Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 20, 2008

Míriam Leitão - Sentido oposto



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
20/8/2008

O economista Alexandre Marinis diz que a desaceleração no aumento das despesas públicas no primeiro semestre é puramente ocasional, e que a tendência é de aumento do gasto. "O governo não tomou uma única medida para reduzir o ímpeto do crescimento do gasto público; pelo contrário, só com a folha salarial, há aumentos de custo já contratados até 2012 da ordem de R$40 bilhões."

A Carta do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da Fundação Getúlio Vargas, como informou o repórter Fernando Dantas, no "Estado de S. Paulo", traz a avaliação de que, no primeiro semestre deste ano, o governo cumpriu uma política fiscal de contenção de gastos, e conseguiu reduzir o crescimento das despesas para um ritmo menor que o crescimento do PIB. Tal redução foi maior nos gastos com o funcionalismo e com a previdência; já os investimentos cresceram. Seria isso uma mudança de tendência? O governo estaria contendo gastos de custeio e aumentando investimentos, como é o desejável?

Alexandre Marinis, que acompanha em detalhes os gastos públicos, acha que o governo vem fazendo justamente o oposto.

- Há uma bomba de efeito retardado nas despesas federais, tanto em pessoal quanto em previdência. Comemorar um semestre em que houve uma redução de ritmo do crescimento das despesas é olhar pelo espelho retrovisor e achar que o carro está parando, ao mesmo tempo em que se aperta o pé no acelerador.

O Ibre ressalta que as despesas primárias do governo federal cresceram 4,4% no primeiro semestre, e que isso é bem menor que o ritmo de 6,9%, 9,6% e 11,1% registrados nos primeiros seis meses de 2005, 2006 e 2007. Afirma que "o governo parece estar conseguindo conter a elevação de seus gastos".

Marinis disse que houve um atraso na entrada em vigor de vários aumentos salariais já concedidos, mas que eles entrarão agora no segundo semestre e terão o efeito de elevar os gastos salariais nos próximos anos.

- Os aumentos salariais prometidos pelo governo durante a campanha eleitoral de 2006 foram sendo adiados em 2007 e, com as greves deste ano, acabaram sendo concedidos numa forma escalonada, que começa no segundo semestre. Este ano, o gasto federal com salários do funcionalismo está crescendo R$8 bilhões. Quem for eleito assumirá em 2011 com um gasto R$32 bilhões acima dos gastos atuais. Até 2012, a folha terá crescido R$40 bilhões em relação ao nível de hoje, apenas com o que já foi concedido - detalha o economista.

Sobre o salário mínimo, Marinis explica que a fórmula que o governo criou de inflação mais o PIB de dois anos antes não está sendo seguida e, além disso, ela é ruim, pois engessa o governo e o impede de fazer política fiscal contra-cíclica. A própria Carta do Ibre também chama a atenção para esse aspecto específico. Diz que tal modelo "sinaliza uma forte elevação do gasto público, em 2009", assim sugere que, no próximo ano, a opção seja apenas por manter o valor do mínimo em termos reais.

- Se o país estiver superaquecido e precisar conter o salário para, com isso, conter a inflação, não conseguirá. Além do mais, o aumento dado já está maior que isso - comenta Alexandre Marinis.

O governo também não seguiu a fórmula que ele mesmo criou para o aumento da folha salarial; ela só poderia crescer o IPCA mais 1,5% por ano.

- O governo criou a fórmula, e ele mesmo não a segue. É falácia sustentar que está havendo controle das despesas. Elas não estão sob controle, estão crescendo aceleradamente. Não há qualquer evidência de que o governo tomou alguma atitude para frear as despesas de pessoal e previdência - enfatiza Marinis.

Uma das provas disso é o enorme volume de liberações extra-orçamentárias, através de medidas provisórias, que o Executivo vem fazendo. Entre outubro do ano passado e julho deste ano, foram 10 MPs aprovadas, criando créditos para diversos gastos, totalizando R$30,7 bilhões. Entre eles, estão recursos para vários ministérios, para o PAC e liberações para estatais. Se houve a diminuição recente da edição de medidas provisórias, o mesmo se deu pela pressão do Congresso e também do STF em relação ao meio utilizado para governar. Assim, o Executivo voltou atrás apenas temporariamente na MP que cria o Ministério da Pesca, cargos comissionados nele e em outros órgãos.

No início deste mês, foi aprovado no Congresso um gasto da ordem de R$7,5 bilhões para aumentos dos salários de 800 mil servidores civis e 600 mil militares, de 17 categorias, o qual chegou lá por MP. O impacto será crescente; em 2011, esse gasto chegará a R$31 bilhões. Além dessas, há outras várias categorias funcionais esperando por aumentos que o governo já se comprometeu a dar e que devem sair após a campanha, com pagamentos retroativos. Ah, para completar, quando o Executivo não cria novos gastos, veta cortes. Na sexta-feira, o presidente Lula vetou um item da LDO de 2009 que determinava a redução em 10% dos gastos com viagens e publicidade do governo.

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