Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 06, 2008

O triunfo da Zara no mercado de roupas

O novo império da moda

Como a Inditex, dona da Zara, superou a GAP
e se tornou a maior fabricante de roupas do mundo


Marcos Todeschini

Alcir N. da Silva

Sem medo da crise
Loja da Zara inaugurada em Nova York na semana passada: aumento de 4% no faturamento em plena recessão

Duas novas lojas por dia. Esse foi o ritmo de crescimento em 2008 do grupo espanhol Inditex, dono da mundialmente conhecida rede de lojas Zara. A expansão vertiginosa foi coroada no último trimestre com um resultado inédito: pela primeira vez, a empresa ultrapassou o faturamento de sua principal concorrente, a americana GAP, que há dez anos ocupava o posto de a maior fabricante de roupas do mundo. Nem mesmo os tremores da economia parecem ameaçar os bons resultados da empresa. Enquanto o faturamento do setor de vestuário sofreu queda de cerca de 6% desde setembro, o da empresa espanhola cresceu 4%. Na semana passada, quando a retração do consumo se fazia sentir em todo o segmento de varejo, inaugurou-se a sexta loja da Zara em Nova York, num endereço nobre – a Quinta Avenida. Do Japão a Montenegro, seu mais novo mercado, a Inditex segue transformando antigos cinemas, farmácias e casarões em lojas de roupas. Sem esquecer do Brasil, onde as 24 lojas da Zara mantêm uma clientela fiel, especialmente de classe média. Como foi, afinal, que o grupo conseguiu deixar a concorrência para trás e se blindar contra a crise? Sem dúvida, tem sido decisivo nesse processo o singular modelo de gestão adotado desde os anos 70, quando o alfaiate Amancio Ortega começou a fazer roupões para a classe média da região da Galícia, no noroeste da Espanha. "É na hora em que o mercado se retrai que as diferenças na condução dos negócios têm maior impacto", diz a analista Anne Critchlow, do banco Société Générale.

Paul Sakuma/AP Photo

Modelo envelhecido
Com os lucros em queda há mais de dois anos, a GAP não conseguiu reagir à concorrência

A Inditex, de fato, distingue-se das outras fabricantes de roupas em muitos aspectos. A começar pelo dinamismo de sua produção, que deu origem a um novo termo no setor: o "fast fashion". Trata-se de um sistema que transporta as tendências dos principais desfiles de moda para as prateleiras das lojas em menos de um mês. Ao fim de cada estoque, uma nova coleção é colocada no lugar. Para se ter uma idéia da rapidez com que isso é feito, enquanto a GAP lança anualmente 12.000 modelos, a Zara põe no mercado 40.000. A renovação constante tem influência direta no número de visitas do consumidor às lojas. O cliente da Zara vai até lá dezessete vezes por ano porque sabe que vai encontrar novas peças; o da GAP, apenas cinco. Não é à toa, portanto, que o faturamento desta última vem caindo significativamente – nos últimos dois anos, a queda foi de 11%. A agilidade trouxe ainda uma vantagem adicional: o grupo Inditex conseguiu diversificar seu negócio, com lojas para diferentes públicos. Além da Zara, também é dono de outras oito marcas, como a Oysho, de moda íntima, e a Bershka, voltada para jovens. A variedade ajuda na proteção contra a crise. Neste momento, por exemplo, a aposta do grupo para atrair os consumidores europeus é a cadeia de baixo custo Lefties, onde é possível encontrar camisetas a 95 centavos e calças a menos de 10 euros.

Divulgação

Camisetas por centavos
A Lefties, loja de baixo custo do grupo: nova aposta na Europa

Um segundo diferencial da empresa espanhola é a concentração de 80% de sua produção e distribuição em um único local, a Galícia. A maioria de suas concorrentes trabalha com outro sistema: produz suas peças em países asiáticos e, a partir de lá, as envia para centros de distribuição espalhados pelo mundo. A logística centralizada permite que a Inditex entre e saia de mercados com mais liberdade – sem precisar se prender, como o restante do setor, a locais onde já tem infra-estrutura de distribuição montada. Por esse motivo, a empresa está presente em mais países do que qualquer outra concorrente. Enquanto a GAP e a sueca H&M, a terceira maior fabricante do mundo, concentram 70% de seu faturamento em apenas seis mercados, a Inditex distribui o seu por 71. Atualmente, o modelo tem sido especialmente vantajoso para o grupo, uma vez que lhe dá mais flexibilidade para enfrentar a instabilidade das economias locais. Neste ano, a empresa dobrou o número de lojas na Rússia, um mercado que tinha potencial para crescer, e fechou quatro lojas Zara na Espanha, onde o mercado está em retração. "O país pode até quebrar, mas a Inditex, não", diz o confiante diretor da empresa Jesús Echevarría.

Os analistas apontam, ainda, outra vantagem competitiva do grupo espanhol: a ausência de dívidas. "Esse tem sido um fator decisivo para a manutenção do crescimento, apesar da crise", diz Alberto Serrentino, da consultoria Gouvêa de Souza. Para se transformar em uma empresa sem credores, a Inditex apostou no corte de desperdícios. Todas as suas 4.223 lojas ao redor do mundo estão conectadas por computador ao centro de distribuição na Galícia. Com o controle em tempo real sobre a demanda, o encalhe de peças foi reduzido à metade, garantindo um lucro maior sobre cada unidade. No restante da indústria de roupas, cerca de 35% de uma coleção precisa ser vendida a um preço abaixo da tabela porque fica parado no estoque. Na Inditex, essa sobra não passa de 15%. Desde a abertura da primeira loja no exterior, na década de 80, a empresa só cresceu. Nos últimos cinco anos, saltou de um faturamento de 5 bilhões de euros para os atuais 10 bilhões. Se já pertencia ao grupo das empresas globais com crescimento mais rápido, ela agora se credencia a tomar parte numa lista ainda mais seleta – a das que sabem crescer em momentos de crise.

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