Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, dezembro 16, 2008

Luiz Garcia Sem contar os patins


O Globo - 16/12/2008

Velho ditado promete que a justiça tarda mas não falha. Pois é: a sabedoria popular pode juntar palavras com alguma graça, mas isso não a faz sempre realista. No caso, fica esquecido que a lentidão de sistemas judiciários é deficiência terrível, causadora de falhas muitas vezes irreparáveis.

No caso brasileiro, em nome da presunção de inocência - conceito em si respeitável - tanto réus como litigantes podem adiar decisões definitivas por anos e anos.

Códigos e leis são periodicamente modernizados, mas nenhuma reforma até hoje produziu o milagre de uma agilidade comparável à dos tribunais de diversos países. Enfim, podemos ter boas leis, não falta ao establishment nacional o desejo de uma justiça tão eficaz quanto rápida, mas na vida real esse sonho parece muito distante para quase todos os brasileiros.

E não se pode dizer que o Judiciário brasileiro seja primo pobre do Executivo ou do Legislativo. Números deste ano mostram que a toga, de 2007 para 2008, aumentou seus gastos com pessoal em 15.9%. O Executivo, controlador dos cordões da bolsa, foi nitidamente mais modesto: só 12,8%.

A máquina judiciária não é rica apenas em mão-de-obra. Também gosta de morar bem, principalmente - talvez até exclusivamente - no caso dos tribunais superiores. Suas sedes são todas imponentes, suntuosas, com economia visível apenas no bom gosto: é uma manada de elefantes brancos.

Em todas elas, o cidadão comum tende a se sentir mais intimidado do que em casa. Pode-se admitir que a intenção não tenha sido essa, e sim de produzir, digamos, uma imagem arquitetônica da solenidade da Justiça. Infelizmente, nossos altos tribunais parecem mesmo obras típicas de novos-ricos, gente com dinheiro demais e sensatez de menos.

Só a combinação desses dois fatores explica, por exemplo, que o presidente do Tribunal Federal Regional de São Paulo espraie seus poderes em 600 metros quadrados de gabinete. É o dobro da área do gabinete do presidente da República no Palácio do Planalto. Imagine-se o custo disso - e sem nem pensar no preço dos patins para os escreventes.

O próprio presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, que certamente não tem interesse algum de comprar à toa a má-vontade de juízes, afirmou outro dia que o Judiciário deveria "mudar o critério de construção de suas sedes, tornando-as menos suntuosas".

Já houve caso, em São Paulo, de um juiz flagrado metendo a mão com vontade numa obra dessas. Não há qualquer motivo para desconfiar de outros episódios do gênero. De qualquer maneira, todo mundo sabe que, quanto menor a tentação, mais raro o pecado.

Enfim, gastando-se menos tempo e dinheiro nos elefantes brancos, é até provável que sobrem recursos que produzam formas eficazes de dar alguma agilidade a toda a máquina de alvos paquidermes.

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