Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, maio 10, 2005

Luis Garcia: Quatro mais quatro


Na semana passada, o PT decidiu apoiar a emenda que acaba com a verticalização, norma que obriga os partidos a só se aliarem nas disputas estaduais com as legendas a que estiverem associados nas eleições presidenciais. A regra é, ou seria, um dos raros avanços na reforma política, forçando os grupos políticos a serem coerentes na prática com os programas que defendem teoricamente.


Acabar com a verticalização será uma vitória da conveniência sobre os princípios. E também mais uma prova de que a reforma política continuará sendo defendida por todos os partidos, mas eficientemente sabotada sempre que interferir na conquista de fatias crescentes de poder.

Essa política de resultados — para usar a expressão mais generosa possível — é visível principalmente em época de eleições. Mais ainda quando o partido no poder está terminando os seus primeiros quatro anos, e considera que qualquer preço é bom e justo para ganhar mais quatro. Os métodos usados pelo PSDB para garantir a reeleição de Fernando Henrique Cardoso e apoio suficiente no Congresso mostram que nesse aspecto o saco é um só, e nele estão todos os gatos.

Até certo ponto, dá para entender. Quatro anos são pouco para mostrar resultados de um programa de governo. O grande trunfo de Fernando Henrique ao fim de seu primeiro mandato era o Plano Real. E só, embora mais tarde aparecessem avanços notáveis em saúde e educação. Lula chegará a 2006 também com o solitário trunfo da política econômica. A reeleição dependeu para Fernando Henrique — e dependerá para Lula — de alianças de conveniência (embora no atual governo elas mais pareçam alianças inconvenientes caoticamente administradas). Uma reforma política para valer fecharia essa porta. Quantos e quais líderes políticos brasileiros, no poder ou com perspectivas imediatas de chegar a ele, terão interesse sincero em vê-la fechada?

E outras regras do jogo pioram as coisas. Não é por acaso que nenhum país politicamente maduro tem sistema igual ao nosso: mandato presidencial de quatro anos com direito a uma reeleição, num sistema político multipartidário.

Teoricamente, é o que existe nos Estados Unidos, com diferença crucial: lá, na prática, há apenas dois partidos. Fora democratas e republicanos, não existem legendas capazes de influir numa disputa pela Casa Branca: os pequenos partidos têm força desprezível. Na hora da reeleição, o partido no poder tem que conquistar eleitores na planície da campanha eleitoral: não há interlocutores para a negociação de alianças. Isso não moraliza inteiramente o processo, mas contribui para fazer com que o partido no poder seja bastante parecido com o partido na campanha eleitoral.

Para um sistema multipartidário, um mandato maior, sem reeleição, talvez fosse solução mais lógica. Exemplos antigos nem sempre são adequados, mas os cinco anos sem reeleição de Dutra e JK não foram má experiência. E, sem contar, por razões óbvias, o regime militar, os cinco anos funcionaram adequadamente com José Sarney e, apesar do trauma do impeachment, com Collor/Itamar.

Só a partir do governo Fernando Henrique é que vivemos com a fórmula dos quatro anos mais uma reeleição. Parece ser a pior solução.

O GLOBO

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