Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, agosto 08, 2008

A teta - Nelson Motta




Folha de S. Paulo
8/8/2008

Não por acaso, o afresco que embeleza a sala de imprensa da residência oficial do primeiro-ministro italiano se chama "A Verdade Revelada pelo Tempo". Três século depois de pintado por Tiepolo, algum assessor de Berlusconi, ou talvez ele mesmo, incomodado com a verdade nua de um seio da alegoria, mandou pintar uma faixa de tecido para cobri-lo.
Em nome da decência e da família.
Enquanto isso, espalhadas pelas praias da península, milhões de mulheres italianas, mães, esposas e namoradas de todas as idades, tamanhos e classes sociais, desfrutam o verão "al mare", sem sutiã, sem vergonha e sem culpa. Revistas de celebridades fazem até concursos em que os leitores elegem os melhores e os piores topless da temporada, colhidos pelos seus paparazzi. E as gostosonas e barangas das redes de televisão de Berlusconi estão sempre entre as mais votadas.
Mas a hipocrisia e o autoritarismo sozinhos não explicam o moralismo berlusconiano. Há muito mais por trás desse seio, pequeno e discreto, da pintura de Tiepolo. Há a grande teta do Estado italiano, com suas legiões de funcionários, com suas incontáveis vantagens e garantias, formando uma das maiores e piores burocracias do mundo, dominada pelos partidos políticos e gerando uma grande promiscuidade entre o público e o privado.
Esta cultura secular de mamar nas tetas do Estado está custando caro à Itália, estagnada e atropelada pela Espanha entre as maiores economias do mundo. A loba romana, com Rômulo e Remo pendurados em suas tetas, hoje se vê, já não era um bom augúrio.
Pobre Itália, tão rica, tão culta e tão bela. Toda vez que penso em Berlusconi, imagino uma cruza maligna de Maluf com Silvio Santos e, por respeito aos amigos italianos, evito o riso ou o deboche.

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