Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 10, 2008

Augusto Nunes Sete Dias

É proibido considerar assassino até assassino juramentado


Entre 20 de julho e 20 de agosto de 2000, o jorrnalista Antonio Marcos Pimenta Neves incorporou, sucessivamente, quatro personagens. O delegado Pimenta conduziu o inquérito aberto para apurar por que a também jornalista Sandra Gomide havia encerrado o namoro. O promotor Pimenta denunciou-a por "traição pessoal e profissional". O juiz Pimenta condenou-a à morte. O carrasco Pimenta executou a sentença num haras em Ibiúna, perto de São Paulo: depois de atirá-la ao chão com uma bala nas costas, o matador escolheu a cabeça para o tiro de misericórdia. No dia 25, de volta à antiga identidade, assumiu a autoria do crime.

Oito anos depois, o réu confesso continua em liberdade e o processo continua perambulando pelos tribunais. Como Daniel Dantas, Pimenta hoje sabe que o perigo mora na primeira instância. Os tribunais superiores são muito mais misericordiosos, começou a aprender em março de 2001, quando o ministro Celso de Mello, do STF, revogou a prisão preventiva decretada sete meses antes pela juíza de Ibiúna, Eduarda Corrêa. Em maio de 2006, o juiz Diego Mendes condenou-o a 19 anos de reclusão. Autorizado pelo STF a esperar longe da cadeia a decisão do Tribunal de Justiça sobre o recurso do mês, soube em casa que os 19 tinham virado 18.

É muito, comoveu-se a ministra Maria Thereza de Assis e Moura, do Superior Tribunal de Justiça, relatora do recurso do mês e mãe da idéia de baixar para 15 anos o castigo que o criminoso não cumprirá. Não foi a única boa notícia da semana. Encerrada a sessão do STF que liberou o caminho das urnas para a turma da ficha suja, Pimenta também ficou sabendo que, se quiser, está livre para disputar um cargo político sem se sujeitar a acusações constrangedoras. "Ninguém pode ser considerado culpado até que a sentença tenha transitado em julgado", lembrou o ministro Celso de Mello. Pimenta é assassino. Mas não é considerado assassino. É a lei.


- Um bandido que já foi mocinho


A Comissão de Anistia aprovaria em minutos a concessão do prêmio em dinheiro reivindicado por um ex-marinheiro que, forçado a desistir da carreira militar pelo golpistas de 1964, engajou-se na luta armada contra a ditadura dos generais e combateu na clandestinidade até ser capturado em 1970. Como não indenizar alguém assim?

A Comissão de Anistia arranjaria em minutos uma vaga na turma dos responsáveis por crimes imprescritíveis um ex-marinheiro que, cooptado por torturadores a serviço do regime autoritário, entregou à morte meio mundo, até a mulher grávida. Como deixar de punir alguém assim?

O mocinho do primeiro parágrafo é um caso exemplar de perseguido político claramente prejudicado pela tirania dos quartéis. O bandido do segundo parágrafo, por cumplicidade ativa, enquadra-se no crime de tortura, por cumplicidade ativa. Simples assim, se o herói e o o vilão não fossem o mesmo José Anselmo dos Santos, o notório Cabo Anselmo.

Surpreendidos pelo requerimento de José Anselmo dos Santos, os integrantes da comissão acham que pareceria estranho indenizar um Cabo Anselmo e recomendar cadeia para o outro. E decidiram que o melhor a fazer é deixar a decisão para o próximo governo.

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