By ArchIvo
Mais uma chance para a paz... Na primeira conversa pós-Arafat, Sharon
e Abbas prometem pôr fim à violência
Diogo Schelp
Lefteris Pitarakis/AP |
O RECOMEÇO O aperto de mão entre o palestino Mahmoud Abbas (à esquerda) e o israelense Ariel Sharon: por enquanto, a promessa de cessar-fogo |
O aperto de mão entre Ariel Sharon e Mahmoud Abbas é um desses momentos que provocam suspiros de alívio. Nos últimos quatro anos, desde que desmoronou o processo de paz iniciado com festa em 1993, o Oriente Médio só produziu desalento. O encontro da semana passada entre o primeiro-ministro de Israel e o presidente da Autoridade Palestina representa a oportunidade de retomada das negociações num ambiente melhor, em várias aspectos, que o existente anteriormente. Há três mudanças principais, todas auspiciosas. A primeira é a morte de Yasser Arafat, que abriu caminho para que Abbas, um pragmático que se declara abertamente contra os ataques a Israel, assumisse a liderança palestina. A segunda é a conversão de Sharon, antes um hipernacionalista que se opunha ao recuo de um só centímetro nos territórios ocupados em 1967 e hoje disposto a evacuar tropas e colonos da Faixa de Gaza e de parte da Cisjordânia. A terceira novidade é a percepção crescente entre a população palestina de que, em lugar de ajudar, a intifada dificulta a criação de um Estado palestino.
De concreto, a reunião produziu uma promessa de cessar-fogo. Se a trégua prevalecer, significará o fim da intifada e uma perspectiva de vida quase normal para israelenses e palestinos. Se falhar, a decepção terá conseqüências dolorosas para ambos os lados, como já ocorreu no passado. O que não faltou no Oriente Médio foram apertos de mão, planos de paz e promessas de cessar-fogo. Como o caldeirão de ódios continua fervendo na região, é natural que muita gente ache que nada mais se deve esperar desse tipo de ritual. É um conceito falso, pois nem todos os entendimentos terminaram em fiasco. Israel está agora em paz com o Egito e a Jordânia. Entre palestinos e israelenses, houve dois momentos significativos na busca de paz. Em 1993, no chamado Acordo de Oslo, Israel concordou em transferir gradualmente partes dos territórios ocupados para as mãos de Arafat, na esperança de que isso iria gerar a confiança mútua entre os dois povos. A Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em contrapartida, abandonou o sonho impossível de aniquilar o Estado judeu. Atentados terroristas cometidos por palestinos contrários aos acordos e as pesadas retaliações israelenses puseram tudo a perder. A segunda oportunidade foi a proposta feita a Arafat pelo primeiro-ministro Ehud Barak, em 2000, de queimar etapas e resolver de uma vez por todas o conflito. Arafat rejeitou os termos propostos e, em lugar de avanço nas negociações, explodiu a revolta palestina, que já matou mais de 4.000 pessoas.
O aperto de mão entre Sharon e Abbas deve ser entendido como uma demonstração de boas intenções. Os dois líderes não assinaram nenhum acordo formal, apenas se comprometeram a parar as agressões mútuas. Para Sharon, que tem controle sobre as ações de um Exército disciplinado, é mais fácil cumprir a promessa. Abbas não pode falar pelos grupos terroristas, como o Hamas e a Jihad Islâmica, e ainda precisa reconstruir seu aparato de segurança, arruinado pelas retaliações israelenses. Novos ataques terroristas, seguidos de expedições punitivas de Israel, podem muito bem remeter o aperto de mão da última semana para a galeria dos encontros fracassados. Foi o que se viu na década passada. A decepção entre os palestinos, frustrados pela falta de melhorias em sua vida nos anos pós-Oslo, gerou a intifada. Os israelenses, que se animaram com a possibilidade de paz, viram nos homens-bomba que explodiam dentro de seus ônibus e restaurantes a confirmação de que Arafat não era digno de confiança.
Ainda que não se possa duvidar da sinceridade de Sharon e Abbas, a experiência dos acordos de Oslo mostra os riscos de um processo em que as decisões que realmente importam são deixadas para o futuro indeterminado. Depois de 1993, Israel usou a transferência de recursos e de territórios como um meio de pressionar e punir os palestinos. A Autoridade Palestina, por sua vez, deixou-se desmoralizar pela corrupção, pelo nepotismo e pela incapacidade de controlar o terrorismo do Hamas e da Jihad Islâmica. Em meio a isso, Israel continuou a expandir suas colônias nos territórios ocupados, dando a impressão aos palestinos de que não sobrariam terras suficientes para a construção de um Estado viável. O paradoxo é que a tentativa fracassada de acordo final feita por Barak em 2000 mostra que o tudo ou nada também não funciona. Nem a presença do presidente Bill Clinton ou o peso da superpotência foram capazes de fechar o abismo existente entre israelenses e palestinos nas questões mais profundas, como a divisão de Jerusalém, a localização das fronteiras e o destino dos palestinos exilados em 1948, quando foi criado o Estado de Israel.
No encontro da semana passada, a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, foi uma ilustre ausência. Não esteve presente por razões táticas, para não se expor prematuramente ao fiasco pelo qual passou Bill Clinton. O certo é que, morto Arafat, os Estados Unidos estão ansiosos por uma solução na Palestina. No primeiro mandato, o presidente George W. Bush manteve-se o mais distante que pôde. De público, concordou com Sharon que Arafat era um negociador de má-fé e que não valia a pena conversar antes de a Autoridade Palestina passar por uma reforma moralizante e democrática. A guerra no Iraque transformou a conquista de corações e mentes árabes numa prioridade da Casa Branca. Patrocinar uma solução justa para a miséria dos palestinos é um excelente modo de convencer os muçulmanos de que, afinal de contas, os Estados Unidos não são tão ruins assim.
Uma particularidade do conflito no Oriente Médio é a existência de um consenso internacional sobre como ele deve terminar. Os Estados Unidos, a União Européia e os países árabes concordam que a solução é a criação de um Estado palestino na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, com fronteiras próximas às existentes antes de 1967, e ao lado de Israel. O difícil é conseguir que os beligerantes estejam de acordo sobre os detalhes da divisão, que é complicada pelas dimensões diminutas do território em disputa, pela falta de separação natural entre as duas populações e, sobretudo, pelas birras nacionalistas de parte a parte. O inglês Dan Smith, pesquisador do Instituto Internacional de Estudos da Paz, de Oslo, na Noruega, aponta quatro fatores que costumam levar ao fracasso os processos de paz: a falta de sinceridade dos negociadores, a decepção com promessas não realizadas, a fragmentação interna de um ou ambos os lados do conflito e, por último, a persistência das causas que levaram ao confronto armado. Paradoxalmente, a esperança parece estar onde menos se espera. "O que pode fazer os dois povos aceitarem as exigências um do outro, desta vez, é o fato de que israelenses e palestinos estão, já há algum tempo, cansados da violência diária", diz Ellis Goldberg, professor de ciências políticas da Universidade de Washington, nos Estados Unidos.
...mas os apertos de mão
são apenas o começo
A parte mais difícil do processo de paz começa depois da cerimônia pública. Cada lado precisa convencer seus radicais a respeitar os acordos. Ainda assim, nem todos os acordos de paz fracassaram. Veja o resultado dos principais compromissos entre árabes e israelenses.
Gary Hershorn/Reuters |
1993 ACORDO DE OSLO Quem assinou: Yasser Arafat, pelos palestinos, Yitzhak Rabin, por Israel Resultado: Arafat passou a chefiar um governo autônomo em 1994, mas o terrorismo palestino aumentou. Um anos depois, Rabin foi assassinado por um fanático judeu e o acordo de Oslo acabou abandonado. |
Sven Nackstrand/ATF/AFP |
1994 ACORDO DE PAZ ISRAEL-JORDÂNIA Quem assinou: Yitzhak Rabin, de Israel, e rei Hussein, da Jordânia Resultado: o acordo está em vigor |
1979
ACORDO DE PAZ ISRAEL-EGITO
Quem assinou: Anuar Sadat, presidente egípcio, e Menachem Begin, primeiro-ministro israelense
Resultado: o acordo ainda está em vigor, mas Sadat pagou com a vida por ter feito a paz com os israelenses
2000
CONVERSAÇÕES DE CAMP DAVID
Participantes: Yasser Arafat e Ehud Barak, primeiro-ministro de Israel
Resultado: não houve acordo e, um mês depois, começou a Intifada, a revolta palestina nos territórios ocupados que dura até hoje
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