Saúde
Exames de gente grande
Hospitais brasileiros oferecem check-up para
adolescentes, mas alguns médicos acham exagero
submetê-los a uma bateria de testes nessa fase da vida
Adriana Dias Lopes
Fabiano Accorsi |
Em forma para o vestibular |
O paulistano Felipe Chamis tem 17 anos e uma responsabilidade pela frente: vai enfrentar o vestibular no fim do ano. Até lá, divide-se entre a rotina diária de esportes – basquete, tênis e futebol – e o mergulho nas dezenas de livros de preparação para as provas. Para certificar-se de que o corpo dará conta da sobrecarga física e emocional, sua mãe achou adequado submeter Felipe a um check-up com testes específicos para adolescentes. A exemplo dos principais centros de saúde americanos, onde a especialidade existe há quase dez anos, os hospitais Sírio-Libanês, Oswaldo Cruz e o Hospital do Coração, todos em São Paulo, passaram a oferecer exames preventivos direcionados a pacientes de 10 a 20 anos. "Como meu filho não come bem, quero estar segura de que ele está saudável para enfrentar a tensão do vestibular", diz Cléa, mãe de Felipe. Em uma manhã, o garoto cumpriu toda a bateria de exames num único lugar – sem reclamar. O check-up juvenil é uma versão mais enxuta do protocolo hoje oferecido aos adultos. Feito a cada dois anos, inclui desde coleta simples de sangue, para detectar distúrbios como colesterol alto e diabetes, até ecocardiograma (veja o quadro abaixo). Não há novas máquinas ou exames criados especificamente para essa finalidade. "A diferença está nas doenças rastreadas e na interpretação dos resultados", diz Danielli Haddad, cardiologista do Hospital Sírio-Libanês.
A lógica do check-up é identificar doenças e seus fatores de risco em estágios bastante iniciais, quando as chances de cura são maiores. No caso dos adolescentes, ponha-se inicial nisso... Há quem condene esse tipo de exame em gente tão jovem por considerar que é cedo demais para inculcar nos adolescentes a preocupação exagerada com a saúde. "Afinal, eles terão praticamente toda a vida adulta para se incomodar com isso", diz Marcelo Reibscheid, pediatra do Hospital e Maternidade São Luiz. Já os defensores de tais métodos de diagnóstico precoce argumentam que os adolescentes de hoje são submetidos a stress de gente grande. Pior: têm hábitos de vida precários, muito parecidos com os dos adultos. Alimentam-se mal, são sedentários e muitos ainda fumam e bebem. Boa parte dos maus hábitos que serão carregados ao longo da vida é determinada justamente na fase que vai dos 10 aos 20 anos de idade. "Daí por que é preciso intervir nessa fase, quando ainda há tempo de reverter os comportamentos de risco", diz o cardiologista Marcus Bolívar Malachias, diretor do departamento de hipertensão da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Um estudo recente feito pela Universidade Federal de São Paulo revelou que os adolescentes do país começam a beber cada vez mais cedo: aos 13 anos. Dos adultos que bebem regularmente antes dos 14 anos, 47% se tornam dependentes do álcool.
É também nessa fase da vida que a qualidade da dieta alimentar despenca. Todo o empenho dos pais em manter o prato colorido da infância vai por água abaixo quando eles perdem o controle sobre o que seus filhos comem. "Os adolescentes não têm paciência de se sentar à mesa e fazer uma refeição completa", diz o hebiatra Maurício de Souza Lima, do Hospital das Clínicas, de São Paulo. "Não pensam duas vezes em trocar o prato de arroz, feijão e salada por hambúrguer e batata frita", diz. Tudo isso tem o efeito de uma bomba no organismo deles – além de colocá-los no grupo de risco para doenças crônicas no futuro. Estima-se que 5% dos adolescentes brasileiros tenham glicemia alterada, num estágio que já pode ser considerado pré-diabético. Cerca de 10% têm colesterol alto, um dos principais fatores de risco para doenças coronárias, como aterosclerose e infarto.
Os exames para adolescentes são parte de uma tendência verificada nas últimas duas décadas – a de individualizar o check-up a grupos de pessoas com idades e hábitos de vida bastante próximos. Isso já é feito com executivos e com mulheres adultas. Como o principal objetivo da medicina preventiva é corrigir os fatores de risco que levam ao surgimento de doenças, o check-up inclui, no caso dos adolescentes, uma consulta com um hebiatra, médico especializado em atender meninos e meninas que já passaram da fase do pediatra. A conversa tem duração mínima de uma hora e, em geral, é feita em três etapas: com toda a família, com os pais e, numa última sessão, apenas com o jovem. O médico compromete-se, por meio de um documento anexado ao prontuário do paciente, a não revelar as questões tratadas dentro do consultório. O sigilo só é quebrado quando o adolescente corre risco de vida, em atitudes como sexo sem proteção ou uso abusivo de drogas.
Fotos Divulgação e Photodisc |