Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, dezembro 16, 2008

Míriam Leitão As novas da crise


Os freqüentadores do elegante Met Opera House, onde a elite de Manhattan costuma circular seus casacos misturada a simples amantes da música, receberam um folheto informando que alguns dos melhores lugares terão forte desconto, “em resposta à recessão”. Nas lojas da livraria Barnes & Nobles, em destaque o novo livro de Paul Krugman: “O retorno da economia da depressão e a crise de 2008”.

Nada parece com depressão, nem mesmo recessão, nessa área dos Estados Unidos que é o paraíso da “demanda inelástica”, aquela que se mantém em qualquer circunstância. Afinal, Manhattan é onde os preços dos imóveis nem caíram — e a ilha está sempre ocupada por turistas do mundo inteiro. Ainda é uma luta, muitas vezes inglória, pegar um táxi, embora eles sejam muito caros. Há espera nos melhores restaurantes. Há inúmeros tapumes de obras pela cidade. E os pedintes estão onde sempre estiveram. Tudo parece igual.

O Met informa aos “amantes da ópera” que seu Board fez uma doação de US$ 3 milhões para subsidiar 16 mil ingressos em 31 espetáculos da temporada. Ingressos de US$ 140 a US$ 295, na Orquestra e no Grand Tier, serão vendidos a US$ 25 aos sorteados de uma lista semanal de inscritos via internet. “O Board quer demonstrar seu apoio ao público nestes tempos difíceis”, informa o folheto.

Os jornais trazem as más notícias diárias. As de ontem tinham várias frentes: até a instituição filantrópica do Steven Spielberg perdeu seus recursos no vasto escândalo financeiro do ex-presidente da Nasdaq Bernard Madoff. E Spielberg não é um E.T.: com ele há uma legião de perdedores, que vão de bancos europeus, como o Santander, à Fundação do Prêmio Nobel Elie Wiesel. De novo, ninguém sabe como foi que os órgãos regulatórios e fiscalizadores não viram a fraude financeira.

Há um alerta assustador aos trabalhadores. Alguns fundos de desemprego estão começando a secar. Nos EUA não há um FAT federal, que paga o seguro desemprego nacionalmente. Os fundos são estaduais. O de Michigan e o de Indiana quebraram e estão vivendo de subsídios federais. Trinta outros estão ficando sem recursos, e a tendência é que o desemprego aumente, em vez de diminuir, nos próximos meses. O índice de desemprego nos Estados Unidos, pouco acima de 8%, não parece alto a olhos brasileiros, mas, como sempre, é mal distribuído. Detroit tem 14% e teme pelo destino da indústria automobilística, que já demite por antecipação. A ajuda da Casa Branca só fará efeito temporário. O que o vice-presidente Dick Cheney confessou no Senado é que o governo Bush não quer ficar para a História como Herbert Hoover, cuja biografia ostenta uma lista enorme de empresas quebradas na esteira que levou à depressão.

Enquanto o presidente ainda em exercício, George Bush, desvia-se de sapatadas no Iraque, o presidente eleito, Barack Obama, enfrenta dois problemas mais domésticos. O primeiro é que foi informado pela Casa Branca que a Blair House, onde normalmente se hospedam em Washington as famílias dos presidentes eleitos, está ocupada com eventos do atual governo até cinco dias antes da posse. Os Obama precisavam ir antes para Washington, porque as meninas têm que estudar. Obama reagiu delicadamente, dizendo que a transição está sendo feita de forma “amigável”.

Nada amigável é o escândalo do governador Rod Blagojevich, porque a cada novo dia ele traz mais um aborrecimento para o novo presidente. Ontem, os jornais informaram que o já todo-poderoso Rahm Emanuel, escolhido para ser chefe de gabinete de Obama, teve várias conversas com a assessoria do governador sobre o nome a ser indicado. O governador pode pedir afastamento a qualquer momento, ou enfrentará um processo de impeachment por ter, segundo as fitas gravadas pelo Ministério Público, pedido propina para nomear o novo senador para a cadeira de Obama. A melhor solução vem do Partido Republicano, na sua nada inocente proposta de fazer novas eleições, em vez de o senador ser indicado. Custará US$ 30 milhões, mas eles respondem que não se deve olhar o dinheiro quando a qualidade da democracia é que está em jogo. O governador nomear um senador biônico para um cargo vago ao Senado é tão ruim quanto a nossa solução, de pôr o suplente no qual ninguém votou. Nos dois países é preciso avanços, mas os republicanos estão sendo oportunistas.

O escândalo tirou o presidente eleito da sua ofensiva na luta para debelar a crise. Ele deveria estar integralmente dedicado a analisar o que fazer com sua vasta e heterogênea equipe econômica. O escândalo drena forças. Enquanto isso, quem continua no comando para debelar a crise é o presidente do Fed, Ben Bernanke. Há dez anos, em um paper sobre a longa recessão japonesa, ele disse que os japoneses deveriam se espelhar no presidente Franklin D. Roosevelt, no fim da recessão. Segundo Bernanke, era menos importante o que Roosevelt fazia, mas sim a vontade de ser “agressivo” e “fazer experimentos” para tirar o país da recessão. A idéia de experimentações a essa altura assusta. Melhor é ter uma boa idéia usada, já comprovadamente eficaz.

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Com Leonardo Zanelli

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