Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 08, 2008

Vicky Cristina Barcelona, de Woody Allen

Me arrisco, logo existo

Em Vicky Cristina Barcelona, Woody Allen
brinca de Almodóvar e faz uma ode à disposição
de abraçar o inesperado


Isabela Boscov

Divulgação

SOB O SOL DA ESPANHA
Scarlett, Penélope e Bardem: se três não é demais, o que os outros têm a ver com isso?


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Amigas de temperamentos opostos, Vicky (Rebecca Hall) e Cristina (Scarlett Johansson) desembarcam em Barcelona para uma temporada de crescimento pessoal. Vicky, a organizada, tem um noivo yuppie em Nova York e planejou que seu engrandecimento será apenas acadêmico, com uma pesquisa sobre a cultura catalã. Cristina, a topa-tudo, quer, sei lá, se conhecer melhor e descobrir qual seu verdadeiro talento, se ele existir. De uma exposição de arte, elas partem para uma aventura. Na galeria está o pintor Juan Antonio (Javier Bardem), conhecido pelo divórcio rumoroso: sua ex-mulher, a também artista Maria Elena (Penélope Cruz), cravou-lhe uma faca nas costas, e durante algumas semanas os dois foram o assunto da cidade. Tirando todo o proveito de seus olhos de alcova, Bardem aborda as amigas em uma cena deliciosa, na qual propõe que elas o acompanhem em um fim de semana de cultura, gastronomia e sexo. Vicky fica indignada. "Desculpe, apenas fiz minha melhor oferta", retruca o pintor. Como Cristina aceita a oferta, que de fato não parece nada má, Vicky vai junto para zelar por ela. A certa altura, porém, as coisas sairão um pouco do programa. E esse é o eixo de Vicky Cristina Barcelona (Espanha/ Estados Unidos, 2008), o novo e excelente filme de Woody Allen, que estréia nesta sexta-feira no país: as coisas – quaisquer que sejam elas – sempre hão de sair do programa. Ainda bem, porque em geral as pessoas tendem a ser péssimas autoras de seus próprios roteiros.

Depois de três filmes rodados na Inglaterra, Allen aproveita o novo ambiente para brincar um pouco de Pedro Almodóvar. E não só pela ótima participação de Bardem e Penélope, ambos em grande forma cômica: desde Hannah e Suas Irmãs, de 1986, ele não prestava tanta atenção às suas personagens femininas, nem fazia um filme seguir tão de perto a coreografia do desejo. Só que os romances aqui não transpiram nenhuma paixão, porque são um mero emblema do imprevisto. Tanto Vicky quanto Cristina serão tocadas pelo imponderável, representado por Juan Antonio. Uma aproveitará o impulso para se lançar numa nova trajetória; a outra vai descrever um círculo e voltar ao mesmo ponto – mas mais triste e insatisfeita, porque agora sabe que a vida pode conter outras coisas, e que lhe falta a coragem para abraçá-las. Trata-se, enfim, quase de um jogo de salão, em que cada espectador deve decidir, ao final, se é mais Vicky ou mais Cristina, e se isso lhe convém realmente ou não. O diretor, de sua parte, sabe bem de que lado está. Aos 72 anos, ele parece aqui olhar para trás e concluir que os acertos têm um talento danado para se travestir de erros, e os erros, de acertos. Quem não se arriscar poderá até viver – mas não verá.

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