Parecia um clipe da propaganda do presidente Lula no horário eleitoral de 2006 - e será uma cena recorrente da propaganda da sua provável candidata Dilma Rousseff na sucessão de 2010. Para isso, exclusivamente para isso, é que foram concebidos os rombudos ataques do presidente às inovações adotadas por seu antecessor na política do petróleo, com que ele degradou o comício de apresentação dos projetos que compõem o marco regulatório para a exploração do pré-sal. Não seria de esperar, evidentemente, que Lula reconhecesse os avanços para a economia nacional proporcionados pelas mudanças na Lei do Petróleo, de 1997, que flexibilizou o monopólio exercido pela Petrobrás e instituiu no setor o sistema de concessão - a começar do salto de qualidade no desempenho da empresa, o que, em última análise, tornou possíveis as descobertas das jazidas em águas ultraprofundas do litoral brasileiro.
Um outro presidente poderia até defender a guinada nas regras para o pré-sal, sem, no entanto, ofender a verdade dos fatos acumulados ao longo desse último decênio. Os argumentos para justificar o novo modelo não se sustentariam do mesmo modo - o restabelecimento do monopólio estatal é um retrocesso por onde quer que se o encare -, porém o orador teria se poupado de assacar uma ignomínia. Mas, para Lula, no palanque vale tudo - e tudo para ele é palanque. Daí o golpe baixo retórico de acusar o governo Fernando Henrique de tratar a Petrobrás como "uma herança maldita do período jurássico" ou como "o último dinossauro a ser desmantelado no País". Na disputa do segundo turno de 2006, o lulismo fabricou a enormidade de que o candidato tucano Geraldo Alckmin pretendia privatizar a Petrobrás. Em 2010, o mote será o advento da Idade de Ouro do Brasil, graças ao pré-sal da Petrobrás salva da extinção.
A fala de Lula, quanto não mais não fosse, deixou claro que o jogo pesado eleitoral e a exumação da ideologia estatista são faces da mesma moeda. A ansiedade com que o governo quer ver aprovadas as normas para a exploração das megarreservas - cujos frutos não serão colhidos antes do final da próxima década - tem duas origens que se encaixam e explicam a imposição da chamada "urgência constitucional" para a tramitação da matéria no prazo de 90 dias. De um lado, o intento de propagar, já no início oficial da campanha do próximo ano, que Lula e Dilma deixaram tudo pronto para o País receber "o bilhete premiado" do pré-sal, numa exploração deslavada do sentimento de brasilidade da população, equiparando desonestamente patriotismo e nacionalismo. De outro lado, a pressa se explica pela aversão ao risco político: quanto menos tempo tiver o Congresso para aprovar o pacote petrolífero, maior a possibilidade de passar incólume o que as propostas têm de essencial e mais nefasto: o restabelecimento do monopólio estatal na exploração do recurso.
A Petrobrás será a única operadora do pré-sal. Terá no mínimo 30% de participação nos consórcios com outras empresas. Poderá ser escolhida sem licitação para explorar com exclusividade os blocos mais fecundos - o "filé do pré-sal". E receberá da União um aporte de R$ 100 bilhões para o governo ampliar o controle acionário que nela já detém. O plano de reestatização do setor é o que dá sentido à preferência pelo sistema de partilha de produção, em que o governo fica com a parte do leão do produto extraído. (No sistema de concessão em vigor, a concessionária escolhida em leilão fica com o óleo e paga royalties ao governo.) O modelo da partilha é uma criatura da ministra Rousseff - e, ao contrário do que ela quer fazer crer, não é o que a Noruega adota. Por sinal, um levantamento citado pelo colunista Jorge Vidor, do Globo, evidencia uma correlação alarmante: a partilha é típica dos países corruptos. Quanto menor o grau de percepção da corrupção em um país, maior a probabilidade de que, tendo petróleo, a sua exploração se dará por meio de contratos de concessão.
No seu discurso, Lula falou que a "dádiva de Deus" do pré-sal pode virar uma "maldição", se não se souber administrar os seus proventos.
Estatizar a economia num país em que a privatização do Estado avança a galope - basta ser namorado da neta do presidente do Senado para obter um emprego público - é tornar o risco da "dádiva de Deus" virar maldição uma alta probabilidade.
Um outro presidente poderia até defender a guinada nas regras para o pré-sal, sem, no entanto, ofender a verdade dos fatos acumulados ao longo desse último decênio. Os argumentos para justificar o novo modelo não se sustentariam do mesmo modo - o restabelecimento do monopólio estatal é um retrocesso por onde quer que se o encare -, porém o orador teria se poupado de assacar uma ignomínia. Mas, para Lula, no palanque vale tudo - e tudo para ele é palanque. Daí o golpe baixo retórico de acusar o governo Fernando Henrique de tratar a Petrobrás como "uma herança maldita do período jurássico" ou como "o último dinossauro a ser desmantelado no País". Na disputa do segundo turno de 2006, o lulismo fabricou a enormidade de que o candidato tucano Geraldo Alckmin pretendia privatizar a Petrobrás. Em 2010, o mote será o advento da Idade de Ouro do Brasil, graças ao pré-sal da Petrobrás salva da extinção.
A fala de Lula, quanto não mais não fosse, deixou claro que o jogo pesado eleitoral e a exumação da ideologia estatista são faces da mesma moeda. A ansiedade com que o governo quer ver aprovadas as normas para a exploração das megarreservas - cujos frutos não serão colhidos antes do final da próxima década - tem duas origens que se encaixam e explicam a imposição da chamada "urgência constitucional" para a tramitação da matéria no prazo de 90 dias. De um lado, o intento de propagar, já no início oficial da campanha do próximo ano, que Lula e Dilma deixaram tudo pronto para o País receber "o bilhete premiado" do pré-sal, numa exploração deslavada do sentimento de brasilidade da população, equiparando desonestamente patriotismo e nacionalismo. De outro lado, a pressa se explica pela aversão ao risco político: quanto menos tempo tiver o Congresso para aprovar o pacote petrolífero, maior a possibilidade de passar incólume o que as propostas têm de essencial e mais nefasto: o restabelecimento do monopólio estatal na exploração do recurso.
A Petrobrás será a única operadora do pré-sal. Terá no mínimo 30% de participação nos consórcios com outras empresas. Poderá ser escolhida sem licitação para explorar com exclusividade os blocos mais fecundos - o "filé do pré-sal". E receberá da União um aporte de R$ 100 bilhões para o governo ampliar o controle acionário que nela já detém. O plano de reestatização do setor é o que dá sentido à preferência pelo sistema de partilha de produção, em que o governo fica com a parte do leão do produto extraído. (No sistema de concessão em vigor, a concessionária escolhida em leilão fica com o óleo e paga royalties ao governo.) O modelo da partilha é uma criatura da ministra Rousseff - e, ao contrário do que ela quer fazer crer, não é o que a Noruega adota. Por sinal, um levantamento citado pelo colunista Jorge Vidor, do Globo, evidencia uma correlação alarmante: a partilha é típica dos países corruptos. Quanto menor o grau de percepção da corrupção em um país, maior a probabilidade de que, tendo petróleo, a sua exploração se dará por meio de contratos de concessão.
No seu discurso, Lula falou que a "dádiva de Deus" do pré-sal pode virar uma "maldição", se não se souber administrar os seus proventos.
Estatizar a economia num país em que a privatização do Estado avança a galope - basta ser namorado da neta do presidente do Senado para obter um emprego público - é tornar o risco da "dádiva de Deus" virar maldição uma alta probabilidade.