Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 02, 2008

Capital dos bilionários

Com o maior número de moradores podres de ricos – e também
o custo de vida mais alto do mundo –, Moscou se tornou o
paraíso do comércio de luxo e da ostentação de riqueza


Thomaz Favaro

Dima Korotayev/ Epsilon/ Getty Images
Exibicionismo e opulência
Mercedes incrustado com cristais Swarovski na Feira
do Milionário, em Moscou: o carro custa 350 000 dólares

Em nenhum outro lugar do mundo a palavra novo-rico faz tanto sentido quanto em Moscou. A cidade tem a maior concentração de bilionários do planeta, segundo a revista americana Forbes. São 74, contra 71 em Nova York. Boa parte dos 103 000 milionários da Rússia, cuja fortuna conjunta é avaliada em 670 bilhões de dólares, também vive na capital. Tanto dinheiro se traduz na exuberância do comércio de luxo. As lojas da Gucci, da Dolce & Gabbana e da Chanel em Moscou estão entre as três maiores em volume de vendas de suas cadeias internacionais. A Brioni, grife italiana de roupas masculinas cujos ternos custam 5 000 dólares, tem na cidade sua principal loja. Os ricaços moscovitas gostam de exibir o seu novo estilo de vida: a cidade é uma das seis do mundo que abrigam a Feira do Milionário, um evento anual de luxo. Na edição do ano passado, foram vendidos, em apenas quatro dias, 750 milhões de dólares em apartamentos no emirado de Dubai, iates, celulares incrustados de diamantes e outros bens. "Os russos, quando se encantam com algum produto, estão dispostos a pagar o que for preciso por ele", disse a VEJA Elena Kudozova, diretora do evento. Quando viajam para o exterior, os russos também fazem questão do melhor que o dinheiro pode comprar. Eles são os turistas que mais gastam com hospedagem: em média, 227 dólares por dia. Não é à toa que fizeram de sua principal cidade a capital do consumo de luxo.

Moscou aparece, pelo terceiro ano consecutivo, como a cidade mais cara do mundo. O ranking do custo de vida em 143 cidades, elaborado pela consultoria americana Mercer, leva em conta o preço de 200 itens, incluindo alimentação, transporte, vestuário e habitação. Os preços na capital russa são em média 12% mais altos que os de Tóquio, no Japão, a segunda mais careira. Em Moscou, os estabelecimentos comerciais vazios dos tempos do comunismo foram substituídos por movimentadas lojas de grifes estrangeiras. A vida noturna é vibrante e há excelentes e caras opções de restaurante. O dinamismo econômico e a taxa de desemprego inferior a 2% atraem para a capital da Rússia novos moradores, que engrossam a população de 13 milhões de habitantes. Isso elevou a demanda por moradia e fez dobrar o preço dos imóveis nos últimos três anos. O aluguel residencial em Moscou só é mais barato que o da apinhada Hong Kong, na China. O rublo valorizou-se em relação ao dólar, encarecendo ainda mais o custo de vida dos moscovitas. O cafezinho sai por 10 dólares, em média.

A exuberância da capital é um retrato do crescimento econômico do país, o maior produtor mundial de gás natural e o segundo maior de petróleo. Sob o comando do presidente Vladimir Putin, que deixou recentemente o cargo, e impulsionada pela alta no preço dos produtos fósseis, a Rússia cresceu em média 7% nos últimos oito anos. A economia já apresenta sinais de superaquecimento – a inflação chegou a 12% em 2007 –, mas deve continuar crescendo mais de 6% ao ano até 2010. Estima-se que, até lá, o orçamento da prefeitura de Moscou ultrapasse o de Nova York. Desde 2003, o salário médio dos russos cresceu 30% ao ano. Muitos bilionários começaram a fazer fortuna na transição para o capitalismo, na década de 90, quando o então presidente Boris Ieltsin privatizou as estatais do país. Essas empresas foram vendidas a preços irrisórios, em negociações entre camaradas. Mas não é justo suspeitar de todo ricaço russo. Além de contribuir para melhorar a qualidade de vida da população em geral, o desenvolvimento econômico provocou uma multiplicação do número de magnatas que fizeram fortuna com trabalho honesto. Yuri Zhukov e Kirill Pisarev são jovens empresários, ambos com menos de 40 anos, que souberam tirar proveito do desempenho econômico do país nos últimos anos. Eles são sócios em uma construtora de imóveis residenciais, a PIK, empresa que abriu seu capital na bolsa de valores em 2007. Espanta pensar que há apenas duas décadas a maioria dos moscovitas morava em kommunalkas, apartamentos comunitários divididos por duas ou mais famílias. Nos mercados, filas enormes disputavam os poucos produtos disponíveis. Viva o capitalismo.

MONTAGEM SOBRE FOTOS GRUPO KEYSTONE/ROYALTY FREE E DIVULGAÇÃO

Moscou do futuro

Divulgação
Em forma de vulcão
O complexo Ilha de Cristal, à beira do Rio Moscou,
terá lojas, cinemas, hotel e até escola

A cada dia Moscou está mais distante da sisuda capital dos czares vermelhos. Entre os projetos mais vistosos da cidade está a Ilha de Cristal, a cargo do inglês Norman Foster, o arquiteto do novo Aeroporto de Pequim. Verdadeira ilha da fantasia no Rio Moscou, com inauguração prevista para 2014, ela terá um prédio em forma de vulcão com 450 metros de altura. A construção abrigará apartamentos, um hotel e um shopping center. A rede hoteleira de Moscou – cujas diárias são, em média, as mais caras do mundo – deverá dobrar sua capacidade até 2010. Nos últimos três anos, foram erguidos na cidade os dois edifícios mais altos da Europa.

Parte do afinco pela multiplicação dos canteiros de obras deve-se ao prefeito Iuri Lujkov. Só em infra-estrutura, ele pretende investir 300 bilhões de dólares nas próximas duas décadas. A malha viária, acanhada para a frota de 4 milhões de veículos, ganhará novas avenidas, algumas com dezoito pistas, para descongestionar o trânsito. Desde que Lujkov assumiu o cargo, em 1992, mais de 2 000 prédios (dos quais 200 tinham reconhecido valor arquitetônico ou histórico) foram derrubados para dar lugar a novas construções. A prefeitura participa do financiamento de muitos projetos comerciais, como o Centro de Negócios Internacionais de Moscou, que ocupará uma área equivalente à de três Maracanãs. A esposa de Lujkov, única mulher na lista de bilionários moscovitas, é dona de uma empreiteira com acesso privilegiado às concorrências públicas. Se em muitos aspectos Moscou em nada se parece com a velha Rússia, em tantos outros não mudou nada.

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