O Estado de S. Paulo |
21/8/2008 |
Às vésperas de mandar sua proposta de reforma política ao Congresso, o governo resolveu incluir um item relacionado à ação das milícias e quadrilhas de traficantes na campanha para prefeito e vereador no Rio de Janeiro. Aproveitou a legislação de 1997, que pune a compra de votos com a cassação do mandato do beneficiado, e estendeu a penalidade aos eleitos que, na campanha tenham se favorecido de atos de coerção à liberdade do eleitor. Há muitas novidades em relação a projetos de reformas em tramitação no Congresso, há o propósito explícito de afastar do Palácio do Planalto quaisquer suspeitas sobre intenções continuístas e existe também um cuidado extremo em não melindrar o Parlamento. O cerimonial já está acertado: a proposta será levada nos próximos dias ao Congresso pelos ministros da Justiça, Tarso Genro, e das Relações Institucionais, José Múcio, e entregue em mãos aos presidentes do Senado, Garibaldi Alves, e da Câmara, Arlindo Chinaglia. Uma forma de aplacar conflitos potenciais sinalizados na reação inicial do presidente da Câmara que, apesar de petista, foi brusco ao declarar, em resumo, que o Executivo se intrometia onde não estava sendo chamado. O presidente Luiz Inácio da Silva quer deixar para a História sua assinatura na reforma, mas não quer arrumar confusão por causa disso. Há dois meses, quando pediu ao Ministério da Justiça que pusesse a reforma no papel, fez uma recomendação expressa: nada de mudanças de caráter institucional que possam ensejar suspeitas sobre aberturas de caminhos constitucionais para a aprovação do terceiro mandato. Com isso, deixou-se de fora a proposta do fim da reeleição com mandato único de cinco anos ou quaisquer emendas constitucionais que se prestassem a acréscimos por parte dos adeptos do continuísmo. O projeto contém apenas alterações de leis ordinárias e complementares, com a exceção para a única emenda constitucional que recupera a cláusula de desempenho eleitoral - derrubada pelo Supremo Tribunal Federal - para o acesso dos partidos ao Parlamento. Esse cuidado todo não quer dizer que um Devanir Ribeiro ou um Carlos William, dois deputados assumidamente defensores do terceiro mandato para Lula, não possam - “por iniciativa própria” - propor algo nesse sentido, como plebiscitos e idéias afins. Mas, nesse caso, o governo não terá posto sua digital e sempre poderá combater a tese com veemência, ainda que as circunstâncias venham a obrigá-lo depois a aceitar a prática com constrangimento, mas em sinal de “respeito” às decisões do Congresso. A fim de dirimir dúvidas sobre a lisura de suas intenções e também facilitar a aprovação de mudanças, o Planalto sugere a entrada em vigor das novas regras apenas na eleição municipal de 2012. As sugestões, cuja elaboração técnica foram coordenadas pelo secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, sustentam-se, segundo ele, em três conceitos básicos: fortalecimento dos partidos, barateamento dos custos de campanha e melhoria da representatividade, aí incluída uma relação mais transparente entre eleitores e eleitos. “A intenção é atacar as grandes mazelas do sistema: o clientelismo e o fisiologismo, que transformaram a política numa atividade de troca de interesses em prejuízo do embate de idéias”, diz Abramovay. Na opinião dele, o sistema eleitoral “é uma fraude”. A começar pela ilusão de que as listas abertas asseguram uma relação direta do eleitor com o candidato escolhido. “Os votos vão todos para os partidos, que distribuem as cadeiras de acordo com a votação de cada um, mas as pessoas não sabem disso, acham que quando não elegem o preferido, perderam o voto”. As listas fechadas, na concepção da proposta, dão nitidez ao processo. Mas, não dão excessivo poder às cúpulas? “O mesmo de hoje e ainda compromete diretamente os dirigentes com a qualidade dos escolhidos para encabeçar as listas.” Outra mudança é o financiamento misto de campanha. Parte público, para dar alguma chance a quem não tem acesso a grandes doadores - parte privado, mas só de pessoas físicas. “Pessoa jurídica não tem ideologia, portanto, o interesse é de outra natureza.” No tocante à filiação partidária, o prazo para mudança de partido é reduzido de um ano para seis meses antes da eleição para não obrigar quem deseja concorrer por outro partido a renunciar a um quarto do mandato em curso. Está prevista também a proibição de registro de listas sem o cumprimento da cota legal de 8% de candidatas mulheres, a extinção da prática de soma de contagem de tempo de televisão pelo número de partidos da coligação (valeria só o maior) e o veto a candidatos condenados em tribunais, não necessariamente em instância final como manda a legislação atual. Vista assim do alto, a reforma chega elegante ao Congresso. O risco é sair - se sair - em completo desalinho com os parâmetros institucionalmente aceitáveis. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, agosto 21, 2008
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