Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, maio 12, 2005

DORA KRAMER:A ilusão da ordem unida

A cruzada em favor da volta do ministro José Dirceu à coordenação política do Governo não é uma simples expressão de um desejo manhoso do PT de retomar o posto e desalojar de lá o PCdoB.

Considerando o apoio público e oficial emprestado pelo ministro da Comunicação e Gestão Estratégica, Luiz Gushiken, mais parece uma campanha institucional.

E é quase isso. Apenas petistas e governistas não podem enunciar assim de forma direta a questão para não criar mais atritos com os aliados, não denotar excesso de zelo com o destino eleitoral do PT nem fazer da operação retorno um ato reles ou sobre o qual se lancem dúvidas.

O pressuposto central do plano da volta é o de que, com José Dirceu na coordenação política, a base de apoio parlamentar voltará a nutrir temor reverencial por aquela instância hoje desprovida de instrumentos objetivos e de sensações subjetivas no tocante à exibição de força e poder.

Acreditam os defensores de semelhante tese que seja possível, agora, reproduzir aquele clima obsequioso do primeiro ano de Governo; mais precisamente até a descoberta de que o homem encarregado de fazer o contato da Casa Civil com o Congresso era dado também ao exercício da corrupção.

Agora, um ano e meio e inúmeras derrotas depois, o PT sente que a situação requer uma providência urgente pois os partidos antes tão obedientes comportam-se como a caricatura do garçom que refuga o cafezinho no gabinete em fim de Governo.

Daí a premência de postar José Dirceu como poderoso outra vez na cena a fim de que sirva de referência política. Por isso mesmo, a palavra de ordem do momento é “autoridade”, pronunciada com empenho e solenidade por todo o primeiro escalão petista.

A idéia de tirar Aldo Rebelo da coordenação tem, portanto, menos a ver com a visão de que um petista teria melhores condições políticas de reorganizar os aliados e muito mais com a necessidade de produzir um efeito especial.

Líderes no Parlamento e ministros do PT exibem plena consciência de que nem Aldo Rebelo pode ser responsabilizado pelo desastre político nem de seu substituto deve-se esperar o milagre da recuperação.

As razões da desandada geral são diversas, não guardam relação com a atuação desta ou daquela pessoa e resultam do conjunto de uma obra malfeita. Restaria, nesta hipótese, tentar refazer a unidade usando como amálgama a expectativa da distribuição de benesses estatais, a popular fisiologia.

Um problema, porém, pode atrapalhar a perfeita consecução do projeto e não se trata de nenhuma rejeição de natureza ética ao método. Ao contrário: o impedimento estaria exatamente no descrédito acumulado pelo Governo nesses dois anos e meio, seja como negociador confiável ou como representação de perspectiva eleitoral líquida e certa.

Terrível

Pode-se discordar, mas digamos que seja possível compreender que o presidente Luiz Inácio da Silva tenha achado por bem agradar a seus convidados, fazendo uma apenas leve referência ao terrorismo em seu discurso de encerramento da Cúpula América do Sul-Países Árabes.

Impossível, porém, é considerar pelo menos aceitável a visão presidencial de que o terrorismo é fruto da injustiça social. Tal conceito caiu em desuso até como justificativa à violência urbana, quem dirá ao terrorismo que grassa, atormenta e aterroriza países ricos.

No plano interno, já aprendemos a não levar ao pé da letra tudo o dito pelo presidente da República. Suas frases nem sempre expressam seus pensamentos ou suas intenções e, por causa, disso relevam-se muitas coisas automaticamente.

No âmbito externo, entretanto, tal mecanismo não está em funcionamento.

Desse modo, o mundo depreende que a palavra do presidente é de fato a posição do País.

Sem cerimônia

Profissionalmente cerimonioso, o Itamaraty adaptou-se rápido à nova ordem regida pela informalidade.

Dizem freqüentadores das recepções nos últimos dois anos e meio que a ausência de cerimônia em relação a normas de horários a maneiras para receber convidados é constante e está devidamente incorporada aos usos e costumes da casa de Rio Branco.

No jantar oferecido aos presidentes e majestades presentes à Cúpula de Brasília, a leve impressão de desordem já se instalava à alma do convidado na chegada: depois de descer sobre uma faixa de grama – o acesso aos carros não desembocava em terra firme –, de enfrentar a desinformação dos funcionários da recepção, o pontual conviva deparava-se com um corre-corre de diplomatas no salão.

Cinco minutos antes do horário marcado no convite, nem o cerimonial tinha pronta a mesa de distribuição de marcação de lugares, ainda não havia um só Dragão da Independência perfilado à entrada para recepcionar as autoridades e as portas do Itamaraty estavam literalmente fechadas.

A receber os convidados rigorosamente ninguém, como nem uma só cerimoniosa alma desviava-se do lufa-lufa de última hora para se interessar por saber se algo poderia fazer em prol do vivente desde a hora marcada ali presente.

Explicação de um ambientado e solícito segurança: “Agora, tudo começa atrasado, é normal”. Pode ser habitual, normal não é.

O DIA


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