Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 02, 2008

O cotidiano da China

Olímpiada
Cenas da China

A partir desta semana, VEJA trará pequenas
reportagens em forma de notas sobre a Olimpíada,
o cotidiano de Pequim e de outras cidades da
China onde estão seus enviados especiais

Ser forasteiro na rua cintilante
Em 1920, um guia turístico inglês já dizia sobre a principal rua comercial de Xangai: "The Chinese delight in brilliant light" – os chineses deliciam-se na luz brilhante. Tão cintilantes quanto os luminosos da Nanjing Road, só os de Times Square, em Nova York, e os de Ginza, em Tóquio. Da manhã à noite, sete dias por semana, milhares de chineses passeiam pelo seu calçadão de 1 quilômetro. Aos poucos, os negócios mais populares estão dando lugar a luxuosas lojas de departamentos, com grifes globalizadas. Mas ser ocidental em Nanjing Road continua a guardar algo do passado colonial. Numa única caminhada noturna, o forasteiro pode ser abordado dezenove vezes por homens e mulheres oferecendo bugigangas; sete vezes por cafetões apresentando seu cardápio feminino ("O senhor paga um café e decide depois"); e quatro vezes pelos próprios pratos dos cardápios femininos. Os números são exatos.

Mario Sabino

Citius, altius, fortius — e mais cultos
Em Pequim, o atleta que quiser ir um pouco além do lema dos Jogos (o latinório acima significa "Mais rápido, mais alto, mais forte") e aprender noções básicas do mandarim e da cultura chinesa pode freqüentar um centro de ensino na Vila Olímpica. Trinta professores voluntários ensinam os rudimentos do idioma, entre os quais três dezenas de frases de alguma forma relacionadas à competição. No tocante a hábitos e costumes, a vila também dispõe de cerimônias do chá e horários de acupuntura. Convenhamos, é ideal para os que não têm nada a perder. Ou melhor, nenhuma medalha a ganhar.
Mario Sabino


Sharron Lovell
MAO NÃO APROVARIA
"Noivos" posam para foto anos depois do casamento: indumentária burguesa liberada

Retratos da festa que não houve
Considerado "indumentária burguesa", o vestido de noiva foi banido da China durante todo o período em que durou a Revolução Cultural, o movimento liderado por Mao Tsé Tung que perseguiu, histérica e violentamente, supostos "reacionários" no país ao longo de dez anos. Entre 1966 e 1976, quem quisesse que se casasse de uniforme e bonezinho maoísta – e sem nenhum fricote que pudesse ser associado à "decadência capitalista", incluídas aí as fotografias comemorativas. Foi assim que uma geração inteira de casais, atualmente com idade entre 60 e 70 anos, ficou sem o seu álbum de casamento. Pensando nela, um empresário de Pequim, depois de herdar o ateliê de fotografia do pai, decidiu montar o "Alegria do Crepúsculo", hoje uma cadeia de doze estúdios espalhados pela China, dedicados exclusivamente a retratar casais de meia-idade em trajes de casamento. Com maquiadores, cabeleireiros e fotógrafos, além de um acervo de vestidos e roupas masculinas para aluguel, nos estilos chinês e ocidental, os estúdios reconstituem uma cerimônia que nunca existiu, mas que fez falta para muita gente, como prova o estrondoso sucesso da cadeia. "Já chegamos a receber vinte casais por dia", diz a gerente do ateliê de Xangai, Jing Zong. "E todos saem muito felizes daqui, especialmente as mulheres."
Thais Oyama


Mark Ralston/AFP
SEGURANÇA LINHA-DURA
Revista policial na Praça da Paz Celestial, em Pequim: prevenção contra terroristas e bandeiras do Tibete

Praça sitiada
A Praça da Paz Celestial, em Pequim, está inteiramente cercada por cordões de isolamento. Nos pontos de vistoria instalados nas suas entradas, policiais revistam as bolsas dos visitantes e os submetem a exames por detectores de metal. Depois da cerimônia diária de descida da bandeira nacional, que atrai alguns milhares de espectadores no fim da tarde, a polícia evacua imediatamente o local – e a praça em que centenas de manifestantes foram mortos, nos protestos de 1989, dorme completamente vazia. Durante o dia, estrangeiros e chineses pertencentes a alguma minoria étnica formam o público mais visado pela segurança. Isso porque o governo chinês teme atentados terroristas – mas teme também que, no meio de um grupo de estrangeiros, surja de repente uma bandeira do Tibete. A independência da região, causa que conta com a simpatia de diversos países, é o último assunto sobre o qual os chineses desejam falar nesta Olimpíada.
Thais Oyama

Feira de noivos


AFP
QUEM QUER CASAR COMIGO?
Na Praça do Povo, pais olham currículos de candidatos a subir ao altar com seus filhos: bom salário é condição fundamental

Mesmo no calorento verão de Xangai, todo sábado e domingo, eles estão lá. As centenas de pais e mães que se reúnem à tarde na Praça do Povo – abanando-se com seus leques e espiando a concorrência com o canto do olho – têm um mesmo objetivo: ajudar seus filhos e filhas, quase sempre únicos, a encontrar um parceiro para casar. O método lembra o de uma feira livre: fichas com os dados dos candidatos são penduradas nas árvores ou pregadas em sacolinhas de compra que ficam encostadas nos bancos para apreciação dos passantes – todos pais de solteiros também (curiosos não são exatamente bem-vindos). As fichas trazem uma breve descrição do candidato ou candidata ao altar: "Senhorita Zhou, filha única, nascida em dezembro de 1981, 1,62 metro de altura, beleza modesta, colegial completo, empregada em uma companhia de transportes aéreos, salário anual de 80 000 iuanes (o equivalente a 11 700 dólares), descontadas as deduções". Em seguida, o cartaz explica o que a senhorita Zhou (ou seus pais) espera do seu futuro marido: bom emprego e bom salário são itens obrigatórios. Esse tipo de exigência ajuda a explicar o fato de que, embora o último censo afirme existirem 116,9 homens para cada 100 mulheres na China (conseqüência da política do filho único, instituída em 1979, e da grande quantidade de abortos de meninas que ela provocou), as mulheres, ao menos as da cidade, não levam grande vantagem na hora de escolher o parceiro. Embora mais disputadas do que eles, acabam tendo menos opções, já que são também mais exigentes. Com a China dando o seu verdadeiro salto para a frente, as chinesas não querem ficar para trás.
Thais Oyama

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