Entrevista:O Estado inteligente

domingo, novembro 16, 2008

Calzone -Maria Helena Rubinato, blog Noblat


BLOG NOBLAT

Acredito que todos saibam o que é calzone, aquela pizza fechada, dobrada ao meio, em formato de meia lua, recheada com queijo, tomate e outros ingredientes ao gosto do freguês. Neste país em que pizza virou sinônimo de... pois é, disso mesmo, é de espantar que ninguém ainda tenha usado calzone para as pizzas mais eficientes, digamos assim, aquelas que além de pizzas, sejam muito ciosas de seus segredos.

E, no entanto, nas últimas pizzas que nos têm sido oferecidas, o recheio está muito bem guardado. Nós não sabemos da missa a metade, para entrar no clima dessa última tournée internacional do presidente Lula, senhora e amigos. Claro está que a pizza mais quente, quente no sentido baiano, com dendê e malagueta à vontade, é a que envolve nossos arapongas, os dos dois lados da contenda. Mas, nesse calzone nem toco, sei lá o que vai sair lá de dentro...

Prefiro falar no calzone alla romana. Não foi comovente? Dona Marisa não vai poder se queixar da belíssima homenagem que seu país adotivo prestou a seu marido. Almoço com metade da seleção brasileira! Foi, como diria o presidente, em momento de muita criatividade, extraordinário! Nada como almas gêmeas. Berlusconi e Lula, tudo a ver: amam futebol, viagens e são homens do mundo, elegantes, chiques, sempre na última moda. O italiano, assim como o brasileiro, não nasceu rico, e trabalhou, na mocidade, como animador e cantor em cruzeiros pelo Mediterrâneo, segundo andei lendo. Para isso, além de uma boa voz, é preciso amar as viagens. E aplausos, mais uma coisa em comum.

A Bella Itália, terra lindíssima, museu a céu aberto, e com um povo ultra simpático, é um país politicamente bizarro. O presidente da República é um senhor de 83 anos, antigo membro do célebre PCI, de saudosa memória, e que continua de esquerda. O primeiro-ministro, o amigo do Lula, é fundador do Forza Itália, partido de direita que já se aliou a gregos e troianos, inclusive ao Liga Norte, radical de ultra-direita. O prefeito de Roma, que recebeu Lula no Campidoglio, é conservador católico, protofascista e admirador de Mussolini. Lula também foi ovacionado por sindicalistas italianos aos quais declarou sua profunda ligação com o sindicalismo.

Não podemos esquecer que a grande comitiva brasileira foi recebida por Sua Santidade, o Papa Bento XVI. Que essa notícia não surpreenda ninguém: o Papa, além de Chefe da Igreja Católica Apostólica Romana, é Chefe de Governo do menor país do mundo, o Vaticano. Com o Papa, Lula assinou um acordo que, entre outras coisas, trata do ensino religioso nas escolas brasileiras.

Vejam vocês como é confusa a política na Itália: sede de uma das religiões do Livro, presidida por um comunista, governada por um empresário bilionário, a capital administrada por um admirador do fascismo, sindicatos ainda muito fortes, sua vida política forma uma teia intrincada de partidos e pessoas que divergem entre si, mas que às vezes se unem; é complicado compreender a Itália, que dirá governá-la. Se não é fácil conduzir uma família italiana, imaginem milhões de famílias italianas...Pois bem, o presidente do Brasil navegou muito bem entre esses meandros e ainda assinou com Berlusconi acordos de cooperação na área da Defesa e até de Programas Espaciais! Verdade! Podem conferir.

Va bene, va bene, como se diz na pátria da pizza. Foi um bela viagem, curta para quem vai, cara para quem paga, mas bela assim mesmo. Como sou muito fraca das idéias, não consigo é atinar com a necessidade da presença de uma delegação tão robusta, sobretudo nesta hora de crise. Sei que ao presidente não interessa lembrar a crise, ele até acha que não é de bom tom, sabe como é, de tanto falarem nisso, o Ronaldinho pode deixar de comprar um carro novo e o Dida não vai trocar a geladeira. É, o Lula tem razão. Não podemos privar esses Trabalhadores do Brasil em Milão das alegrias do consumo. Fica combinado assim: em Roma, como os romanos Lula e Marisa. Não se fala mais em crise. Vou trocar todos os eletrodomésticos e eletrônicos. Como dizia aquele velho anúncio: "até janeiro, dinheiro pinta"...

Mas não consigo deixar de pensar: será esta viagem um calzone alla tarantella, cujo recheio é o mais novo segredo gastronômico da rota Brasil-Itália?


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