infantis imaginávamos que se todos tivessem dinheiro as dores da desigualdade econômica não existiriam. Não haveria nada caro, fora do alcance de uns e à mão de outros. Até nas preces se fazia esse pedido.
No trajeto entre a casa e a escola, pobreza e riqueza eram objeto de elucubração solitária ou de discussões entre amigos que engendravam soluções perfeitas, até alguém pensar um pouquinho melhor e dizer, sem muita certeza, que a ideia não ia funcionar e que sempre haveria iniquidade.
Admitindo a objeção de que se todos fossem ricos ninguém trabalharia, idealiza-se solução diferente para o problema da desigualdade: os preços devem ser baixos. Assim, ainda que haja diferença na posse de dinheiro, as coisas importantes devem ser baratas. Claro, a lucidez de algum dos interlocutores tratava de perguntar: como distinguir as importantes das outras? O debate avançava para a catalogação minuciosa do essencial e exemplificação do supérfluo, deslocando a controvérsia para a necessidade ou acessoriedade de tal ou qual item. Então, como definir o que deve ser barato e o que pode ser caro?
O fim da adolescência trouxe a responsabilidade de sustento de filhos. Imperioso ganhar dinheiro e comprar bens e serviços. A percepção do salário curto e do mês comprido se torna intensa e, diferentemente das digressões infantis, agora a sensação de caro e barato dá a medida da desigualdade de poder econômico. O pacotão de fraldas custa um dia de labor. Não sobra para o cinema de fim de semana. Alguns têm dinheiro para o básico, o luxo e o lazer, e eu aqui no Passeio Público, dando quirera aos pombos enquanto os piás correm pra lá e pra cá.
Por que as coisas têm preço e como ele se forma? O governo deveria fixar os preços? Por que um diamante, que não mata a fome, não veste e não cura, é caro? A resposta quase salta do corpo: o diamante é raro! Logo, a escassez e a abundância compõem a formação do preço. Então, tratamento médico sofisticado é caro pela raridade do conhecimento e equipamento usado. Contudo, é possível viver sem o diamante, mas não sem a cura! Ser essencial ou supérfluo deveria integrar a fórmula do preço, conjecturo, na fieira de pensamentos desarrumados, e empaco na dúvida sobre a existência de preço justo.
Apontar a injustiça de preço resultante de acordo entre fornecedores de algo que os compradores entendem prioritário parece fácil. Rompido o cartel, é difícil saber qual o preço justo e como chegar a ele? Talvez o ponto relevante seja o modo de chegar ao preço. É justo R$ 1 mil o ingresso para espetáculo de gringos setentões que tocam rock pauleira? Nesse caso há liberdade nas duas pontas: os artistas cobram quanto querem e os fãs pagam ou não. Portanto, o modo de apreçar é justo.
De repente, as quimeras primaveris ficam evidentes porque presas à representação numérica do preço, não ao itinerário de formação que deve passar pela constatação de quanta liberdade há entre as partes que apreçam as coisas, e vem à memória a prece-deboche do roqueiro Marcelo Nova, pedindo grana a Deus, de preferência em dólar.
A senescência é demasiadamente cética para acreditar em almoço grátis.