A chanceler Angela Merkel foi ontem ao Parlamento pedir a aprovação do
pacote de ajuda à Grécia. Seu governo é criticado por estar fazendo
pouco para evitar o pior na crise, sua coalizão política acha que ela
está fazendo mais do que deveria com o dinheiro do contribuinte, e uma
pesquisa mostra que 62% dos alemães são contra a aprovação do novo
pacote. Ontem, Merkel recebeu o apoio da oposição social-democrata.
A má sorte é tal que até o garçom errou o alvo e derrubou cerveja
gelada sobre a governante alemã, em pleno inverno europeu. A situação
de Merkel é um exemplo da dificuldade enfrentada pela própria
Alemanha, que consegue desagradar a todos ao mesmo tempo. O mundo
cobra dos países mais fortes da Zona do Euro que façam mais pelos
países em dificuldade. O problema é que o único país que está
realmente forte é a Alemanha.
A coalizão conservadora está dividida, e o ministro do interior pediu
publicamente a saída da Grécia da Zona do Euro, um dia antes de a
chanceler ir ao Parlamento pedir que aprovasse o pacote. Parece
contraditório e é. No pronunciamento diante do Congresso ela fez um
apelo, mas teve que admitir que não há 100% de chance de que o pacote
funcione para tirar a Grécia da crise. O que ganhou mais destaque não
foi seu veemente apoio do pacote, mas sim a frase de que não era
garantido o sucesso do remédio.
Em Atenas, as manifestações acusam a Alemanha de intervir na economia
doméstica e impor ao país o sofrimento de redução de salários, renda,
economia. Nas reuniões como a deste fim de semana, no México, a dos
ministros do G-20, a cobrança vem de todos os lados, como se ela
tivesse a responsabilidade única e a varinha de condão. Merkel com sua
hesitação crônica não ajuda a melhorar o ambiente para o país e para
si própria.
A cada reunião internacional, a Alemanha fica na desagradável situação
de ser cobrada por todos. A cobrança é injustamente concentrada nela,
a incapacidade de decidir, mas a dificuldade é que Angela Merkel
rejeita todas as ideias e apresenta poucas. Sua atitude é apenas de
negação. E já está marcada a próxima temporada de saia-justa: no fim
de março haverá uma reunião de cúpula da União Europeia e, certamente,
todos os olhares de cobrança serão dirigidos a Angela Merkel. É um
espanto que com tanta reunião, negociação, viagem, ainda reste tempo
para ela governar a Alemanha, que no final das contas é a principal
função do cargo que ocupa.
A proposta da reunião de fim de semana impressiona pelo volume de
dinheiro envolvido. Os ministros de finanças do G-20 falaram em US$ 2
trilhões de recursos multilaterais para socorro de países em
dificuldade. Isso envolveria uma coleta geral de recursos entre os
países, mas aí sempre se esbarra no mesmo ponto: quanto a Alemanha
está disposta a dar para o socorro dos aflitos?
Ninguém acredita que seja possível arrecadar tanto dinheiro. O
economista Raphael Martello, da Tendências consultoria, lembra que a
França está em época de aperto de cinto, em pleno ajuste fiscal. A
Itália já esteve no ano passado no meio do furacão e continua com sua
dívida acima de 100% do PIB. Aí, acaba sobrando para a Alemanha. O
Japão está tentando se recuperar ainda do tombo do ano passado, após o
terremoto. Os Estados Unidos lutam contra a dívida, cujo crescimento
tentará conter com cortes em todo o orçamento nos próximos anos. Sobra
para países emergentes, leia-se China. Mas a China espera que a
Alemanha mostre mais empenho e disposição de abrir o cofre antes de
dizer em quanto poderá capitalizar os fundos multilaterais de resgate.
O Reino Unido cobra da Alemanha como se não fizesse parte da mesma
Europa. O fato de ela não ter entrado na Zona do Euro não a isenta de
participar do esforço coletivo de evitar o desmonte da união
monetária, por três motivos: a Inglaterra tem também uma frágil
situação fiscal, ela também está exposta aos ricos cruzados dos bancos
do continente, e a crise da região a afeta diretamente.
Se, de fora, Angela Merkel é acusada de só dizer não; dentro do país é
criticada por estar dizendo sim demais e comprometendo dinheiro do
contribuinte em socorro a países que recebem a ajuda como atos hostis
e não como ajuda.
A ideia de que haja um fortalecimento dos fundos multilaterais, para
sair deles e não de um cofre específico os recursos para o resgate, é
boa. Protege os países que recebem o dinheiro, e os que concedem, das
hostilidades que costumam cercar essas operações de resgate.
O mais importante nesta semana não será o resultado da reunião dos
ministros das finanças do G-20. O que houve na Cidade do México foi
mais do mesmo: uma nova reunião em que todos os países decidem que é
preciso haver mais recursos disponíveis nos mecanismos de
estabilização ou no Fundo Monetário Internacional (FMI) para momentos
de instabilidade monetária. O que vai dar o tom do mercado esta semana
será o novo leilão de injeção de liquidez do Banco Central Europeu
(BCE). A autoridade monetária vai oferecer recursos por três anos a
juros baixos para os bancos. A ideia é que com isso os bancos possam
ter mais disposição de financiar os governos, principalmente os que
enfrentam problemas. A primeira operação desse tipo foi feita em fim
de dezembro e injetou 500 bilhões no sistema financeiro europeu. Isso
reduziu a tensão. Nova injeção será feita esta semana. Isso ajuda a
melhorar o humor dos investidores, mas, para a solução definitiva, o
mundo continuará esperando que a Alemanha faça alguma mágica.