Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 16, 2009

A metamorfose Miriam Leitão


O GLOBO


O mais agressivo dos antiambientalistas tem hoje um discurso diferente. O governador Blairo Maggi diz que mudou porque não briga com a ciência. Ele disse que, com todos os outros governadores amazônicos, pedirá ao presidente Lula que o Brasil mude sua posição e aceite metas de emissões de carbono. Discorda da líder dos ruralistas, senadora Kátia Abreu. "Não sou comandado por ela", disse.

Maggi alega que ficará até 2014 fora da política. Mas não parece estar para sair dela: disse que trabalhará pela candidatura Dilma e já aproveitou a entrevista que fiz com ele na Globonews para atacar a possível candidata Marina Silva.

— Eu tive as minhas diferenças com Marina. Fortes diferenças. Defendo a posição de que não pode haver ideologia quando o assunto é desenvolvimento. Eu mudei em vários pontos, Marina podia ter mudado. A gente não pode ser uma toupeira e a vida inteira achar que aquele caminho é o correto.

Eu defendo a candidatura da ministra Dilma e vou seguir neste grupo junto com o presidente Lula.

O que ele fala de si mesmo contraria os fatos. Blairo diz que não briga com a ciência.

Brigou. Atacou o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais: "A serviço de quem o Inpe trabalha?", disse no ano passado. Ele garantia que não havia aumento do desmatamento em Mato Grosso. Houve. Subiu 22% no dado anual. Blairo joga pesado em qualquer briga: contratou o serviço do satélite francês Spot que dá uma qualidade de imagem muito maior do que o que é usado pelo Inpe. Com essas imagens está realizando o sonho de ambientalistas: o zoneamento econômico ecológico do estado, e o cadastramento de todas as propriedades rurais com georreferenciamento.

Blairo fez uma metamorfose.

Não é mais aquele que dizia não haver importância alguma o país ter derrubado 24 mil km2 num ano, como fez em 2004, ou dizer que tinha que derrubar a mata mesmo porque o país não poderia ficar "catando coquinho na floresta". Ele foi chamado de estuprador da floresta pela imprensa internacional e ganhou a motosserra de ouro, do Greenpeace.

Hoje, ele fala em REDD, mecanismo de compensação pelo desmatamento evitado; em COP 15, a reunião do clima em Copenhague; defende desmatamento zero.

Quer metas de protocolo internacionais para o Brasil e para Mato Grosso.

— Antigamente, no Brasil se considerava que floresta era atraso, onde tinha floresta não tinha desenvolvimento.

Tive que fazer uma inflexão, reavaliar as minhas posições. Não só minhas, como as dos demais componentes do agronegócio do meu estado. Tive que chamá-los e dizer que o caminho que nós estávamos seguindo não era o mais correto.

O novo Blairo Maggi acha possível conciliar meio ambiente e agronegócio e dá números que mostram onde está o pior problema: na pecuária.

— O estado do Mato Grosso usa 7,8% do território para ser o maior produtor de soja e algodão do país, o segundo maior produtor de milho, o terceiro de arroz, e ter uma indústria de etanol que atende todo o estado. E tem ainda 120 mil propriedades de agricultura familiar. Mas a pecuária usa 25% do território, quase 25 milhões de hectares, para 26 milhões de bovinos. É uma tragédia que temos na pecuária. Temos uma agricultura bem estruturada com uso de tecnologia e temos uma pecuária que usa terra demais, mas que começa a mudar — disse.

Sobre o recente caso da acusação do Greenpeace contra os frigoríficos, Blairo disse que só o Marfrig quis fazer acordo para exigir dos fornecedores comprovação de que não usam área desmatada.

Bertin agora está também fazendo acordo, segundo o Greenpeace. Mas o maior frigorífico, o JBS, não fez qualquer movimento. O governador diz que pode disponibilizar para as empresas as imagens de satélite que vão conferir o que os produtores estão dizendo.

Blairo é contra a proposta de mudar o Código Florestal para reduzir a reserva legal de 80%, como querem os ruralistas, ainda que lembre que até 1998 a reserva legal na Amazônia era 50% e que isso deixou várias pessoas em situação ilegal.

Mesmo assim, não quer voltar ao que era antes.

— Não defendo essa posição e inclusive sou criticado no meu estado por aqueles que acham que deve ser feita essa modificação.

Sobre a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), líder dos ruralistas, ele é definitivo: — Não sou comandado por ela — afirmou.

Em vários outros pontos, Blairo Maggi é o mesmo de sempre. Ele ainda defende que não há conflito de interesse em seu governo licenciar obras de hidrelétricas que serão construídas pelas suas próprias empresas.

— Não há conflito de interesses, não posso pedir que minha família seja prejudicada.

Não é porque eu sou sócio de um grupo que ele não pode fazer uma hidrelétrica ou plantar.

Plantar não tem problema, mas hidrelétrica depende de licença concedida por órgãos que respondem ao comando dele.

O novo Blairo fala de maneira mais cuidadosa, mas quando usa a palavra "toupeira" para se referir a atitude de Marina Silva reaparece seu estilo. O exemplo que ele usou para justificar o que dizia contraria os fatos.

— Ela podia ter mudado nos transgênicos, por exemplo — me disse.

A verdade é que Marina era totalmente contra, depois aceitou o licenciamento desde que houvesse segregação de grãos. Isso garante mercado para o produto brasileiro em países que a soja convencional não seja contaminada. Pode ser vista como uma posição a favor do agronegócio no novo mundo que concilia produção e meio ambiente. O mundo onde Blairo Maggi quer estar.

oglobo.com.br/miriamleitao • e-mail: miriamleitao@oglobo.com.br

COM ALVARO GRIBEL

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