Sabendo usar, o salário pode melhorar
Aviso das consultoras: o figurino é muitas vezes determinante na hora de uma promoção. Aviso dos estilistas: nem o infinitamente repetido terninho é à prova de erro. Quem foi que disse que ser mulher e profissional é fácil? Ninguém
Bel Moherdaui
Fotos Lailson Santos |
NO MANUAL Na empresa presidida por Nadir (centro), gerentes não podem usar sandálias, e entregadores de bermudão, só na televisão |
Desde Oscar Wilde todo mundo sabe que só as pessoas superficiais não se preocupam com as aparências. Mas na hora de se arrumarem para trabalhar, para infelicidade dos recrutadores e especialistas em carreiras, muitas mulheres continuam a incorrer em erros que não fazem bem às suas aspirações profissionais. O primeiro e mais generalizado é acreditar no mantra tantas vezes repetido de que "não existe mais ditadura da moda" e "cada um pode usar o que quer". Na verdade, não pode. "Na área corporativa, as roupas falam pela pessoa, inclusive, ou principalmente, na hora de avançar na carreira. E elas têm de falar bem. Por isso, é importante conhecer o seu tipo físico e o código de vestuário da empresa e saber fazer a mistura correta", diz Fernanda Campos, sócia-diretora da Mariaca, empresa de treinamento e recrutamento de executivos. A segunda atitude profissionalmente indesejável incorre no exagero oposto: mulheres que gostam tanto de moda que não resistem a usar as últimas novidades – assimetrias, recortes e, ultimamente, até a encantadora dupla short e salto alto, uma graça para ir à faculdade, passear no shopping ou sair à noite e uma desgraça para quem tem um emprego e planos de prosperar. Não precisa repetir, mas a consultora Gloria Kalil repetiu, em palestra para funcionários de um grande banco na semana passada: "Roupa social, em especial a de balada, é uma coisa; roupa profissional é outra". Também pela milionésima vez, ela recomendou atenção ao código particular de cada empresa.
EXUBERÂNCIA SOB CONTROLE A executiva Dezée gosta de roupas bem femininas, mas aprendeu que decotes são um perigo nas reuniões com clientes |
Em outras palavras, se você olhar em volta e perceber que todos os seus colegas têm um piercing, corra para fazer a tatuagem com que sempre sonhou – ou simplesmente exiba a que já tem. Em geral, no entanto, quanto mais conservadora for a empresa, maior a necessidade de adaptação das mulheres profissionais. Na filial brasileira da transportadora americana UPS, como em todos os escritórios dela no mundo, existe uma série de normas escritas em papel timbrado, que variam conforme a categoria profissional. Para entregadores (que lá fora, como todo mundo já viu no cinema e na TV, usam bermuda, vetada aqui porque a maioria das empresas brasileiras não autoriza a entrada em traje tão despojado), até o corte de cabelo é especificado em comunicados com fotos. Nas funções mais altas, homens têm de estar perfeitamente barbeados (eventualmente, são convidados a corrigir falhas) e mulheres não podem usar sandálias – há pouco mais de um ano, foi liberado o peeptoe, o modelo de sapato com uma abertura na frente. "Os funcionários são nosso cartão de visita. Eles carregam a imagem e a reputação da empresa, por isso precisam seguir regras predeterminadas", justifica a presidente da UPS, Nadir Moreno. Antes de ser indicado a uma promoção, o funcionário é avaliado por um comitê que verifica habilidades, competências e, sim, modo de vestir. A própria Nadir, linda e, ao contrário do nome, loira, com-preende e segue as regras, ainda que a custo das preferências pessoais. "Adoro sandálias. Compro todas as da face da Terra, mas só uso nos fins de semana e à noite. Também gosto de vestido curto, mas não uso nem em festinhas, porque as pessoas não podem associar a presidente da UPS a um traje desses", revela.
DUAS EM UMA Quando sobe a serra, Alessandra troca estampas e rasteiras pelo pretinho com salto |
A inadequação no vestir pode ter um preço, tanto em termos de progresso na carreira quanto em dinheiro real. A dentista Carla Renata Sarni, 35 anos, dona de clínicas odontológicas, perdeu contrato com uma empresa por ter comparecido a uma reunião "de chinelo de dedo, bermuda e batinha de gestante" – trajes que, contra toda a lógica, ela considerava aceitáveis. "O negócio já estava praticamente fechado, mas me ligaram depois para cancelar", conta a dentista, que, após o parto, trocou o guarda-roupa inteiro. "Trabalhar com roupas mais formais impõe respeito e valoriza o profissional", diz. A proverbial naturalidade das brasileiras em relação ao corpo, tão positiva no que se refere à autoestima, também encerra armadilhas. Roupas explicitamente sensuais provocam olhares entusiasmados nos colegas, mas podem contar pontos contra na hora da promoção. "Eu uso roupa feminina, mas tomo cuidado", diz a maranhense Dezée Mineiro, diretora executiva de uma empresa alemã no Brasil. Ela já passou pelo aperto de ter de segurar o decote na hora de assinar um contrato e aprendeu a adaptar o guarda-roupa às am-bições profissionais, sem abrir mão do estilo exuberante. "Os alemães são conservadores", constata. "Já ouvi gente preocupada até com a sola do sapato, que não deve parecer muito gasta quando se cruzam as pernas."
Mesmo a beleza, que abre tantas portas, pode produzir efeitos dúbios. "A mulher bonita já passa sensualidade naturalmente. Por isso, deve andar ainda mais séria, para evitar que pensem que está ali só pela beleza", recomenda Titta Aguiar, consultora de estilo do Senac, que foi contratada pela bela e vaidosa advogada Daniela Esteves, 32 anos, de São Paulo, e contribuiu para atenuar o efeito do seu guarda-roupa depois de uma reunião reveladora. "Quando entrei na sala, percebi que o impacto causado pela minha roupa, um tailleur rosa justinho, tinha sido grande demais. Diante dos olhares dos homens presentes, eu me senti uma mulher desejada, interessante, mas não inteligente", diz Daniela. "Fora do trabalho, sou sexy e elegante, não tenho nada desse estilo sisudo. Mas aprendi que, quando vou procurar convencer um cliente de um projeto, ele não pode ficar tentando não olhar para o meu decote." Às vezes, adaptar só não basta, é preciso se desdobrar em duas – não, não é fácil ser mulher e profissional preocupada com a carreira. Executiva de uma empresa de Santos, Alessandra Barros, 36 anos, mudou o figurino quando subiu a serra, transferida para o escritório de São Paulo. "Notei que, aqui, se chego para uma apresentação de vestido colorido e sandália rasteira, não me levam a sério. Mas, se vou a uma reunião em Santos de calça e camisa social, encaram como arrogância", diz ela. O conselho mais simplificado dos consultores é observar como se vestem as chefes. "Você tem de se vestir não como as pessoas do seu grupo, mas como as pessoas do grupo ao qual você quer pertencer", aconselha Monique Cosendey Soares, consultora da Dinsmore, empresa de gestão de projetos.
Fotos divulgação e Bob Paulino/TV Globo |
BBB, NUNCA MAIS Grazi foi do jeans rasgado ao minivestido bem usado: adaptação e assessora de estilo |
Até num ambiente onde exibir o corpo e desfilar modismos constitui a norma é preciso entender os códigos. Exemplo de transformação pessoal bem-sucedida, a atriz Grazielli Massafera, 27 anos, superou o estilo que ostentava na época do Big Brother – cabelo comprido demais, maquiagem cintilante, acessórios ofuscantes e, numa esquecível ocasião, jeans rasgados com a marquinha do biquíni aparecendo. "Ela entendeu que seu corpo é de modelo, específico para usar roupas curtas, que alongam mais. Além disso, ela tem rosto, pele e cabelo puxando para o dourado. Qualquer coisa que brilha muito ou contrasta demais vulgariza", analisa a personal stylist Patrícia Zuf-fa, que há um ano e meio a ajuda com o figurino. Hoje, Grazi pode ostentar com elegância o estilo predominante nas festas de celebridades internacionais: um vestidinho de pouco mais de três palmos acompanhado de salto altíssimo. O truque para não ficar vulgar é usar no máximo um acessório e abrandar a maquiagem. "Aprendi também que, quando o decote é grande, o comprimento da roupa deve ser maior. Evito calças de cintura baixa, que acabam com o que o corpo feminino tem de mais sexy, além de marcarem o culote. E, se estou em dúvida, boto um terninho", recita Grazi. Mas terninho moderno, sem cara de uniforme das mulheres que, por medo de errar, se refugiam na praticidade desenxabida. Aqueles conjuntinhos coloridos usados por Hillary Clinton, entre outras, são de lascar. "Mulheres que atuam na política querem mostrar que moda é uma coisa secundária, fútil, o que não é verdade. Em geral, usam roupas e tecidos práticos, mas de baixa qualidade", diz o estilista André Lima. "Meu conselho a elas é: abram uma conta na lavanderia e comprem roupa boa".
Código de condutaAlgumas regras parecem óbvias, mas vivem sendo esquecidas. Para relembrá-las: • Nenhuma parte da roupa de baixo pode aparecer ou mesmo se insinuar, incluindo marca de calcinha ou, pior ainda, alça de sutiã transparente • Existem duas opções: a chefe, ou cliente, pode prestar atenção no que você tem a dizer – ou nos brincos, colares e pulseiras enormes que está usando • "Exagerar no gloss pode parecer que você está babando. Prefira batom cor de boca, que é natural e não tem erro", recomenda Fernanda Campos, especialista em recrutamento de executivos • Quanto mais tradicional a empresa, menos enfeitada deve ser a bolsa • Sandálias muito abertas transmitem uma informalidade excessiva para grande parte dos ambientes de trabalho • Saltos altos infundem autoconfiança, mas se forem altíssimos, acoplados a bicos finíssimos, atiçam o lado fetichista nos colegas de trabalho • Barriga de fora, só se for no ramo do entretenimento noturno • Qualquer coisa com elástico na cintura é de uso exclusivo de grávidas • Quanto mais alta a posição que você ocupa, ou almeja ocupar, menos jeans deve usar. E mais: "Casual Friday não é o dia do relaxo", diz a consultora de estilo Titta Aguiar. "Calça jeans desbotada e tênis não são opção para o trabalho" • Quem tem ou aparenta mais de 20 anos não pode usar short, nem com meia grossa. Aliás, só golfistas profissionais deveriam trabalhar de short • Quanto às leggings, precisa comentar? |