Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 23, 2009

ALBERT FISHLOW O calor do verão

FOHA DE S PAULO


Os objetivos de uma reforma significativa na saúde precisam incluir expansão da cobertura e redução de custo
NESTA SEMANA , o calor vem se tornando cada vez mais intenso nos Estados Unidos. E o mesmo vale para o debate público sobre a saúde. Não se pode apanhar um jornal ou entrar na internet sem encontrar referências ao assunto.
Há quem tenha dito que o governo Obama está planejando eutanásia como alternativa à ampliação dos gastos com o programa federal de saúde Medicare, por conta do progressivo envelhecimento da população. Outros virtualmente difamaram o Serviço Nacional de Saúde britânico, o que levou tanto o primeiro-ministro quanto o líder da oposição conservadora a sair em sua defesa.
Infelizmente, a discussão vem apresentando retórica demais e realidade de menos. Os mesmos grupos que se opõem frontalmente a qualquer opção pública de saúde exigem mais apoio financeiro ao Medicare.
Seria desnecessário dizer que se trata de programa público, que requer recursos adicionais. O Medicare está diante da perspectiva de deficits cada vez maiores depois de 2017.
Cerca de 30% dos gastos anuais com o Medicare, ou perto de US$ 100 bilhões, atualmente ocorrem no último ano de vida dos beneficiários. Nem todos esses desembolsos produzem os efeitos desejados. Por isso é necessária mais atenção ao tratamento de pacientes terminais.
Os objetivos de qualquer reforma significativa precisam incluir tanto uma expansão da cobertura -existem mais de 50 milhões de norte-americanos desprovidos de seguro-saúde- quanto uma redução dos custos -que já equivalem a mais de 16% do PIB (Produto Interno Bruto) ao ano e têm aumentado consistentemente. Essa é uma combinação difícil de atingir e ajuda a explicar os problemas que o governo vem enfrentando. A minoria republicana parece se deliciar em ataques ruidosos, mas oferece poucas sugestões construtivas. Da mesma forma que em 1993, esperam sair em vantagem enquanto os democratas, divididos quanto ao papel que o governo teria de desempenhar em um novo sistema universal de saúde, não conseguem encontrar unidade.
Será que o dilema poderá ser resolvido desta vez?
A resposta depende cada vez mais dos profissionais de medicina. O apoio das administradoras privadas de planos de saúde, companhias farmacêuticas e médicos pode fazer diferença. O governo Obama vem tentando ao máximo conseguir que esses grupos assumam um compromisso positivo ou, no mínimo, não se oponham à iniciativa.
Realizar esse objetivo pode significar que será necessário aceitar uma presença pública menos direta em competição com as seguradoras.
Assistência a cooperativas sem fins lucrativos, como opção alternativa, bastaria para limitar o poder de mercado das atuais administradoras privadas de planos de saúde. É esse, afinal, o motivo para a presença do setor público. Já existe bom número de cooperativas médicas que podem servir como modelo: Mayo Clinic, Kaiser-Permanente e outras.
Uma solução como essa não satisfaria a todos, mas serviria para promover um avanço do sistema na direção de uma maior inclusão, a custo inicial modesto. Já como enfrentar a alta na proporção das despesas reservada à saúde é problema mais difícil. Será preciso gastar mais em procedimentos preventivos e menos em intervenções dispendiosas e improváveis no final da vida. Uma política social é desenvolvida de forma gradual, e não de imediato.
O verão logo estará chegando ao fim. Menos calor e mais reflexão podem começar a aparecer.


ALBERT FISHLOW, 73, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade de Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna. 

afishlow@uol.com.br

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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