Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 23, 2012

Brasil realmente caro - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 23/02/12


Moeda volta a ficar perto do nível de valorização dos tempos do Plano
Real, ruim para a indústria

O REAL ESTÁ a um passo de pisar de novo naquela faixa de preços dos
tempos do Plano Real, entre 1994 e 1998, quando esteve
hipervalorizado. A depender do jeito de fazer a conta, já pisou na
linha vermelha.

Trata-se aqui da taxa de câmbio efetiva real. Grosso modo, é o cálculo
do preço do real em relação a uma média das moedas de países com os
quais o Brasil comercia, conta que considera ainda a inflação.

Em suma, os produtos brasileiros ficam cada vez mais caros dada a
combinação de valorização nominal do real (do preço da nossa moeda em
termos de dólar, euro etc.) e do aumento de preços em reais, superior
ao de muitos de nossos parceiros comerciais.

E daí? Daí que 2011 já foi ruim para a indústria, que não cresceu.

O câmbio desfavorável facilitou importações, dificultou exportações ou
limitou o aumento de preços (e de lucros) da indústria -se as fábricas
daqui cobrarem mais, poderão perder mercado para importações.

Não bastasse o câmbio, muito importado está barato porque sobra
produção no mercado mundial.

Enfim, o aperto no crédito aqui no Brasil reduziu a venda de bens mais
caros, como carros.

Em 2012, o câmbio estará ruim. A economia mundial deve crescer menos.
O crédito é uma incógnita, embora as famílias não pareçam ter muito
mais folga para se endividar, mesmo com juros menores.

Quão ruim estará o câmbio para a indústria (nem toda ela, pois setores
se beneficiam de máquinas, insumos e componentes importados baratos)?

Os economistas ligados à finança ("analistas") têm dado o chute
informado de que o dólar valerá

R$ 1,75 no fim do ano. Daqui em diante, a tendência seria de
desvalorização do real. Por quê?

Nossas exportações não vão subir tanto de preço, o saldo comercial vai
diminuir, o fluxo de dólares também, o investimento direto seria
menor, dada a perspectiva de crescimento do Brasil, de parcos 3%. Além
do mais, os juros estão em queda. Tudo isso seguraria a valorização do
real.

A ver. Mas dólar a R$ 1,75 não é ainda um refresco para quem produz no
país. As reduções de impostos para setores da indústria podem melhorar
a rentabilidade ou permitir que as empresas segurem sua fatia de
mercado. Mas, como se diz em tribunal de filme americano, isso também
é "especulativo, protesto".

Por falar em especulação e chutes informados, os economistas mais
certeiros da praça vêm reduzindo suas estimativas de crescimento para
a indústria desde meados de janeiro -preveem agora uns 2%, 2,5%. Na
comparação com 2011, é um progresso. Em si mesmo, é um ritmo bem
medíocre.

Sim, o ano mal começou. "Oficialmente", teria começado ontem, Quarta
de Cinzas. O empresariado em geral parece esperar o fim do trimestre
antes de tocar o barco com mais força. Há a perspectiva de o governo
investir mais neste ano, de a Petrobras pôr em prática os planos
atrasados etc. O tempo na economia brasileira muda por vezes quase tão
rápido quanto o de São Paulo.

Por fim, vale notar que, apesar de todas as maleitas da indústria, o
pessoal do setor está admiravelmente silencioso, reclamando pouco -em
público, ao menos. Ou ficaram roucos? Ou a coisa não está tão ruim?

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