Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 16, 2008

RUY CASTRO Ser ou não ser

RIO DE JANEIRO - Ser ou não ser, como diriam Shakespeare, Alberto Ribeiro e José Maria de Abreu -eis a questão. João Donato declarou à Folha que não é da bossa nova, nunca foi da bossa nova e não agüenta mais ouvir falar de bossa nova. Mas, indiferentes aos seus protestos, as pessoas e instituições continuam a convidá-lo para eventos referentes aos 50 anos da bossa nova. E ele tem participado de tudo, no que faz muito bem.
Já não compete a Donato decidir se é ou não da bossa nova. A bossa nova decidiu que ele é. E que, sem ele, ela talvez não existisse, já que uma certa batida criada por ele ao acordeão (seu instrumento nos anos 50), depois transposta para o piano, teria sido uma importante inspiração para a batida de violão inventada por João Gilberto e que definiria o gênero. Se Donato não quer ser da bossa nova, ok. Mas a bossa nova quer ser de Donato.
Diz ele que não agüenta mais falar de bossa nova. Os repórteres lhe telefonam todo dia para saber se ela nasceu mesmo no apartamento de Nara Leão, se foi o Stanislaw Ponte Preta quem inventou o nome etc. Eu também, por causa de alguns livros que escrevi a respeito, não chego para entrevistas, e as perguntas não variam muito. Mas que bom que isso esteja acontecendo -nos anos 70 e 80, um repórter que gostasse de bossa nova se arriscava a demissão por justa causa.
Donato tem ainda outro motivo para ser grato à bossa nova. Em 1959, precisou sair do Brasil para sobreviver. Seu piano era tão "avançado" que nenhuma boate lhe dava emprego. Pois ele passou 12 anos fora. Quando voltou, tudo tinha mudado. A bossa nova, já extinta, o tornara "compreensível". Graças a ela, ele podia de novo trabalhar aqui, fazendo a sua grande música -que as massas hoje entendem, adoram e insistem em chamar de bossa nova.

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