O pronunciamento foi feito no Simpósio Anual promovido pelo Fed de Kansas City na cidade de Jackson Hole, no Wyoming, destinado a discutir outros temas, especialmente a capacidade dos administradores da política monetária de prevenir crises.
Bernanke não revelou nenhuma novidade. Mas, quando o presidente do Fed abre a boca, é preciso prestar atenção, porque aí tem recado. Nada é dito à toa. O que ele pensa aponta para onde vão os juros, um dos principais preços do dólar, o mais importante medidor de valores do Planeta.
E, se ele avisa que a crise não dá tréguas e vai bloqueando a atividade econômica, isso tem implicações. No mínimo, fica entendido que é baixa a probabilidade de que os juros básicos nos Estados Unidos (Fed funds), que hoje estão nos 2% ao ano, voltem a aumentar nas reuniões já agendadas (16 de setembro, 29 de outubro e 10 de dezembro).
Enquanto a crise estiver forte, a tendência é a de que a política monetária permaneça frouxa, para não complicar a atuação dos bancos e de todo o mercado financeiro (que opera no limite) e para não estrangular ainda mais o mercado do crédito.
Além disso, juros baixos devem ajudar a criar condições para a recuperação da economia americana ou ao menos para impedir que a desaceleração da atividade econômica se aprofunde.
O mercado atua em ondas. E ontem entendeu que a quebra da atividade econômica vai manter flácido o consumo de petróleo e de matérias-primas. Daí a queda das cotações ao longo do dia.
O próprio Bernanke advertiu que o fator mais importante que vinha pedindo alta dos juros (a disparada da inflação para além dos 5% ao ano) está passando por certo alívio, na medida em que os preços das commodities, especialmente do petróleo e dos alimentos, estão em queda nos mercados, portanto estão trabalhando para conter a inflação.
E juros a níveis tão negativos mantêm as condições para que o dólar siga relativamente desvalorizado diante das outras moedas fortes. É questão em aberto o quanto o dólar mais fraco contribuirá, também, para uma nova rodada de alta das commodities.
Mas há outros desdobramentos a levar em conta. Um deles é a crescente transferência de parte do controle dos grandes bancos americanos para capitais estrangeiros.
Levantamento da agência Bloomberg relata que fundos soberanos e instituições governamentais de países emergentes e de produtores de petróleo subscreveram nada menos que US$ 200 bilhões em capitais novos de grandes bancos, como Citigroup e União de Bancos Suíços, para impedir que afundassem.
E, ontem, o Banco de Desenvolvimento da Coréia do Sul (KDB, na sigla em inglês) anunciou que estuda despejar vitamina nova no capital do Lehman Group, banco americano ameaçado de quebra.
Essas manobras não vêm apenas para ajudar a resolver problemas. Constituem movimentos de capital com impacto geoestratégico ainda a ser avaliado.