Um doce monopólio
A fusão entre a Mars e a Wrigley resultou no maior império
de jujubas e chocolates do planeta. Para competirem com
elas, outras grandes buscam parcerias
Marcos Todeschini
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Poucas marcas são tão conhecidas no mundo das balas e dos chocolates quanto os confeitos M&M’s e os chicletes Doublemint. Suas fabricantes, a Mars (dos confeitos) e a Wrigley (dos chicletes), ambas empresas americanas, passaram por uma recente fusão da qual se originou um império de 30 bilhões de dólares de faturamento esparramado por 180 países, inclusive o Brasil. Nenhuma outra corporação nesse setor é hoje tão grande ou fatura tanto. O negócio chama mais atenção ainda, no entanto, por ter impulsionado uma radical transformação na indústria dos doces. No rastro do negócio entre a Mars e a Wrigley, ocorreram outras 24 fusões de empresas menores. Além disso, a americana Hershey’s e a inglesa Cadbury, duas das maiores do mundo, também se sentaram à mesa. Elas negociam os termos de uma fusão da qual sairiam com 15% do mercado e o primeiro lugar no ranking mundial. Juntas, a Mars e a Wrigley ficaram com 14,4%. Diz o consultor Luis Motta: "As grandes empresas terão de crescer mais ainda para se manter competitivas".
A Mars tentava comprar a Wrigley havia um ano. As propostas eram sempre altas, mas a Wrigley as recusava. Cobiçada também pela Hershey’s, apostava conseguir melhorar a oferta, o que de fato ocorreu. No fim, a Mars desembolsou 23 bilhões de dólares, quatro vezes o faturamento anual da Wrigley. Pagou caro por duas razões. Agora, tem chicletes no seu rol de produtos, bom negócio num momento em que o consumo de gomas de mascar sobe em velocidade maior do que a registrada pelos chocolates. Passa, ainda, a se beneficiar do gigantesco sistema de distribuição da Wrigley, pulverizado pelo triplo de países que o dela é capaz de atender. Ficou decidido que cada qual preservará seu nome. São marcas fortes. Ambas figuram entre as empresas mais lembradas no mundo inteiro. É a Mars, porém, que estará no comando. Facilita a dura transição o fato de as duas nunca terem sido concorrentes e viverem em culturas muito parecidas. Até hoje, os descendentes dos fundadores ocupam altos cargos nas duas empresas. Elas também sempre investiram em inovação. Juntas, respondem por cerca de metade dos produtos lançados no mercado de doces. Resume o presidente mundial da Mars, o americano Paul Michaels: "Foi uma fusão sem traumas".
Quando grandes grupos se unem, há uma tendência de que os outros sigam o mesmo caminho para se manter vivos na competição, não importa o setor. No caso das balas e dos chocolates, pesa ainda uma particularidade do mercado: o preço da matéria-prima sobe mês a mês. Só no ano passado, o valor da gordura vegetal (aquela que consta de nove entre dez receitas) aumentou 50% e o do cacau dobrou. As margens de lucro, por sua vez, caíram dos habituais 7% para 5%. Para amenizar a queda, as empresas começaram a cobrar cerca de 10% mais por seus produtos, ao passo que a Mars e a Wrigley têm condições de deixar os preços intactos – e mais competitivos. Com a fusão, os custos fixos de cada uma encolheram 30%, já que, juntas, elas conseguem comprar a matéria-prima a preços mais baixos. Diz o consultor americano Sterling Smith: "A alta nos preços da matéria-prima tem forçado as grandes empresas de doces a firmar parcerias".
O Brasil está na mira da Mars, da Wrigley e de várias outras porque suas taxas de crescimento nesse mercado específico são de 12% ao ano – número especialmente bom diante do ritmo mundial, de 6%. Só de chocolates, os brasileiros compram hoje o triplo do que compravam na década de 80. É compreensível que ocupem a quarta posição no ranking mundial do consumo per capita de balas e chocolates, abaixo apenas de Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos. "De todos os países emergentes, o Brasil é o que mais nos interessa", afirma Filipe Ferreira, o presidente da Mars no Brasil, onde a empresa atua desde a década de 70. O mercado brasileiro já fatura 10 bilhões de reais por ano e tende a avançar como em poucos lugares. Antes de tudo, porque a renda no país aumenta e isso costuma se refletir no consumo de balas e chocolates. Outro ponto diz respeito a uma questão cultural. Enquanto chineses e indianos preferem frutas de sobremesa, a opção número um dos brasileiros são os doces, segundo mostram as pesquisas.
Não é tão fácil, no entanto, ingressar no mercado brasileiro. A metade dele, que vive da venda de chocolates, está hoje dominada por três empresas: Nestlé, Kraft e Garoto. Somadas, elas detêm 90% de um segmento do qual a Mars conta apenas com 3%. O restante do mercado é tomado por centenas de companhias regionais, com as quais também é difícil competir. Situadas mais perto dos pontos-de-venda, elas conseguem economizar na etapa mais onerosa da operação: a logística, que responde por 20% dos custos fixos. Dificultam ainda mais a tarefa de transportar jujubas e chocolates pelo território nacional o mau estado das estradas e o calor, que já fez derreter muito confeito da Mars. A solução foi passar a percorrer trechos menores de cada vez (e com o ar-condicionado ligado na última potência). "Encarece a operação", diz Filipe Ferreira, da Mars. "Mas o Brasil, definitivamente, vale a pena."
Com reportagem de Cibele Gandolpho