Quarenta anos são suficientes para embaralhar fatos, obscurecer interpretações, criar mitos. É esse espaço de tempo, equivalente ao de uma geração, que nos separa de 13 de dezembro de 1968, quando o general Costa e Silva, na condição de presidente da República, à frente de seu ministério, num salão do Palácio Laranjeiras, formalizou a capitulação do regime diante da linha dura que conspirava nos quartéis.
Se há quem considere o golpe de março de 64 preventivo ao golpe que Jango e sua república sindicalista tramavam contra as instituições, a decretação do Ato Institucional no5 pode ser considerado uma espécie de punch bem-sucedido da ala radical do Movimento de Março contra os moderados, ou “castelistas”, da primeira fase do regime.
Faz parte dos livros de História o emparedamento enfrentado pelo grupo do general Castelo Branco pela linha dura, em cujas lideranças perfilava, por ironia, o próprio Costa e Silva — mais tarde, vítima do mesmo mal com que enfrentou e manietou o presidente Castelo.
Vale sempre relembrar esse e outros apagões institucionais para que jamais se repitam. Em todos — 1930, 37, 64, 68, sem contar as ameaças — há ingredientes comuns: propostas salvacionistas, autoritarismo, homens providenciais.
É aventura intelectual infrutífera especular o que teria acontecido se houvéssemos transitado ao largo desse acidentes políticos.
Os eventos de 64 e 68 são filhos legítimos do conflito ideológico patrocinado pela Guerra Fria. O choque direto entre o que se convencionava chamar de “direita” e “esquerda” produziu uma sobrecarga de alta voltagem, superior à capacidade de mediação das instituições à época.
Um dos mitos do período de 68 é que havia uma ditadura de direita sendo fustigada por uma ampla frente de democratas. Balela. A frente era ampla, mas nem todos tinham um projeto de democracia.
As frações de esquerda que pegaram em armas objetivavam substituir uma ditadura por outra.
A dos “generais” pela do “proletariado”, ambas ferozes e violentas.
De uma o país provou; da outra, felizmente se livrou.
Por desígnios da História, um “castelista”, general Ernesto Geisel, chegou à Presidência, nela enfrentou os radicais de ambos os lados, nos porões do DOI-Codi e os que restaram nos aparelhos da esquerda armada, venceu-os, e assim pavimentou o caminho para a redemocratização negociada — esta, sem violência.
No cenário político atual sobrevivem egressos das duas trincheiras.
Que continuem a ser apenas símbolos de um ciclo que se deseja superado no Brasil.
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