Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 09, 2008

Veteranos que ainda disputam o ouro

Olimpíada | Longevidade
Para eles, o tempo parece
não passar

Alguns atletas, como a americana Dara Torres, 
continuam na disputa pelo ouro mesmo depois de
alcançar a idade em que os esportistas se aposentam


Rafael Corrêa

Fotos MRK J. Terrill/ AP e Jamie Squire/ Getty Images
Auge da carreira
Dara Torres pula na piscina para bater o próprio recorde dos
50 metros nado livre, há um mês. Ela comemora: aos 41 anos,
forma física superior à de muitos atletas mais jovens com 
quem irá competir em Pequim

Mesmo que não ganhe uma medalha nos Jogos de Pequim, a atleta americana Dara Torres já entrou para a história do esporte. Aos 41 anos, ela é uma das nadadoras que vão participar da prova de 50 metros nado livre. Essa competição é a mais rápida da natação e, como ocorre nos 100 metros rasos do atletismo, costuma privilegiar atletas jovens no auge de sua forma física e vigor muscular. A quarentona Dara disputará com atletas até um quarto de século mais jovens que ela. Ainda mais impressionante é que a nadadora ganhou um lugar na equipe dos Estados Unidos, a mais forte entre todas, depois de passar sete anos sem participar de provas profissionais – nesse meio tempo, tratou de uma lesão e teve uma filha. A mulher é um furacão de vitalidade. Recentemente, baixou em 28 centésimos de segundo o recorde americano da prova dos 50 metros nado livre, que ela mesma obteve em 2007. Detalhe: Dara cravou esse recorde pela primeira vez em 1982, quando tinha apenas 14 anos. Na comparação a olho nu, a nadadora parece bem mais em forma do que muitas de suas concorrentes em Pequim. "Fico muito feliz de ser um exemplo para as pessoas mais velhas", disse Dara na entrevista coletiva que deu em Pequim. Foi confirmada, inclusive, sua participação na prova do revezamento 4 por 100 metros estilo livre, ao lado das buliçosas colegas de quarto, na Vila Olímpica, que não a deixam tirar uma soneca sossegada durante a tarde.

Dara, que já possui nove medalhas olímpicas – quatro ouros, uma prata e quatro bronzes –, está indo para sua quinta Olimpíada e será a nadadora americana mais avançada em anos a participar dessa competição. A contínua disposição para bater recordes deixou uma pergunta no ar: como é possível que um atleta de meia-idade possa ser mais rápido hoje do que quando jovem? Para calar os detratores, Dara se submeteu a uma série de exames que deram negativo para o uso de doping. Além disso, topou participar de um programa especial da agência antidoping americana que usa marcadores biológicos para identificar possíveis efeitos do doping nos músculos, tecidos e outras funções vitais, mesmo que a droga usada para alterá-los não possa ser detectada e tenha sido ministrada há algum tempo. Dara não se cansa de repetir que está ainda melhor do que vinte anos atrás porque pode contar com técnicas mais aprimoradas de treinamento e nutrição. A genética, é claro, também ajuda, como se pode perceber por sua pele brilhante e seu sorriso encantador.

Assim como as pessoas de 50 anos agora têm a mesma disposição das de 40, graças a um estilo de vida mais saudável e ao desenvolvimento da medicina e da farmacêutica (desde, é claro, que renunciem ao sedentarismo e aos vícios), atletas com mais de 35 anos usufruem os avanços científicos na área esportiva para prolongar a carreira. Novos métodos permitem montar programas de treinamento que respeitam os limites de cada um. Os treinos e as avaliações da condição física passaram a ser tão precisos e individualizados que conseguem monitorar o nível de desgaste do corpo, mesmo quando as lesões ou o desgaste não são aparentes. É possível, por exemplo, identificar regiões musculares mais frágeis e poupá-las, ao mesmo tempo em que se aplicam exercícios específicos para fortalecê-las. Dessa forma, o atleta corre menos risco de sofrer contusões, o que o ajuda a estender sua vida útil. "O atleta de elite tem de ir até bem perto de seu limite corporal para se manter competitivo. Os métodos atuais, porém, ajudam o esportista a ficar dentro da margem de segurança", diz o fisiologista Paulo Zogaib, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

Getty Images
Recordista em idade
O atirador sueco Oscar Swahn, o atleta mais velho que já participou de uma Olimpíada: aos 72 anos, medalha de prata nos Jogos de 1920, em Antuérpia


A longevidade da nadadora americana não será um caso isolado em Pequim. Aos 49 anos, a ciclista francesa Jeannie Longo participará dos Jogos Olímpicos pela sétima vez consecutiva. Considerada a melhor ciclista da história, ela conquistou nada menos que treze campeonatos mundiais. Neste ano, deixou adversárias com metade de sua idade para trás e dominou as competições nacionais de ciclismo de estrada e contra o relógio – modalidades que disputará nos Jogos Olímpicos. "Manter a forma como uma atleta de nível internacional não é tão fácil. Talvez eu prefira descansar", disse Jeannie, quando indagada se participaria da Olimpíada de Londres, em 2012. O Brasil também disporá de atletas com muitos anos de estrada. Um deles é a capitã da seleção de vôlei, Fofão, de 38 anos. Com quatro Olimpíadas e duas medalhas de bronze no currículo, a levantadora anunciou que este será seu último ano na equipe.

Tradicionalmente, esportes que não exigem tanto do corpo, como hipismo e tiro esportivo, são redutos de atletas "velhinhos". O cavaleiro japonês Hiroshi Hoketsu, de 67 anos, ao participar de sua segunda Olimpíada depois de um hiato de 44 anos, será o mais velho dos Jogos de Pequim. Já o iatista americano John Dane III, de 58 anos, finalmente realizará um antigo sonho: ele vai disputar uma Olimpíada pela primeira vez, na classe Star – a mesma em que competem os brasileiros Bruno Prada e Robert Scheidt. Os almanaques olímpicos registram que o mais velho competidor de todos os Jogos foi o atirador sueco Oscar Swahn. Ele conquistou uma medalha de prata aos 72 anos, em Antuérpia, em 1920. Mas, se Dara Torres arrebatar uma medalha em Pequim, mesmo que de bronze, seu feito será incomparável no terreno da idade. Afinal de contas, o bicho vai pegar dentro da piscina do Cubo d’Água.

 

Fotos Jonathan Ferrey/Doug Pensinger/Getty Images/Kazuhiro Nogi/AFP 



Fotos David Hecker/AFP/Paul Hanna/Reuters/Álbum de família

 

Com reportagem de Kalleo Coura e Paula Neiva

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