Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 24, 2012

Prepotência administrativa Otavio Leite

O Globo - 24/02/2012

A derrubada do elevado da Perimetral ofende ao bom-senso e colide
frontalmente com o princípio básico da razoabilidade dos gastos
públicos. Afinal, aplicar cerca de 1,5 bilhão de reais no
"bota-abaixo" e, como alternativa, construir um túnel subterrâneo - em
área aterrada, com lençol freático raso, o que requer caríssimas
soluções técnicas - justamente numa via consolidada e indispensável
constitui-se, a rigor, num delírio.

São cerca de 100 mil veículos/dia que por lá trafegam para acessar a
Avenida Brasil, a Ponte Rio-Niterói, bem como, no percurso contrário,
outros milhares que se deslocam para o Centro da cidade do Rio, ao
Aterro do Flamengo. Todos já enfrentam engarrafamentos em muitos
horários, e serão condenados ao mesmo dissabor - desta vez no subsolo,
significando mais um cavalar fermento para a neurose urbana. Além, do
caos durante a obra.

Ocorre que essa "empreitada", além do mais, contém graves
impropriedades jurídicas e administrativas que precisam ser
consideradas. Não custa lembrar que o elevado foi construído,
substancialmente, no início dos anos 70, com recursos federais, em
obra executada pelo DER-GB, por delegação do antigo DNER. Fora
incluído no intitulado Plano de Linhas Expressas - Progress, do
Ministério dos Transportes - com o objetivo inequívoco de facilitar o
fluxo para a Ponte Rio-Niterói.

Toda essa operação foi respaldada por decretos, convênios e lei
estadual. Portanto, foi erguido em terreno federal (da Marinha do
Brasil), com verba federal, ficando para o ente estadual a competência
para operar e manter os 5,5 km do elevado. Ainda hoje, figura no Plano
Nacional de Viação do mesmo Ministério dos Transportes.

A União ignora tudo isso? E quanto ao volume de dinheiro público ali
já investido, vai se perder por decisão da Prefeitura do Rio? Quanto
custaria, em valores atuais , uma "nova perimetral"?

E, para complicar ainda mais o caso, vale lembrar que a tal demolição,
no fundo será custeada com recursos do FGTS, utilizados pela CEF, ao
adquirir da Prefeitura os tais Certificados de Potencial Adicional de
Construção (Cepacs). Com efeito, vem a pergunta que não quer calar :
será socialmente justo e adequado utilizar 1,5 bilhão de uma fonte
pública que deveria priorizar investimentos em habitação popular, para
financiar o prazer estético contido na derrubada de um viaduto?

A recuperação urbana (social e econômica) da região portuária do Rio é
um tema relevante. Em linhas gerais, o projeto Porto Maravilha tem
esse propósito, mas esbarra na prepotência administrativa, que ignora
a opinião pública - cada vez mais contrária à derrubada. A extinção do
elevado não pode ser um pressuposto para o soerguimento da região.

Objetivamente, a permanência do elevado atende ao interesse dos
milhares de cidadãos que dele precisam.

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