NOVA YORK. Para o Brasil, seria muito bom que a senadora Hillary Clinton fosse mesmo nomeada secretária de Estado do futuro governo de Barack Obama. É, dentro do Partido Democrata, quem mais conhece o Brasil, país em que tem uma rede de contatos grande a partir do relacionamento que seu marido, o ex-presidente Bill Clinton, fez com o ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, cujos mandatos se cruzaram nada menos que durante seis anos, de 1995 a 2000.
Antes de ser primeira-dama, Hillary era muito envolvida em políticas sociais no Children Defense Funds, e por isso conhece bem as políticas sociais no Brasil. Ela acompanhou também o trabalho do Comunidade Solidária com Ruth Cardoso e dizia que o Brasil era muito inovador em políticas sociais, tendo repetido isso na campanha presidencial que perdeu para Obama.
Suas ligações com os tucanos brasileiros fizeram com que o governo Lula temesse sua escolha como candidata dos democratas americanos.
Lula torceu discretamente primeiro pela vitória de Obama sobre a senadora, e depois por uma vitória de McCain, no pressuposto de que os republicanos são menos protecionistas que os democratas.
De fato, apenas McCain falou favoravelmente ao programa de etanol do Brasil e no fim do subsídio aos produtores americanos. Com a aproximação do final da campanha, Lula se declarou abertamente a favor da eleição de Obama, a quem se considera ligado pela origem social modesta.
A escolha de Hillary Clinton para a Secretaria de Estado seria também uma confirmação do que a cada dia fica mais explícito: a influência do ex-presidente Clinton na formação da equipe de governo de Obama, que até agora tem 31 dos 47 membros da equipe de transição saídos do último governo democrata exitoso.
Os primeiros escolhidos para o futuro governo Obama saíram também do grupo de políticos que já trabalhou com o presidente Clinton, como o chefe do gabinete de transição, John Podesta, que foi chefe de gabinete do presidente.
Para a mesma função, o presidente eleito já escolheu o deputado Rahm Emanuel, que foi conselheiro de Clinton na Casa Branca de 1993 a 1998.
Ele trabalhou próximo à então primeira-dama Hillary Clinton na tentativa de implantar um sistema de saúde universal no país e, devido aos seus laços com Israel, teve papel importante na assinatura do acordo entre a Organização para Libertação da Palestina e Israel em 1993.
É de sua inspiração a cena em que Clinton faz a aproximação para o famoso aperto de mãos entre o primeiro-ministro Yitzhak Rabin e Yasser Arafat nos jardins da Casa Branca.
A proximidade com Israel já causou a Emanuel um constrangimento. Ele teve que pedir desculpas por uma declaração de seu pai a um jornal israelense, onde afirmava que seu filho, trabalhando na Casa Branca, influenciaria o governo a ser próisraelense.
Outro da equipe da Casa Branca de Clinton é Ron Klain, que será chefe de gabinete do vice-presidente Joe Biden. Em 1992, Klain entrou na campanha presidencial Clinton-Gore, e foi o chefe da equipe de recontagem de votos na polêmica eleição de 2000, em que Al Gore perdeu para George W. Bush.
Na Casa Branca, ele foi um conselheiro presidencial para questões jurídicas e depois trabalhou como chefe de gabinete do vice-presidente Al Gore.
Um outro astro da equipe de Clinton que está sendo cotado para o governo Obama é o antigo secretário de Tesouro Larry Summers, que faz parte do grupo que assessora Obama na parte econômica desde a campanha.
A pressão de grupos feministas, ainda relacionada com comentários de Summers quando reitor da Universidade Harvard sobre uma suposta incapacidade feminina para trabalhar com matemática, pode impedir sua nomeação, assim como o obrigou a deixar o cargo em Harvard.
O fato é que Obama está se mostrando disposto a usar a experiência do mais recente e bem sucedido governo democrata, coisa que Bill Clinton não pôde fazer quando chegou à Casa Branca, pois o governo democrata anterior, de Jimmy Carter, terminou mal visto.
Hillary Clinton estaria ainda analisando o convite, que já teria sido feito na reunião que teve com o presidente eleito ontem em Chicago.
Segundo assessores, ela estaria pesando as vantagens de uma exposição internacional, contra o abandono das questões internas que a preocupam tanto, como o serviço de saúde universal, uma das promessas que ela fez seu adversário na disputa das primárias assumir como meta caso chegasse à Presidência.
Um detalhe que está sendo levado em conta é que, por mais prestigioso que seja o cargo, ela poderia ser demitida a qualquer momento pelo presidente Barack Obama, o que não aconteceria se tivesse sido escolhida vice-presidente, por exemplo.
Em relação a isso, há uma história na política americana que ontem foi relembrada pelo marqueteiro republicano Dick Morris.
Em 1944, Jimmy Byrnes, conhecido como “o sub-presidente” no terceiro mandato de Franklin Roosevelt, era o mais falado para ser o vice de Roosevelt na campanha pelo quarto mandato, em lugar de Henry Wallace. No último momento, Roosevelt preferiu Truman, considerando que Byrnes era muito conservador.
A cúpula do partido não apoiou a troca, a tal ponto que Truman, ao assumir a Presidência em 1945 com a morte de Roosevelt, viu-se constrangido a convidar Jimmy Byrnes para ser seu secretário de Estado.
Byrnes, que pensava que deveria ser ele o presidente, não dava satisfações a Truman e fazia a sua própria política externa. Não demorou um ano para que fosse demitido.
Segundo Morris, a mesma situação está acontecendo agora, com a senadora Hillary Clinton sendo a preferida da cúpula do Partido Democrata e considerando que ela é que deveria ter sido eleita presidente dos Estados Unidos.
Entrevista:O Estado inteligente
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