Governo negocia regras mais brandas para as pensões, um retrocesso ante o envelhecimento da população do país
DÁ MOTIVO a preocupação a série de novidades produzidas em Brasília a respeito da Previdência Social. O governo Lula, que iniciou o segundo mandato com a promessa de propor reformas que dessem sustentação financeira ao regime ao longos dos anos, parece ter desistido da idéia. Começa, o que é pior, a flertar com o retrocesso.
Assessores do Planalto negociam com sindicalistas uma fórmula para substituir o fator previdenciário, sistema de cálculo da aposentadoria para os segurados do INSS -o sistema de pensões dos trabalhadores do setor privado. Introduzido no final de 1999, o mecanismo pondera o tempo de contribuição e a idade do segurado no momento em que requer a aposentadoria.
O sistema desestimula que trabalhadores se aposentem cedo, mesmo que tenham contribuído para o INSS por muitos anos. Foi uma maneira encontrada no Brasil de enfrentar um problema comum a todos os países cuja idade média da população vai aumentando. Quando as pessoas passam a viver mais, os sistemas previdenciários precisam passar por reformas que posterguem a idade da aposentadoria, sob pena de desequilíbrio progressivo entre receitas e despesas.
Num lance demagógico para o qual concorreram congressistas do governo e da oposição, o Senado derrubou o fator previdenciário. Fez mais: aprovou um segundo projeto do mesmo autor, Paulo Paim (PT-RS), que estende a todos os segurados do INSS os aumentos salariais concedidos ao salário mínimo.
Pelas contas do Ministério da Previdência, as duas medidas produziriam um salto gigantesco nas despesas públicas com o passar dos anos. A parcela dos gastos da Previdência, que hoje gira em torno de 7% do PIB, seria triplicada em 2050. A cada R$ 100 produzidos no país, R$ 20 teriam de ser recolhidos pelo governo só para pagar pensões. O sistema, em resumo, se tornaria insustentável e teria de ser reformado, provavelmente sob pressão, às expensas das futuras gerações.
Já deveria estar encerrada, no Congresso, a época da irresponsabilidade com as contas públicas, em especial com as da Previdência Social. O que mais espanta, no entanto, é o governo federal dispor-se a negociar uma espécie de meio-termo entre o fator previdenciário e a sua simples extinção. Seria aceitar um retrocesso numa área que precisa andar para a frente.
Não há como escapar das conseqüências da reconfiguração demográfica pela qual o Brasil vai passar nas próximas décadas. No país de hoje, para cada cidadão acima de 65 anos há dez em idade ativa. Em 2050, serão só três.
Governo, deputados, senadores e sociedade deveriam discutir como reequilibrar, a partir de agora, seu sistema previdenciário diante dessa evolução inexorável. Ainda há tempo de produzir uma reforma suave, com impactos negociados e paulatinos.
A trama populista em curso no Congresso, que vai elevar a conta a ser paga por nossos filhos e netos, é uma atitude deplorável.
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