Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, dezembro 05, 2008

Mais ameaças ao real Vinicius Torres Freire


Folha de S. Paulo - 05/12/2008

Prejuízos nos "hedge funds" contribuem para a queda dos ativos brasileiros e ainda vão continuar fortes até 2009

O DÓLAR no Brasil foi à estratosfera por alguns motivos também domésticos. Empresas em desespero à procura de dólares para liquidar negócios irresponsáveis com câmbio e o mercado tentando ganhar algum sobre o Banco Central, por exemplo, são dois deles. A redução do saldo do comércio exterior já é uma causa meio mista, interna-externa. O corte agudo na oferta de crédito externo, remessas de lucros gordos para matrizes desesperadas de empresas multinacionais são motivos muito entrelaçados na crise mundial. Mas as desventuras dos "hedge funds" contribuem bastante para a maxidesvalorização da Bolsa e do real -e nem se trata só dos fundos que lidam diretamente com ativos brasileiros.
Os ativos geridos por "hedge funds" eram de US$ 1,56 trilhão no final de outubro, segundo estimativa periódica da empresa Hedge Fund Research. Naquele mês, haviam perdido cerca de US$ 40 bilhões devido a resgates de clientes e outros US$ 115 bilhões na operação do negócio.
Tal mercado é opaco, não é regulado e são imprecisas as informações a respeito. Mas, pelas entrevistas e pelas pesquisas com gestores espalhadas na imprensa do meio, depreende-se que a onda de perdas pode ser de 10% extras até o final do ano. A onda de prejuízos e saques deve continuar forte até o final do primeiro trimestre do ano que vem. O pessoal do Morgan Stanley que analisa tais fundos estima que o total dos ativos pode cair 25% até março de 2009.
Um "hedge fund" é, grosso modo, apenas um fundo de capital privado que oferece a "investidores qualificados" (ricos) aplicações em qualquer tipo e combinação de ativos financeiros, em estratégias complicadas.
Compram dívida de empresas, ações, moedas, índices de commodities ou de qualquer ativo, seguros de dívida etc. Quando têm de honrar saques, quando os preços nos mercados mudam, quando fazem caixa ou devem depositar mais garantias para apostas que fizeram, tais fundos liquidam parte de seus ativos.
Nestes dias de caos e iliquidez, liquidar ativos significa provocar baixas ainda maiores nos preços, com o que o ciclo de liquidações e desalavancagem continua. Tais liquidações não são levadas a cabo só por "hedge funds", é claro. Mas devido a seu tamanho influenciam todos os mercados. A intensa variação de preços que isso provoca influencia também a atitude dos investidores em relação ao risco (fogem dele).
Essa cadeia de vendas logo bate no real e nos ativos denominados em real, como o Ibovespa. Segundo a mesma Hedge Fund Research, as maiores perdas de desempenho no ano ocorreram em fundos de mercados emergentes e de commodities, o que nos afeta especialmente.
O rendimento médio dos cerca de 10 mil "hedge funds" está negativo em quase 17% no ano -e a quebradeira de empresas mal começou. Os maiores vencedores de 2008 são fundos dedicados à venda a descoberto de ações: quem apostou na catástrofe ganhou. Dezenas de fundos limitam os saques, "fecham os portões", para não quebrar. Mas em algum momento terão de abrir o cofre e honrar resgates. Para piorar, tais fundos são também fontes diretas ou indiretas de crédito para empresas. Se os fundos estão ariscos, o crédito fica ainda mais escasso e caro na praça.

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