Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, março 15, 2005

Folha de S.Paulo - Luis Nassif: O país da pequena empresa - 15/03/2005

Os jornais são pródigos em manchetes sobre o desempenho das empresas. Bancos repetem lucros enormes, outros setores industriais têm lucros recordes, grandes redes varejistas ampliam suas vendas e sua rentabilidade. Mas, afinal, que país é este? Os números estão certos ou o país está errado?
A discrepância é tal entre números e realidade que um amigo meu, economista de renome, só encontrou uma explicação para esse curto-circuito cognitivo. O país vai bem, mas a segurança vai mal, passando a impressão de que tudo vai mal. E segurança é um problema de leis, não uma decorrência do quadro econômico.
O ponto central dessa ginástica toda é a escassez de informações sobre as pequenas empresas. Os dados existentes são basicamente balanços de empresas de capital aberto, perto de 300, e dados de associações de grandes empresas.
Hoje em dia, a informação é peça-chave no jogo econômico. Tomem-se os cabeças de planilha. Seu papel é esmiuçar dados escondidos, fazer ilações inescrutáveis, para defender os pontos de vista em geral indefensáveis. Esse mesmo jogo se aplica nas avaliações das verbas sociais. Há toda uma ginástica para identificar melhora nos indicadores e tentar, de alguma forma, associá-las ao doloroso processo de oligopolização ao qual a economia brasileira foi submetida na última década.
Sobre a pequena empresa, o melhor indicador de que disponho é uma tia que tem uma escolinha na Vila Maria, zona norte de São Paulo. A cada ano que passa, diz-me ela, mais velhos são os carros dos pais de alunos, menos renda eles têm, maiores são o desemprego e a inadimplência.
Grande parte desse desconhecimento se deve à ausência de informações setoriais auditadas. Não raras vezes avalia-se um setor pelo desempenho de apenas uma empresa -a de maior expressão, que tem capital aberto. Há um conjunto de empresas médias e grandes de capital fechado, sem obrigação de divulgar e auditar os dados. E um universo amplíssimo de pequenas empresas, que utilizam o balanço apenas para efeito tributário e bancário. Mas sem nenhuma garantia sobre a integridade dos dados.
Há alguns levantamentos do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), alguns dados de associações comerciais, algumas pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de periodicidade larga e, portanto, sem muito apelo jornalístico.
O caminho talvez fosse o de uma política pública que incentivasse ou mesmo obrigasse as associações setoriais a fornecer informações constantes sobre o setor. Algumas delas, como a que junta as linhas de ônibus de turismo, conseguiu um razoável conhecimento sobre o setor, convencendo as associadas da importância de ter os dados para benchmark.
Na verdade, informações fidedignas são o grande instrumento político para a atuação dessas associações. Com o avanço da internet, não é mais tarefa impossível o mapeamento das empresas, descendo alguns degraus até a pequena empresa. Fica ainda a lacuna da micro e da empresa de fundo de quintal. Mas pelo menos deixa-se de lado essa mania míope de analisar o país somente por meio da lente das grandes (e poucas) empresas.

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