Na economia como no mundo, vale o verso de Mauro Duarte: "O que tinha de ser já era". É legítimo celebrar a confirmação das expectativas de expansão de 5,2% do PIB em 2004. Mas é crucial não se deixar iludir pelos números passados. Há um longo dever de casa a ser feito caso se queira repetir o crescimento de 2004 neste e nos próximos anos.
O primeiro passo é manter o realismo. O crescimento de 2004 não chega a impressionar quando é comparado no tempo e no espaço. A base de comparação é muito fraca. O ano retrasado foi o pior desde 1998. O contraste com o resto do mundo é ainda mais revelador. Em 2004, o Brasil cresceu abaixo da média de vários países, como Venezuela (17,3%), Argentina (8,8%), China (9,5%), Índia (6,5%) e Rússia (7,1%), para citar alguns emergentes.
Analisada friamente, a expansão brasileira de 2004 foi uma providencial carona que o país tomou no crescimento da economia mundial. Podia ter perdido a carona, é verdade. Mas é urgente começar a pensar como depender menos da locomotiva externa para manter o crescimento.
As médias anuais são ilusórias. A produção cresceu 5,2% em 2004, mas a ritmos muito diferentes. Nos primeiros dois trimestres, quando muitos desavisados ainda duvidavam de que a taxa de crescimento chegaria a 3%, o país crescia a mais de 7% ao ano. No último trimestre, quando alguns analistas e o próprio Copom (Comitê de Política Monetária) temia um superaquecimento por excesso de demanda, a economia já havia desacelerado, ao registrar taxa de apenas 1,7%.
É legítimo celebrar o crescimento de 10,9% do investimento em 2004. Salta aos olhos, por exemplo, a expansão de 19,3 % verificada em máquinas e equipamentos. Mas novamente o dado mais recente merece atenção. A formação de capital caiu no último trimestre (-3,9%).
O comportamento do investimento é crucial para o crescimento sustentado. A taxa de inversão deve atingir cerca de 20,7% em 2005. Seria necessário aumentá-la em pelo menos quatro pontos percentuais para o país crescer em bases regulares a uma taxa próxima a 4%.
No entanto as políticas públicas conspiram contra o investimento. No plano macroeconômico, os juros estão excessivamente elevados, os gastos públicos continuam crescendo e a carga tributária atingiu níveis insuportáveis para uma economia com o nível de renda per capita como o Brasil (US$ 3.275). No plano microeconômico, persistem as incertezas e as indefinições quanto às regras do jogo. Isso ocorre especialmente nos setores de infra-estrutura, que são os mais importantes para sustentar a expansão competitiva da economia. Queda de pontes e estradas, sobrecarga de ferrovias e paralisação de portos já se tornaram fatos corriqueiros no Brasil.
Alterações súbitas de alíquota de importação, como a que foi anunciada nesta semana para um conjunto de produtos siderúrgicos, que visem a combater a inflação têm um custo elevado e um benefício duvidoso. O Imposto de Importação não deveria ser alterado ao sabor da conjuntura. A inflação é um problema macro, que deve ser combatido preponderantemente com políticas macro. Mudanças das regras do jogo reforçam o clima de insegurança para o investimento. Além disso, é discutível seu impacto sobre a inflação em um momento em que a fonte das pressões inflacionárias é externa. Uma alteração relevante nas alíquotas de importação deveria ser gradual e articulada ao processo de negociação do Brasil na OMC e em outros blocos comerciais como a Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
A notícia da semana que merece realmente ser celebrada foi a vitória na OMC (Organização Mundial do Comércio) no caso do algodão. A deliberação da OMC de condenar a prática de subsídio do governo dos EUA aos produtores de algodão daquele país é relevante em vários aspectos. Em primeiro lugar, ela repercutirá na Rodada Doha, quando será discutida a liberalização do mercado internacional de produtos agrícolas. Em segundo lugar, torna-se jurisprudência e permite a abertura de novos casos, como o da soja, no qual o Brasil estuda contestar a ajuda governamental dada pela União Européia aos seus produtores internos.
Por último, a determinação repercute internamente em países desenvolvidos, pois reforça a posição de segmentos empenhados em reduzir os crescentes déficits fiscais. Isso é particularmente importante para os EUA, cujo rombo orçamentário em 2004 alcançou 4,4% do PIB.
A vitória brasileira é fruto de investimento institucional de vários anos na defesa comercial e que vem sendo continuado pelo atual governo. Tal episódio ilustra como é necessário plantar para colher dividendos no futuro. Se o Brasil não adequar os incentivos para o investimento, não haverá frutos para serem colhidos. Em 2005, a economia deve crescer, ainda que a um ritmo inferior que em 2004. Mas, se alguém perguntar em 2006 sobre o espetáculo do crescimento, ou pelo menos sobre o 5,2% de 2004, a resposta será: já era!
Entrevista:O Estado inteligente
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