o estado de s paulo
Tudo começou em 1995, com a criação da Lei nº 9.074, que prorrogou por 20 anos as concessões de todas as usinas geradoras e empresas distribuidoras de energia elétrica, determinando que novos concessionários seriam escolhidos unicamente por licitação, como manda a Constituição de 1988. Isso quer dizer que, pela lei, em 2015 serão definitivamente canceladas as concessões da maioria das usinas das maiores geradoras do País - Furnas, Eletronorte, Chesf, Eletrosul, Cemig, Cesp e Copel - e os novos proprietários serão escolhidos em licitações obrigatórias feitas pelo governo. Vencerão também as concessões das distribuidoras de energia que não foram privatizadas e estão sob intervenção da Eletrobrás. Para estas a decisão é mais fácil. O problema se agiganta quando se fala das geradoras, com ativos avaliados em US$ 60 bilhões, governadores, prefeitos e políticos em geral interessados em nada mudar e grandes investidores de olho na licitação de ativos prontos, que dispensam capital de investimento.
O governo criou um grupo de trabalho, chefiado pelo secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, para propor alternativas, enfrentando o que dizem a lei e a Constituição. E caberá ao presidente Lula escolher a proposta a ser enviada ao Congresso.
Para se ter ideia do tamanho da encrenca: se o governo decidir obedecer à Lei nº 9.074 e à Constituição, as quatro subsidiárias da Eletrobrás podem desmanchar como papel molhado. Basta que outros investidores - públicos ou privados - vençam as licitações, apropriando-se de suas usinas. Furnas & cia. morreriam com seus prédios administrativos inchados de funcionários e nenhum faturamento. Por isso foi constituído o grupo de trabalho, que buscará outra solução. Em jogo há duas alternativas:
Todos os contratos de concessão são prorrogados por um prazo a ser definido, no qual seria arquitetado um novo modelo econômico para o setor elétrico para, aí sim, preparar novas licitações.
Em 2015 todas as concessões serão canceladas e o governo fará novas licitações abertas para investidores públicos e privados. Neste caso, o governo terá de escolher entre licitar cada usina, como manda a lei, ou o controle das empresas proprietárias. Ou seja, licita a Usina de Xingó isoladamente ou a Eletronorte inteira, com Xingó e outras hidrelétricas. Se licitar usina por usina, a Eletronorte acaba.
"Como não acredito que este governo fará alguma privatização, prefiro a alternativa da prorrogação temporária e, depois, a venda não da usina, mas do controle acionário das empresas", afirma a economista e advogada Elena Landau, que comandou a privatização da Light em 1996 e se dedica hoje a estudar leis de regulação e privatização.
"Como é alto o custo político da transição de um concessionário estatal para outro, seja público ou privado, o governo não vai querer correr esse risco. Portanto, acredito que a opção será pela prorrogação dos prazos de concessão. Mas com o governo obtendo algum faturamento do concessionário pela prorrogação", avalia o ex-presidente da Aneel Jerson Kelman, hoje executivo da BR Investimentos.
"Minha proposta é o governo unificar os prazos de concessão de todas as usinas e preparar um novo modelo de exploração da energia e das águas dos rios, dividindo o País em bacias e sub-bacias hidrográficas. As sub-bacias seriam licitadas para um novo concessionário denominado ?Autoridade da Bacia?, a quem caberá também zelar pela venda, distribuição e qualidade da água e preservação do meio ambiente", opina José Luiz Alqueres, ex-presidente da Eletrobrás e atual presidente da Light.
Essa é a encrenca que precisa ser enfrentada para construir um novo cenário capaz de atrair capital de investimento, ampliar a geração de energia e dar equilíbrio ao uso da água e ao meio ambiente.