Entrevista:O Estado inteligente

domingo, fevereiro 26, 2012

Por que Serra cedeu - Dora Kramer

O ESTADÃO - 26/02/12

José Serra foi para Buenos Aires no carnaval já praticamente decidido
a ser candidato a prefeito de São Paulo, faltando apenas organizar na
cabeça as razões políticas e pessoais que o fariam entrar numa
empreitada até então rejeitada com veemência.

Viajou na companhia de seu melhor confidente: o filho Luciano, com
quem pesou os prós e mediu os contras. De volta, na sexta-feira
acordou pronto a comunicar a decisão ao governador Geraldo Alckmin o
mais rápido possível. Naquela mesma noite ou sábado no mais tardar.

As prévias marcadas para 4 de março, a intensa pressão do PSDB e a
indicação dos dias anteriores de que caminhava mesmo para rever sua
posição não davam margens a hesitações e adiamentos. Era pegar ou
largar e Serra resolveu pegar.

Na realidade porque concluiu não existirem contras - a não ser a
possibilidade da derrota e o fato de que o projeto de disputar a
Presidência da República em 2014 teria de ser necessariamente adiado.

Note-se, adiado, não cancelado, mas essa é outra história a ser
construída mais à frente se as circunstâncias assim permitirem.

Por ora, a decisão de José Serra guarda relação com vários fatores,
sendo o principal deles a premência de tentar impedir o PT de
conquistar São Paulo, a mais vistosa cidadela do PSDB, na perspectiva
de que em 2012 seria a prefeitura e em 2014 o governo do Estado.

Uma conta pragmática: perder a prefeitura seria muito pior que não
concorrer e ganhar pode significar renascer.

Afinal, a eleição é local, mas em São Paulo tem um caráter nacional
inequivocamente simbólico. Na prática, abre-se a Serra a oportunidade
de mostrar um enfrentamento com o PT que na campanha de 2010 deu-se de
maneira dúbia.

O movimento de aproximação do prefeito Gilberto Kassab em direção ao
PT teve um peso fortíssimo: muito provavelmente levaria o candidato
Fernando Haddad a uma vitória no primeiro turno e o PSDB a um beco sem
saída.

Do ponto de vista pessoal, Serra concluiu que se quisesse permanecer
no jogo político não tinha opção a não ser se candidatar.

Uma, para não ser apontado como o responsável pelo início do fim do
partido. Outra, porque não adiantava ficar pendurado na hipótese de
2014 levando em conta a situação de correlação interna de forças, a
desorganização e a falta de unidade reinante no PSDB.

O governo do Estado desta vez não seria uma alternativa, pois Alckmin
é candidato à reeleição.

A candidatura agora seria, então, uma maneira de reorganizar as tropas
em São Paulo, reaproximando Gilberto Kassab de Geraldo Alckmin e
partindo para a formação de uma aliança com o DEM, o PSD, talvez o PSB
e outras legendas menores, mas essenciais para aumentar o tempo no
horário eleitoral de rádio e televisão.

O PPS formalmente fica de fora, com a candidatura de Soninha Francine,
mas na prática não deixa de ser uma espécie de linha auxiliar.

Contrariando as versões correntes, não houve exigências de
cancelamento das prévias nem de formação de chapa puro-sangue. O lugar
de vice está aberto, mas a decisão só será tomada em meados do mês de
maio, porque depende de negociações: o DEM quer o lugar e Kassab,
embora diga o contrário, também pleiteia o direito à indicação, o que
certamente conseguirá.

Quanto às prévias, tudo depende dos quatro postulantes à candidatura.
Se todos desistirem, ficam naturalmente canceladas. Se alguém
persistir, Serra se inscreve e "concorre". Uma disputa de fachada que,
no entanto, custaria menos que o desgaste de insistir no cancelamento.

Nostalgia.
Os grupos de militares da reserva que reclamaram da falta de censura
por parte da presidente Dilma Rousseff às críticas de suas ministras
ao governo autoritário queriam o quê?

Pelo visto, interditar o direito à livre manifestação, num surto
saudosista. Foram obrigados a recuar, chamados à realidade de que
estão fora do jogo político desde a volta ao País à legalidade com o
fim do regime de exceção.

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