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sábado, agosto 02, 2008

O Vaticano com as contas no vermelho

Religião
O Vaticano no vermelho

Dólar desvalorizado abre um rombo de
9 milhões de euros nas contas da Santa Sé


Paula Neiva

Os solavancos da economia mundial estão sendo sentidos com a força de um terremoto nos cofres da Igreja Católica. Após três anos consecutivos em que fechou virtuosamente no azul, o último balanço do Vaticano, referente a 2007, exibe um rombo de 9 milhões de euros. Os gastos somaram 245 milhões de euros, enquanto a receita ficou em 236 milhões. O déficit se refere às contas da Santa Sé, sede da Igreja como instituição religiosa e que engloba congregações, conselhos, comissões e outros órgãos cuja função é auxiliar na atuação do papa como líder espiritual. As contas do estado do Vaticano, a área de menos de meio quilômetro quadrado encravada no coração de Roma que tem status de país independente, são feitas em separado e também não apresentaram resultados animadores. O Vaticano, como estado, mantém aplicações no mercado imobiliário e de capitais. No ano passado, esses investimentos renderam 6,7 milhões de euros, contra 21,8 milhões em 2006.

Max Rossi/Reuters
Peso no orçamento
Leitores do L’Osservatore Romano próximo à Praça de São Pedro: o jornal dá prejuízo

Segundo o próprio Vaticano, o rombo nas contas da Santa Sé se deve, principalmente, à queda do dólar com relação ao euro. Boa parte do orçamento da instituição vem de doações de fiéis e da Igreja em outros países. Entre as três nações de origem das doações mais polpudas estão os Estados Unidos, que evidentemente doam em dólares. A avalanche de denúncias de pedofilia que atingiu sacerdotes católicos deverá custar às dioceses americanas uma soma calculada em 2 bilhões de dólares em indenizações e despesas judiciais. "As doações da Igreja americana à Santa Sé diminuíram pois foram destinadas, em parte, ao pagamento de tais indenizações", comenta o padre e historiador paulista José Oscar Beozzo.

Os prejuízos dos veículos de comunicação mantidos pela Santa Sé também contribuíram para o vermelho no balanço do Vaticano. O jornal diário L’Osservatore Romano, publicado em italiano e produzido em versões semanais em outros idiomas, e a Rádio Vaticano, que não aceita publicidade, foram responsáveis por um prejuízo de 15 milhões de euros, consumindo boa parte da receita obtida pela editora e pelas produções audiovisuais da instituição. Nas últimas décadas, as finanças do Vaticano oscilaram entre o lucro e o déficit. Ao longo de seu papado, João Paulo II fez um grande esforço para sanear as contas, mas elas agora voltam a degringolar.

Fotos AP
Finanças sob suspeita
Roberto Calvi (à esq.) e o arcebispo Paul Marcinkus: protagonistas do escândalo do Banco Ambrosiano nos anos 80

As finanças da Santa Sé são um tradicional foco de tensões. A venda pela Igreja Católica de cartas de indulgência, que absolviam os pecados do comprador, esteve no centro da controvérsia que levou à Reforma Protestante e à divisão da cristandade. Na Igreja moderna não é concebível a existência de um papado conhecido pela corrupção, como foi o de Alexandre VI. Mesmo assim, as relações entre o Vaticano e o mundo das finanças são motivo para constrangimento. O maior escândalo recente ocorreu no início da década de 80, com a quebra do Banco Ambrosiano, de Milão, do qual o Instituto para Obras Religiosas, o Banco do Vaticano, era um dos acionistas. À frente do Banco do Vaticano estava o arcebispo Paul Marcinkus, suspeito de envolvimento, como avalista, no esquema de empréstimos fraudulentos no total de 1,4 bilhão de dólares. Para piorar, Roberto Calvi, presidente do Banco Ambrosiano, apareceu enforcado sob uma ponte do Rio Tâmisa, em Londres, levantando suspeitas de que fora assassinado como queima de arquivo. O Banco do Vaticano gastou 241 milhões de dólares para indenizar credores do Ambrosiano a título de "gesto de boa vontade". Diante de crises como a do Banco Ambrosiano e dos padres pedófilos, o balanço deficitário do Vaticano é um mal menor.

O buraco no tesouro do Papa

O balanço da Santa Sé fechou com déficit de 9 milhões de euros no ano passado. O que encolheu:

1 As doações de fiéis caíram de 65 milhões de euros, em 2006, para 50 milhões de euros

2 O jornal L’Osservatore Romano e a Rádio Vaticano deram prejuízo de 14,6 milhões de euros

3 Os investimentos financeiros da Santa Sé renderam 1,4 milhão de euros, contra 13,7 milhões de euros em 2006

Com reportagem de Carolina Romanini

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