Os aumentos de impostos explicam apenas uma parte do sucesso do governo em manter cheio o seu cofre - os efeitos disso para o País são outra história. A engorda da ordem de 40% nos cinco anos completos da era Rachid (de R$ 326,6 bilhões arrecadados em 2003 para R$ 456,1 bilhões em 2007) e a explosiva elevação da carga tributária na administração Lula (de 24% a 35% do PIB) se devem também à modernização da Receita em que o seu titular se empenhou. Ao investir maciçamente em tecnologia da informação, ele transformou o Fisco nacional em um dos mais avançados sistemas do gênero no mundo, permitindo montar um cerco sem paralelo aos sonegadores, boa parte dos quais se viu na contingência de regularizar a sua situação. E, desde a primeira hora, o auditor apartidário que o secretário que o antecedeu, Everardo Maciel, emplacou no seu lugar (contra a vontade do PT) deixou claro que preservaria a Receita de quaisquer tentativas de aparelhamento.
Até onde a vista alcança, portanto, não havia nenhuma razão substantiva para tirá-lo - sumariamente, de resto - do comando de um setor vital para o governo, ainda mais robustecido com a implantação da Super-Receita, incorporando a arrecadação dos pagamentos para a Previdência, em maio do ano passado. E muito menos razão havia para trocar um dos mais competentes membros da hierarquia federal por uma servidora - a então superintendente da 4ª Região Fiscal, Lina Vieira, duas vezes secretária de Tributação do Rio Grande do Norte - a qual, à parte os seus eventuais méritos profissionais, deve a sua ascensão ao apadrinhamento do ex-ministro da Previdência, o petista Nelson Machado. Quando se anunciou a Super-Receita, ele queria o emprego para si; preterido, ganhou a Secretaria Executiva da Fazenda. Dali, fez o que pôde para enfraquecer Rachid: negociava diretamente com o sindicato dos auditores, reunia-se com os secretários-adjuntos da Receita, à revelia do chefe deles, e retinha recursos para o organismo.
Significativamente, o Sindicato dos Auditores Fiscais (Unafisco) não esperou que a cadeira de Rachid esfriasse para divulgar uma nota festejando a sucessora. Foi dia de festa também para o grupo do ministro Mantega, que celebra o desmanche final da estrutura montada por Palocci. O economista Bernard Appy, outro remanescente do time palocciano, foi transferido da influente Secretaria de Política Econômica para uma talvez decorativa Secretaria de Assuntos Institucionais. O diretor da Casa da Moeda, José dos Santos Barbosa, também perdeu o posto. O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, do PTB, indicou o substituto. Mantega sentiu-se livre para fazer as mudanças com que espera se fortalecer quando começaram a perder gás os rumores da volta de Palocci. É bem provável que Lula gostaria de tê-lo de novo na sua equipe, mas topou com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em fins de junho, de aceitar a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-ministro e deputado. Ele responderá por ilícitos que teria cometido como prefeito de Ribeirão Preto.
Assessores de Mantega dizem que a secretária Lina Vieira deverá "trabalhar em mais harmonia" com as demais áreas do Ministério. Não surpreenderá se isso significar a politização da Receita.