Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 02, 2008

Trabalho Compartilhar salas para combater a solidão

Saudosos do escritório

Depois de conquistarem a regalia de trabalhar em casa,
eles se viram solitários – e buscam compartilhar salas


Marcos Todeschini

Paulo Pereira
Uma secretária só
Eles trabalham em diferentes empresas, mas dividem tudo


Trabalhar em casa era um sonho acalentado por funcionários de algumas das maiores multinacionais na década passada. Com o surgimento da internet, parte delas aderiu ao home office, modalidade que deu àquelas pessoas, pela primeira vez, a alternativa de executar tarefas longe do escritório. Nos Estados Unidos, 10 milhões de empregados passaram a cumprir parte do expediente em casa. No Brasil, foram 4 milhões. Depois de uma década levando uma vida que eles próprios definiam como "mais livre" e "menos entediante", a novidade é que uma parcela começa a dar inesperados sinais de nostalgia em relação aos tempos de escritório. É o que explica o fato de algo como 10% desses brasileiros terem saído em busca de uma alternativa. Eles estão alugando salas em espaços povoados por centenas de pessoas. Lembra o passado, mas com uma diferença fundamental: essas pessoas permanecem fora das empresas para as quais trabalham. A experiência é relatada com grande entusiasmo por profissionais como o engenheiro Cledson Sakurai, 36 anos, desde 2002 numa multinacional francesa na área de tecnologia. Ele trocou o silêncio do home office por um desses escritórios abarrotados de gente. "Trabalhar sem ninguém ao lado pode se tornar solitário e improdutivo."

O modelo de escritórios compartilhados, nos quais atuam pessoas das mais diversas empresas e áreas, popularizou-se nos Estados Unidos de três anos para cá, quando firmas especializadas no aluguel de salas comerciais perceberam estar diante de um novo fenômeno. Pessoas que haviam conquistado o direito de trabalhar em casa começavam a se queixar do isolamento e de certa falta de infra-estrutura. Em pesquisas, esses profissionais diziam sentir saudade da secretária e da velha sala de reuniões ("tratar de negócios em casa nunca deu certo"). Mas não queriam voltar à vigilância dos chefes. Os novos escritórios suprem tais demandas – e têm se revelado ainda ambientes favoráveis à produtividade tão almejada pelas empresas. É por isso que algumas delas, as mesmas que haviam liberado seus funcionários para trabalhar em casa, patrocinam sua estada nas salas compartilhadas. Lincoln Brasil, diretor da Silva Rosa, consultoria na área de tecnologia, diz que, há dois anos, banca o aluguel de empregados nessas salas. "Eles passaram a organizar melhor o tempo e a respeitar mais os prazos." Houve também um ganho financeiro para a empresa. "Enxugamos a estrutura fixa e, com isso, cortamos 85% dos gastos."

Lailson Santos
Eles pagam a conta
Lincoln e Marcos Sakamoto: suas empresas alugam salas para quem prefere trabalhar lá

Existem quase 1 000 escritórios do gênero nos Estados Unidos. No Brasil, não passam de uma centena – mas o modelo tende a se popularizar por duas razões. Primeiro, muitas empresas começam a incentivar a permanência em tais estruturas, a exemplo do que fez o Google, nos Estados Unidos. O segundo motivo é uma particularidade brasileira: o número de pessoas que trabalham por conta própria aumenta. Só nos últimos cinco anos, cresceu 22%. Esses profissionais também já procuram os escritórios compartilhados – impulsionados pelo preço (algo como 1 000 reais por mês) e pela chance de ampliar a rede de contatos. Foi um "colega de espaço" que apresentou o publicitário João Paulo Filomeno, 28 anos, a um de seus melhores clientes. "Em casa, teria perdido um ótimo contrato", diz ele.

Para os donos dos escritórios, o negócio também se revela lucrativo. A maioria já vivia do aluguel de salas comerciais nos moldes tradicionais: um inquilino só e nenhum serviço adicional. O processo de adaptação ao novo modelo, que inclui tornar o ambiente wi-fi e comprar equipamentos para salas de reuniões, é simples e barato. O investimento tem bom retorno. "Com mais gente pagando pelo mesmo espaço, a margem de lucro do meu negócio subiu 50%", diz Daniel Corrales, sócio da Private Office, maior empresa especializada em salas compartilhadas do país. Ao apostar na nova fórmula, ele e os outros contam com a atração daquelas pessoas para quem a possibilidade de trabalhar de pijama já não tem a mesma graça.

Com reportagem de Ingrid Calderoni

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