Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, agosto 22, 2008

Luiz Garcia - O time em que jogamos




O Globo
22/8/2008

A imprensa brasileira precisa de uma Lei de Imprensa? Ou, melhor: os brasileiros precisam dela para manter a sua imprensa na linha?
Na reunião da Associação Nacional de Jornais que terminou esta semana, todo mundo era contra a lei vigente, mas houve quem defendesse uma legislação mais inteligente, mais liberal, e quem considerasse melhor nenhuma lei.

A legislação instituída pelo regime militar determinava penas de prisão para jornalistas condenados por calúnia, injúria e difamação, crimes já previstos no Código Penal com punições mais brandas. Uma lei típica da ditadura, conveniente - ou, melhor, indispensável - quando a prosperidade e a própria sobrevivência do regime dependem de muita disciplina e escassa liberdade.

Os excessos mais violentos da lei foram eliminados há pouco tempo. O ministro do Supremo Carlos Ayres Britto, em fevereiro passado, concedeu liminar a uma ação impetrada pelo PDT, e desde então as penas de prisão previstas na lei estão suspensas. Mas não definitivamente eliminadas, porque o julgamento pelo STF parou por aí.

Parada também está - há anos - a tramitação no Congresso de uma lei adequada ao regime democrático. A inação não é grande mal: tanto o projeto original como variados substitutivos são prolíficos e confusos demais. Ainda bem que nenhum foi adiante: a versão mais recente dorme há anos numa comissão da Câmara. Pelo visto, ninguém pretende acordar o monstrinho.

O deputado Miro Teixeira, responsável pela ação que provocou a liminar de Ayres Britto, acha que é melhor assim: diz que nenhuma lei aprovada pelo Congresso ou originada do Executivo será em favor do direito à informação.

Ele pode ser pessimista demais, mas escolheu as palavras certas. O que está realmente em questão, quando se discute alguma forma de controle da atividade jornalística não é um direito de informar concedido a jornais e jornalistas, e sim o direito dos cidadãos à informação. Num regime livre, cada veículo informa como acha que deve - e cada cidadão busca o veículo cuja massa de informações melhor corresponder a suas necessidades e interesses pessoais.

Esse é um dado freqüentemente esquecido nas periódicas discussões sobre a necessidade de controles e limitações ao trabalho dos meios de comunicação social.

Os defensores de rédeas curtas para todas as formas de mídia não percebem - ou preferem não perceber - que, a longo prazo, a mídia desonesta e parcial não sobrevive, porque o leitor e o espectador perdem o interesse por ela.

Nenhuma discussão sobre a necessidade ou não de uma legislação especial regulando o mercado da informação dispensa a constatação do óbvio: o cidadão pode ser ingênuo ou desatento a curto prazo, mas sempre acaba por prestigiar e consumir o produto que melhor o serve.

Esse é talvez o mais eloqüente argumento a favor de nenhuma lei de imprensa. E não é novidade. Muitos países consideram que a legislação ordinária sobre calúnia, difamação e injúria vale para todo mundo: mídia, organizações, cidadãos comuns. Parece que é o princípio de que a natureza dos delitos não se altera em função do tamanho do megafone de quem os pratica.

Enfim, não faltam neste mundo e neste século sistemas democráticos que não sentem a menor falta de leis especiais para a imprensa. E a maioria dos regimes autoritários não abre mão delas. Em que time queremos ser escalados?

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