Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, março 02, 2005

Folha de S.Paulo - Editoriais: O CRESCIMENTO DO PIB - 02/03/2005

É uma boa notícia a confirmação de que a economia brasileira, como estimavam alguns analistas, apresentou crescimento de 5,2% no ano passado, segundo dados divulgados ontem pelo IBGE. O bom resultado, contudo, precisa ser visto à luz do contexto em que foi obtido.
Em primeiro lugar, é forçoso lembrar que o aumento do PIB em 2004 ocorreu sobre uma base extremamente baixa, uma vez que, em 2003, a expansão foi de apenas 0,5%.
Em segundo lugar, a retomada da atividade econômica contou com o impulso de uma conjuntura internacional excepcionalmente favorável, na qual inúmeros países tiveram desempenho melhor do que o brasileiro. Entre os emergentes, além da China, da Índia e da Rússia, também Argentina, Venezuela, Uruguai, Chile e Cingapura -para citar apenas alguns- fecharam o ano com crescimento superior ao do Brasil.
As manifestações de euforia, portanto, embora compreensíveis, não deixam de evidenciar o quanto entre nós as expectativas vêm se amesquinhando sob a influência de um longo período de crescimento baixo e descontínuo. Quanto a isso, basta dizer que, nos últimos dez anos, considerando os números de 2004, a economia brasileira cresceu em média pífios 2,4% ao ano -o que corresponde a uma elevação irrisória do PIB per capita de 0,9%.
A questão a ser formulada, portanto, é se a boa performance do ano passado representa o início de uma trajetória mais vigorosa e contínua de expansão da economia ou se, nos próximos anos -quando as circunstâncias internacionais dificilmente se manterão tão benéficas-, o país repetirá a sofrível dinâmica do passado recente.
É fato que uma das principais causas da instabilidade econômica na década de 90 residia na fragilidade das contas externas brasileiras. Esse problema foi amenizado pelos bons resultados da balança comercial a partir das desvalorizações sofridas pelo real em 1999 e em 2002. Os perigosos déficits externos se transformaram em superávits, num ajuste, sem dúvida, auspicioso.
Algumas circunstâncias, contudo, vêm contribuindo para levantar dúvidas sobre a continuidade e a consolidação desse processo. O quadro de juros muito altos e cotação do dólar em queda vai fragilizando a economia ao alimentar a dívida pública, onerar a política fiscal e colocar em risco as perspectivas do setor produtivo e das exportações.
Por certo que é desejável ganhar competitividade em outras frentes que não a cambial. Ainda assim, a acirrada disputa pelos mercados internacionais, na qual países como a China atuam de maneira extremamente agressiva, exige que o Brasil, diante da necessidade de continuar gerando grandes superávits comerciais nos próximos anos, mantenha o câmbio em níveis em que o setor privado se sinta seguro de que investir em atividades exportadoras continua a ser uma opção atraente.
No entanto a política monetária vai submetendo todo o processo econômico à sua obcecada tentativa de cumprir os objetivos excessivamente ambiciosos de redução da inflação, num quadro em que o mais sensato seria revê-los e reescaloná-los ao longo do tempo. É uma típica situação na qual "o rabo está abanando o cachorro", para recorrer a uma imagem freqüentemente utilizada pelo ex-ministro Pedro Malan.
Em que pese a melhora registrada no último ano, também despertam inquietações as perspectivas de aumento dos investimentos e de superação dos dramáticos gargalos de infra-estrutura -sem o que não haverá condições de sustentar o crescimento. Por fim, resta saber se o governo Lula, que tem dado assustadoras demonstrações de incompetência política, terá condições de avançar no Legislativo com a pauta de reformas, ajudando a criar um ambiente mais estável e menos inseguro para novos empreendimentos.

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