"Uma das características mais desalentadoras
de Lula é o medo que ele tem da imprensa.
Considerando o grau de domesticação do meio
jornalístico, é um medo inexplicável. Lula não
responde nada a ninguém"
Vá até o site do Palácio do Planalto. Clique na página de Lula, no cantinho esquerdo da tela. Leia tudo. Leia a biografia. Leia os pronunciamentos. Leia o "Café com o presidente". Quando enjoar, entre na seção "Fale com o presidente". Preencha o formulário com seus dados completos, e mande uma pergunta a Lula. Qualquer pergunta serve. Pergunte se ele consegue colocar o dedo na ponta do nariz e andar em linha reta. Pergunte se ele tem alguma suspeita sobre quem matou o prefeito Celso Daniel. Pergunte se ele já experimentou maconha. Pergunte qualquer bobagem. O importante é entupi-lo de mensagens.
Uma das características mais desalentadoras de Lula é o medo que ele tem da imprensa. Considerando o grau de domesticação do meio jornalístico, é um medo inexplicável. Lula não responde nada a ninguém. Algum tempo atrás, pedi-lhe sua lista de leituras preferidas. O secretário de imprensa, Fábio Kerche, mandou me dizer que o presidente estava atarefado demais, visitando Pernambuco, mas que tentaria responder em breve. Esperei uma semana. Esperei duas semanas. Como ninguém respondeu, reiterei o pedido. Educadamente, o secretário do secretário do secretário se comprometeu a consultar o chefe mais uma vez. A seguir, desapareceu. Continuo esperando.
Lula não gosta de livros. Todo mundo sabe disso. Ao pedir-lhe uma lista de leituras preferidas, minha intenção não era zombar de sua falta de cultura. O que eu queria é que o governo fornecesse alguma pista para explicar sua estratégia de longo prazo. Foi o que fez George Bush quando o New York Times o entrevistou sobre suas leituras. Assim como Lula, Bush não é particularmente letrado, mas aproveitou a entrevista para recomendar um livro de Natan Sharansky, que foi alçado à condição de plataforma ideológica para a política intervencionista americana. O New York Times, acertadamente, faz oposição a Bush. Chega a contar mentiras a seu respeito, como aconteceu na última campanha eleitoral. Na semana passada, o jornal publicou mais uma reportagem constrangedora sobre ele: velhas gravações em que o presidente parece admitir que já fumou maconha. É esse o ponto: Bush enfrenta a imprensa, mesmo a que lhe é mais hostil, enquanto Lula não dá satisfação a ninguém, nem para esclarecer assuntos menores, como sua lista de livros preferidos.
O caso do momento nos Estados Unidos é o do falso jornalista que assessores de Bush teriam plantado na sala de imprensa da Casa Branca. Sua função seria levantar a bola para o presidente nas entrevistas coletivas, dirigindo-lhe perguntas combinadas. Descobriu-se que o falso jornalista é um garoto de programa ligado ao Partido Republicano. Se forem confirmadas as suspeitas de que assessores de Bush estão metidos nessa história, a credibilidade do governo ficará comprometida. Lula, claro, não precisa de nada disso. Ele resolveu a relação com a imprensa de maneira muito mais direta: simplesmente nunca deu uma entrevista coletiva, com ou sem jornalistas infiltrados. Vou escrever agora mesmo ao secretário de imprensa Fábio Kerche, perguntando qual é a cor preferida de Lula. Vamos ver se ele responde.
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