Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 09, 2009

CELSO MING - Euforia no câmbio

O ESTADO DE S PAULO

Em depoimento no Senado, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez quarta-feira uma declaração que parecia protocolar, tão protocolar que não foi especialmente notada. Advertiu ele que havia excesso de euforia no mercado. O diabo é que, dependendo da coisa, isso tem consequência.

Meirelles não falava dos juros, que segundo a Ata do Copom estão de bom tamanho, nem das ações, porque o Índice Bovespa tem chão para chegar ao pico de 72 mil pontos visto em maio de 2008. Tampouco se registra euforia no mercado de commodities. Então falou de quê?

Ora, só pode ter sido do câmbio. E quando autoridade monetária fala disso, é preciso prestar atenção, especialmente quando se leva em conta que, até agora, "o Banco Central não tem meta para o câmbio", como reza o mantra. Até agora, nunca Meirelles admitiu que "o câmbio está fora do lugar". Mas não será isso que ele está dizendo agora?

A euforia no câmbio se traduz por meio da forte valorização do real, de 22% em 2009 - o melhor desempenho entre as moedas de países emergentes -, e pelas recomendações de compra dos analistas internacionais que não conseguem ver outra coisa senão firme tendência de alta do real.

Mas, para início de conversa, concorde-se ou não com o diagnóstico de que há uma inaceitável exuberância no câmbio, o fato é que a política do Banco Central também é responsável por isso. Não porque tenha demorado demais para derrubar os juros e, nessas condições, tenha proporcionado a entrada maciça de dólares que vieram para cá para tirar proveito desse retorno financeiro mais alto. É responsável na medida em que proporcionou a blindagem externa da economia e isso empurrou o dólar para baixo.

Cada vez que o presidente do Banco Central exibe a magnífica pilha de reservas externas, mais brasileiros se desinteressam pela compra de dólares e mais estrangeiros se dispõem a trazer recursos para cá ou a não levá-los embora - o que dá no mesmo.

Ao longo desta crise, o dólar tinha deixado o rodapé das cotações, voltara a empinar e atingiu R$ 2,52 em dezembro do ano passado, não porque houvesse corrida à reserva de valor, mas porque o crédito externo parou e não houve mais afluxo financeiro para cá. E, também, porque as empresas estrangeiras anteciparam suas remessas para socorrer suas matrizes no exterior.

Certos exportadores e comentaristas brasileiros argumentam que uma compra mais agressiva de moeda estrangeira pelo Banco Central criaria demanda para esse ativo meio largado e ajudaria a restabelecer a competitividade do produto brasileiro.

No entanto, ao contrário disso, a atual política encoraja a valorização do real. Se hoje, com essa posição em dólares de US$ 212 bilhões, há a tal euforia de que fala Meirelles, imagine-se o que existiria se o presidente do Banco Central mostrasse reservas de, digamos, US$ 300 bilhões. Quando Meirelles denuncia a excessiva euforia, parece estar passando o recado de que é melhor prevenir-se contra ela. Mas o que seria precaver-se contra a euforia no câmbio?

O problema é que para acabar com essa exuberância no câmbio com uma arma mais eficiente, o Banco Central poderia tentar algo diferente do que apenas comprar dólares para impedir a excessiva volatilidade. Nesse caso, a política teria de mudar. Mas, em que direção?

Confira:

E se despencar? - A inflação de julho medida pelo IPCA foi de 0,24%, enquanto a de junho foi de 0,36%. Em 12 meses, a inflação acumulada está na mosca da meta: 4,50%. Mas a promessa é de que caia ainda mais.

O IGP, da Fundação Getúlio Vargas, que tem 60% de carga de preços no atacado, acumulou em 12 meses inflação negativa (-1,0%). Se é verdade que o atacado de hoje é o varejo de amanhã, então é possível esperar queda maior.

Se isso for comprovado, o Banco Central estaria disposto a reduzir ainda mais a Selic, mesmo depois de ter anunciado a pausa no afrouxamento?

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